Em 20/03/2020, o Senado Federal Brasileiro aprovou o decreto de estado de calamidade pública elaborado pelo Presidente da República.
Referida situação vigerá até 31/12/2020, tornando indubitável o cenário extraordinário e os seus graves prejuízos e reflexos de natureza sanitária e econômica.
Destarte, necessário analisar a possibilidade de reequilíbrio contratual sob a ótica da atual realidade da crise sanitária e econômica nas hipóteses em que o fator extraordinário torna excessivamente dificultoso o adimplemento da obrigação pactuada nos contratos de prestação contínua.
Contratos Vigentes Durante a Pandemia
Aqueles contratos, vigentes durante a pandemia, que estabelecem prestações extremamente desproporcionais entre as partes, merecem revisão.
Portanto, não é necessária a revisão de todos os tipos de contrato, uma vez que não está em discussão o poderio econômico das partes.
Em contrapartida, a finalidade é verificar se as prestações estão desproporcionais, acarretando em extrema vantagens para uma das partes do contrato.
Neste sentido, de acordo com o art. 422 do Código Civil:
Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
Diante disso, o princípio da boa-fé exige que as partes se comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a formação e o cumprimento do contrato.
Outrossim, o princípio guarda a relação com o princípio de direito segundo o qual ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza.
Aplicação do Princípio da Boa-fé no Caso Concreto
Desse modo, devem os magistrados, ao julgar demanda na qual se discuta a relação contratual, dar por pressuposta a boa-fé objetiva.
Em outras palavras, que impõe ao contratante um padrão de conduta, ou seja, com probidade, honestidade e lealdade, respeitando as peculiaridades do caso concreto.
Assim dispõe o novo artigo 421-A do Código Civil:
Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que:
I – as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução;
II – a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e
III – a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.
Outrossim, a regra da boa-fé consiste em cláusula geral para a aplicação do direito obrigacional.
Ademais, este princípio permite a solução do caso levado em consideração fatores metajurídicos e princípios jurídicos gerais.
Teoria da Imprevisão e Revisão Contratual
Diante do exposto, nem todos os contratos de prestação continuada precisam de revisão durante a pandemia do covid-19.
Para tanto, muitos tem usado a teoria da imprevisão, em vista do caso fortuito, o qual incluiu o requisito da imprevisibilidade, para possibilitar a sua adoção.
Neste sentido, os tribunais não aceitam a inflação e alterações na economia como causa para revisão dos contratos.
Anteriormente, aplicava-se a teoria da imprevisão apenas em casos excepcionalíssimos, com cautela, desde que demonstrados os seguintes requisitos:
- A vigência de um contrato comutativo de execução diferida ou de trato sucessivo;
- Ocorrência de fato extraordinário e imprevisível;
- Considerável alteração da situação de fato existente no momento da execução, em confronto com a que existia por ocasião da celebração;
- Onerosidade excessiva para um dos contratante e vantagem exagerada para outro.
Por fim, conclui-se, que para a revisão ou a resolução do contrato, a parte que assim desejar, deverá provar a prestação desproporcional que culminou na vantagem extrema da outra parte.