O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Estado pode determinar aos cidadãos que se submetam, compulsoriamente (obrigatoriamente), à vacinação contra a Covid-19, prevista na Lei 13.979/2020.
Medidas restritivas
De acordo com a decisão, o Estado poderá impor aos cidadãos que se recusem à vacinação, as medidas restritivas previstas em lei (multa, impedimento de frequentar determinados lugares, fazer matrícula em escola), entretanto, não pode fazer a imunização à força.
Da mesma forma, foi definido que os estados, o Distrito Federal e os municípios possuem autonomia para realizar campanhas locais de vacinação.
Vacinação
O entendimento foi definido no julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587, que versam unicamente sobre a vacinação contra a Covid-19, e do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1267879, em que se discute o direito à recusa à imunização por convicções filosóficas ou religiosas.
O exame da matéria foi iniciado na sessão da última quarta-feira (16/12), com o voto do ministro Ricardo Lewandowski, relator das ADIs.
Direito coletivo
Apresentado na sessão de julgamento, o voto do ministro Luís Roberto Barroso, relator do ARE 1267879, destacou que, apesar de a Constituição Federal proteger o direito de cada cidadão de manter suas convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais, os direitos da sociedade devem prevalecer sobre os direitos individuais.
Por essa razão, o Estado pode, em situações excepcionais, proteger as pessoas, mesmo contra sua vontade como, por exemplo, ao obrigar o uso de cinto de segurança.
Imunização
Na avaliação do ministro Barroso, não são legítimas as escolhas individuais que atentem contra os direitos de terceiros.
Nesse sentido, o ministro-relator observou que a vacinação em massa é responsável pela erradicação de uma série de doenças. No entanto, para isso, é necessário imunizar uma parcela significativa da população, a fim de atingir a chamada imunidade de rebanho.
Constitucionalidade
Do mesmo modo, o ministro também manifestou-se pela constitucionalidade da vacinação obrigatória, desde que o imunizante esteja devidamente registrado por órgão de vigilância sanitária, esteja incluído no Plano Nacional de Imunização (PNI), tenha sua obrigatoriedade incluída em lei ou tenha sua aplicação determinada pela autoridade competente.
Meios indiretos
O ministro Nunes Marques, que ficou parcialmente vencido, também considera possível a instituição da obrigatoriedade da vacina contra a Covid-19 pela União ou pelos estados, desde que o Ministério da Saúde seja previamente ouvido, e apenas como última medida de combate à disseminação da doença, após campanha de vacinação voluntária e a imposição de medidas menos gravosas.
O ministro Nunes Marques considera que essa obrigatoriedade pode ser implementada apenas por meios indiretos, como a imposição de multa ou outras restrições legais.
Recusa
Em relação à recusa em vacinar os filhos, o ministro afirmou que a liberdade de crença filosófica e religiosa dos pais não pode ser imposta às crianças.
Isto porque, o poder da família não existe como direito ilimitado para dirigir o direito dos filhos, mas sim para proteger as crianças contra riscos decorrentes da vulnerabilidade em que se encontram durante a infância e a adolescência.
Obrigatoriedade dupla
Por sua vez, o ministro Alexandre de Moraes destacou que a compulsoriedade da realização de vacinação, de forma a assegurar a proteção à saúde coletiva, é uma obrigação dupla: o Estado tem o dever de fornecer a vacina, e o indivíduo tem de se vacinar.
Já o ministro Edson Fachin, entende que nenhuma autoridade ou poder público pode se esquivar de adotar medidas para permitir a vacinação de toda a população e assegurar o direito constitucional à saúde e a uma vida digna. “A imunidade coletiva é um bem público coletivo”, afirmou.
Complexo de direitos
De acordo com a ministra Rosa Weber, eventuais restrições às liberdades individuais decorrentes da aplicação das medidas legais aos que recusarem a vacina são imposições do próprio complexo constitucional de direitos, que exige medidas efetivas para a proteção à saúde e à vida.
“Diante de uma grave e real ameaça à vida do povo, não há outro caminho a ser trilhado, à luz da Constituição, senão aquele que assegura o emprego dos meios necessários, adequados e proporcionais para a preservação da vida humana”, argumentou.
Solidariedade
Ao acompanhar os relatores, a ministra Cármen Lúcia defendeu a prevalência do princípio constitucional da solidariedade, porquanto o direito à saúde coletiva se sobrepõe aos direitos individuais. “A Constituição não garante liberdades às pessoas para que elas sejam soberanamente egoístas”, afirmou.
O ministro Gilmar Mendes observou que, enquanto a recusa de um adulto a determinado tratamento terapêutico representa o exercício de sua liberdade individual, ainda que isso implique sua morte, o mesmo princípio não se aplica à vacinação, porquanto, neste caso, a prioridade é a imunização comunitária.
Do mesmo modo, o ministro Marco Aurélio entende que, como está em jogo a saúde pública, um direito de todos, a obrigatoriedade da vacinação é constitucional. “Vacinar-se é um ato solidário, considerados os concidadãos em geral”, declarou.
Ameaças
O presidente do STF, ministro Luiz Fux, em voto acompanhando integralmente os relatores, destacou o empenho e o esforço dos ministros para que o julgamento fosse concluído rapidamente, de forma a transmitir à sociedade segurança jurídica ao tema, frente a uma pandemia que já provocou a morte de milhares de brasileiros.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o ministro Fux observou que, a hesitação quanto à vacinação é considerada uma das 10 maiores ameaças à saúde global.
Teses
A tese de repercussão geral fixada no ARE 1267879 foi a seguinte:
“É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, tenha sido incluída no plano nacional de imunizações; ou tenha sua aplicação obrigatória decretada em lei; ou seja objeto de determinação da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”.
Nas ADIs, foi fixada a seguinte tese:
(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, facultada a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade; e sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente.
(II) Tais medidas, com as limitações expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.
Fonte: STF
Veja mais informações e notícias sobre o mundo jurídico AQUI