Lei 13.993/20 e o Contrabando Excepcional de Produtos Médico-Hospitalares
O trânsito de mercadorias pelas fronteiras do país pode sofrer determinadas limitações decorrentes de interesses tributários, industriais, de saúde pública, dentre outros.
Com efeito, não é raro que alguns produtos sejam simplesmente vetados ou passem por procedimentos específicos de importação para garantir que sua entrada no território nacional não seja nociva.
Tendo em vista a ineficácia dos procedimentos administrativos para garantir o cumprimento das regras limitadoras do trânsito aduaneiro de mercadorias, o Direito Penal intervém através da tipificação do crime de contrabando.
Ressalta-se que este crime consiste tanto em importar quanto em exportar mercadorias proibidas, ou seja, incide tanto na entrada quanto na saída de mercadorias.
Neste artigo, trataremos sobre o contrabando excepcional de produtos médico-hospitalares.
Mercadorias Proibidas
O Código Penal não define quais são as mercadorias de importação ou exportação proibida.
Com efeito, o crime de contrabando pode ser caracterizado como uma norma penal em branco.
Em outras palavras, trata-se de um preceito incompleto, genérico ou indeterminado, que precisa da complementação de outras normas.
Assim, cabe às legislações distintas do Código Penal complementar o conceito deste crime e definir no que consistem estas mercadorias.
Limitação do Trânsito de Mercadorias
A Lei 13.993, promulgada em 23 de abril de 2020, dispõe sobre a proibição de exportações de produtos médicos, hospitalares e de higiene essenciais ao combate à epidemia de coronavírus no Brasil.
Trata-se de um exemplo recente de limitação do trânsito de mercadorias baseada em circunstâncias excepcionais de saúde pública.
Com efeito, esta lei foi promulgada em razão da pandemia de coronavírus, ante a excepcional necessidade de milhares de atendimentos simultâneos.
Para tanto, há produtos essenciais tanto para a proteção de médicos, enfermeiros e outros profissionais quanto para o tratamento de pacientes, que, normalmente, encontram-se em estado crítico.
Neste sentido, o § 1º do art. 1º desta Lei proíbe a exportação de:
I – equipamentos de proteção individual de uso na área de saúde, tais como luva látex, luva nitrílica, avental impermeável, óculos de proteção, gorro, máscara cirúrgica, protetor facial;
II – ventilador pulmonar mecânico e circuitos;
III – camas hospitalares;
IV – monitores multiparâmetro.
Todavia, trata-se de rol meramente exemplificativo, isto é, o Poder Executivo pode editar atos administrativos para impedir a exportação de outros produtos que se revelem essenciais.
Outrossim, o caput do art. 1º da referida lei determina a proibição da exportação dos produtos já mencionados “enquanto perdurar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) em decorrência da infecção humana pelo novo coronavírus”.
Destarte, trata-se de normal penal complementar de caráter excepcional, porquanto adiciona um componente essencial ao tipo.
Lei de Caráter Excepcional
Neste sentido, ressalta-se que a lei excepcional é editada em função de algum evento transitório.
Exemplos disso são o estado de guerra, calamidade ou qualquer outra necessidade estatal, e perdura enquanto persistir o estado de emergência.
Além disso, a lei de caráter excepcional é autorrevogável, pois se considera eliminada do ordenamento jurídico assim que cessada a situação de anormalidade que a tenha fundamentado.
Destarte, o complemento da norma penal (Lei 13.993/20) terá vigência até que o ministro da Saúde determine a cessação do estado emergencial.
Uma vez determinada a cessação do estado emergencial, a lei que proíbe a exportação perderá eficácia e, como consequência, o fato se tornará atípico.
Todavia, deve-se ressaltar que a lei excepcional alcança os fatos praticados durante a sua vigência, ainda que as circunstâncias de emergência tenham se esvaído.
Isto porque essas condições são elementos temporais do próprio fato típico.
Portanto, a partir do dia 24 de abril de 2020 e enquanto persistir a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional determinada pela Portaria 188 do ministro da Saúde, quem exportar, por qualquer meio, os produtos elencados no art. 1º, § 1º da Lei 13.993/20 cometerá o crime de contrabando.
Finalmente, tais efeitos não cessarão quando encerrado o estado emergencial na área da saúde, por força do art. 334-A do Código Penal.