A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que condenou uma faculdade a indenizar em R$ 15 mil os danos morais sofridos por ex-aluna devido ao protesto indevido de uma letra de câmbio, realizado com o objetivo de interromper a prescrição para a cobrança de mensalidades escolares em atraso.
Para o tribunal, como não houve o aceite da letra de câmbio, não se formalizou vínculo cambiário entre as partes, razão pela qual não poderia ter havido o protesto contra a ex-aluna.
Nulidade do Protesto
Ao reconhecer a nulidade do protesto – efetuado com o objetivo principal de interromper o prazo prescricional das dívidas em aberto –, o TJMG também declarou a prescrição do débito relativo às mensalidades vencidas.
Em ação anulatória de título de crédito cumulada com cancelamento de protesto e compensação por danos morais ajuizada contra a entidade educacional, a ex-aluna afirmou que teve que abandonar o curso universitário por motivos pessoais.
A faculdade apresentou reconvenção, com o objetivo de obrigar a autora a pagar o débito ainda não prescrito.
O TJMG reconheceu a nulidade do protesto da letra de câmbio não submetida ao aceite da sacada. Em consequência, o tribunal fixou danos morais no valor de R$ 15 mil e declarou a prescrição da dívida.
Aceite
No recurso especial, a faculdade sustentou a validade do protesto por falta de pagamento de letra de câmbio sacada à vista, pois, nessa modalidade de vencimento, a apresentação do título ao sacado para aceite seria desnecessária.
A ministra Nancy Andrighi, relatora, lembrou que a letra de câmbio dispensa, de fato, o aceite do sacado.
Apesar disso, ela observou que a mera menção ao nome do devedor no título não gera uma relação cambial entre o portador da cédula e a pessoa por ele indicada para pagar a dívida constante do documento.
A relatora apontou que a simples designação do nome do sacado não lhe gera qualquer responsabilidade cambiária, já que não há no título a sua assinatura, sendo ele devedor apenas na relação que originou a criação da letra de câmbio.
Devedores Indiretos
Em consonância com precedentes da própria Terceira Turma, a ministra explicou que, nos casos de letra com vencimento à vista, não sendo possível caracterizar o sacado como devedor principal – por recusa ou desnecessidade do aceite, por exemplo –, o portador do título deve protestá-lo por falta de pagamento, a fim de exercer os direitos cambiários em relação aos devedores indiretos (como sacador, endossantes e avalistas).
“Assim, vencendo-se o título apresentável à vista sem aceite, é ônus do portador da cártula protestar o título por falta de pagamento, não mais para obter do sacado o aceite, nem para impor-lhe a condição de devedor principal, mas para poder exercitar contra os devedores indiretos da cártula as ações cambiárias que dela derivam”, afirmou a relatora.
Sem Eficácia
Nancy Andrighi enfatizou que, no caso de letra de câmbio sem aceite, a menção ao nome do sacado é meramente documental e indicativa da recusa ou falta do aceite, tendo em vista que os efeitos do protesto não o atingem.
Ademais, a ministra afirmou que, se não há responsável principal – por falta de aceite – e se não é possível o exercício de direito de regresso contra os devedores indiretos – seja porque a cártula não circulou, seja porque foi realizado o protesto no tempo próprio –, a letra de câmbio deixa de ter a natureza de título de crédito, “consistindo em um mero documento, produzido unilateralmente pelo sacador, sem eficácia cambial”.
Quanto à prescrição, a relatora destacou que, nas letras de câmbio sacadas na vigência do Código Civil de 2002 e nas quais não tenha havido aceite pelo sacado, o protesto só interrompe o prazo prescricional das ações cambiárias do portador contra o sacador e os demais devedores indiretos, na hipótese de ter ocorrido sua circulação – o que não chegou a acontecer no caso dos autos.
Ato Ilícito
Nancy Andrighi lembrou que a faculdade sacou letra de câmbio em que apontou a ex-aluna como sacada e, além disso, colocou-se na posição de tomadora beneficiária da ordem de pagamento, levando o título a protesto com o propósito de interromper o prazo prescricional para a cobrança da dívida.
Nesse cenário, a relatora entendeu que a entidade educacional, ao protestar o título contra a ex-aluna sem o aceite, efetuou o protesto contra pessoa que não poderia ser indicada no ato documental, praticando ato ilícito.