A doutrina define entes despersonalizados como sujeitos de direito que, embora não possuam personalidade jurídica, podem ter direitos e deveres.
Com efeito, para eles aplica-se a legalidade estrita, vale dizer, tudo é proibido, salvo lei, costumes ou princípios jurídicos.
Ademais, não se pode confundir o conceito de CPF ou CNPJ com o de pessoas naturais e pessoas jurídicas.
Contudo, a legislação possui lacunas e omissões acerca dos entes despersonalizados, o que é inadequado por criar várias polêmicas.
Neste artigo, trataremos da importância prática do conceito de ente despersonalizado, bem como da problemática decorrente da falta de clareza da legislação, sobretudo no tocante aos condomínios edilícios.
Entes Personalizados x Entes Despersonalizados
Pode-se conceituar sujeito de direito como aquele que pode titularizar objetos. Há duas espécies de sujeitos de direitos.
Inicialmente, os entes personalizados são aqueles que possuem personalidade jurídica, podendo ser pessoas naturais ou pessoas jurídicas.
De outro lado, os entes despersonalizados, embora não sejam pessoa e, portanto, não tenham personalidade jurídica, podem ter direitos e deveres.
A situação de ente despersonalizado é excepcional e, em princípio, depende de previsão no ordenamento (lei ou, eventualmente, princípios).
Exemplo de ente despersonalizado é o espólio, consistente no conjunto de bens deixados por uma pessoa falecida, que detém direitos e deveres.
Ressalta-se, no tocante aos entes despersonalizados, que o princípio da legalidade deve ser mais restrito, de modo que possuem uma capacidade de direito limitada a atividades estritamente vinculadas à sua natureza e à sua finalidade.
Condomínio Edilício
Inicialmente, ressalta-se que há controvérsias acerca da natureza jurídica do condomínio edilício.
Assim, em que pese grande parte da doutrina entenda-o como pessoa jurídica, o STJ já pacificou o entendimento pela ausência de personalidade jurídica para o condomínio.
Neste sentido, o rol de pessoas jurídicas está previsto nos arts. 41 ao 44 do Código Civil e, no entanto, não inclui o condomínio edilício.
Além disso, ressalta-se que o condomínio edilício nasce com o registro no cartório de registro de imóveis, foro inadequado para pessoas jurídicas.
Portanto, infere-se que o condomínio edilício é um ente despersonalizado e, como tal, só podem fazer aquilo que a lei, o costume ou os princípios jurídicos admitirem.
Com efeito, não podem praticar atos totalmente desconectados de sua atividade por estar sujeito à legalidade estrita própria dos entes despersonalizados.
Usucapião por Condomínio Edilício
O condomínio edilício pode usucapir bens móveis ou imóveis.
Isto porque, embora seja um sujeito de direito despersonalizado, pode praticar atos compatíveis com finalidade.
Para tanto, basta que estejam presentes os requisitos do usucapião.
Além disso, ressalta-se que o condomínio pode usucapir imóveis que não possuem conexão com sua atividade.
Contudo, o condomínio ficará com limitações de uso em razão das restrições próprias de sua condição de sujeito despersonalizado.
Com efeito, reitera-se que esses entes despersonalizados só podem fazer aquilo que a lei, o costume ou os princípios jurídicos admitirem.
Assim, o condomínio que usucapiu um imóvel distante acabará por aliená-lo a terceiros.
Danos Morais Contra Entes Despersonalizados
O art. 2º do Código Civil adota a teoria natalista ao prever que o início da personalidade ocorre a partir do nascimento com vida.
Todavia, isso não significa que o nascituro, mesmo sendo um ente despersonalizado, não tenha direitos.
Destarte, trata-se da aplicação da visão clássica de que os sujeitos de direito podem ser personalizados ou despersonalizados, sendo que a diferenciação entre as espécies é ligada à amplitude da capacidade jurídica.
Assim, enquanto os personalizados podem ter, em tese, aptidão genérica para a aquisição de direitos e deveres, os despersonalizados têm aptidão específica.
Essa distinção é feita em relação ao ente despersonalizado nascituro e deve ser feita também para o condomínio ao se perceber que ainda que se negue à personalidade jurídica a esses entes, esse fator, por si só, não é capaz de afastar a titularidade de direitos.
No âmbito da tutela coletiva, é possível falar, inclusive, em dano moral coletivo, no qual se atinge uma coletividade de pessoas.
Essa coletividade é um ente despersonalizado.
Este tipo de dano atinge toda a coletividade que, apesar de ente despersonalizado, possui valores morais e um patrimônio ideal que merece proteção.
A lei prevê alguns direitos aos condomínios de maneira expressa, a exemplo do que ocorre com a capacidade processual.
Todavia, não prevê, especificamente, a titularidade de danos morais.
De outro lado, é possível notar que alguns condomínios têm sua identidade autônoma à dos titulares das unidades, independentemente de existência de personalidade jurídica.
Além disso, determinados acontecimentos não atingem a individualidade dos condôminos, mas maculam os próprios signos de identificação desse complexo de bens e relações jurídicas.
Assim, nos dois enquadramentos possíveis dos condomínios, como pessoa jurídica ou ente despersonalizado, é possível a verificação concreta de indenização por dano moral.