Reflexos da Lei Maria da Penha e no Direito do Trabalho
A Lei Maria da Penha foi criada para evitar crimes contra a mulher e punir quem o pratica e, com isso, trouxe grandes alterações ao ordenamento jurídico.
Porém, a referida lei precisa ser lapidada para garantir sua efetiva aplicação, uma vez que alguns dispositivos possuem lacunas.
No presente artigo, trataremos da Lei Maria da Penha e suas implicações nos vínculos trabalhistas.
Conquistas Civis e Políticas das Mulheres
Inicialmente, no sentido amplo e com enfoque nas lutas e conquistas femininas, a política compreende a participação da população no processo decisório, bem como na decisão de regras e normas.
Com efeito, o feminismo é um movimento social e político, cuja finalidade é a igualdade de gênero em todos os aspectos. Através deste movimento, as mulheres conquistaram gradativamente seu espaço na sociedade.
Todavia, apenas com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foram incluídos dispositivos baseados nos movimentos feministas.
Lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha nasceu de uma denúncia, realizada por uma mulher que sofreu graves consequências decorrentes de violência doméstica, perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Após o recebimento desta denúncia, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos publicou um relatório para o Brasil recomendando a reparação efetiva e pronta da vítima.
Ademais, indicou a adoção de medidas no âmbito nacional, para eliminar a negligência, omissão e tolerância do Estado Brasileiro ante a violência doméstica contra as mulheres.
Todavia, apenas em 2006, a partir de um anteprojeto elaborado por organizações não governamentais de defesa da mulher que posteriormente foi transformado em projeto de lei, foi promulgada a Lei 11.340.
A constitucionalidade da lei chegou a ser questionada, pois a princípio parece discriminatória, tratando a mulher como eterno sexo frágil diante do homem.
Todavia, a tese da inconstitucionalidade da lei não foi acatada pelo ordenamento brasileiro.
Isto porque somente procura diminuir os desníveis de tratamento em razão do sexo, resultantes de uma sociedade historicamente marcada por costumes machistas.
Portanto, trata-se de um estatuto protetivo, que leva em consideração as condições peculiares das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.
Dessa forma, a lei Maria da Penha trouxe um conjunto de regras penais e extrapenais, princípios, e diretrizes em prol da prevenção da violência doméstica, protegendo, sobretudo, a mulher.
Aspectos da Violência Doméstica
A situação aterradora enfrentada pelas mulheres vítimas de violência merece maior atenção, a fim de garantir a efetividade dos direitos protegidos.
Com efeito, a violência doméstica e familiar consiste fenômeno ainda enraizado na desigualdade entre os sexos que acompanha a sociedade desde a sua origem.
Destarte, apesar do processo evolutivo da sociedade, ainda persiste de forma velada um sistema patriarcal que discrimina a figura feminina nos campos civil, político, econômico e social.
O afastamento do parâmetro preexistente, o qual determinava que ao homem cabe o espaço público e à mulher, o espaço privado, nos limites da família e do lar, fez surgir o conflito entre os gêneros.
A Aplicabilidade da Lei Maria da Penha nos Contratos de Trabalho
O contrato de trabalho consiste em instrumento bilateral, consensual, comutativo, oneroso, de trato sucessivo e de atividade.
Ademais, é necessário mencionar que a formação do contrato de trabalho pressupõe a presença dos seguintes elementos:
- capacidade das partes, que significa a aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações no ordenamento jurídico;
- licitude do objeto, cuja premissa é a de que a prestação do serviço está em consonância com a lei; e, ainda,
- consentimento, que nada mais é do que o acordo de duas ou mais vontades.
Via de regra, presume-se que o contrato de trabalho terá validade por prazo indeterminado, resistente à dispensa arbitrária.
A exceção à regra são os contratos por prazo determinado, inclusive o de trabalho temporário.
A Lei Maria da Penha também trouxe uma proteção no âmbito trabalhista às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, garantindo-lhes a manutenção do emprego.
Referido dispositivo legal assegura a preservação do vínculo laboral da mulher vítima de violência doméstica e familiar, determinando, quando necessário, o afastamento do local.
Isto quando tratar-se de empregada celetista, independentemente de o empregador ser pessoa física ou jurídica da esfera privada.
Portanto, verifica-se uma nova forma legal de garantia de estabilidade provisória no emprego.
É, pois, vedado ao empregador demitir a funcionária violentada no ambiente doméstico ou familiar durante os seis meses.
Afastamento da Mulher ao Local de Trabalho e Implicações
A hipótese deste dispositivo relaciona-se aos institutos de suspensão e interrupção do pacto laboral e de garantias de emprego, previstos na CLT e na Constituição Federal de 1988.
Porém, a determinação do dispositivo não pode ser feita de ofício, exigindo-se que a mulher requeira a medida formalmente, conforme disposto no art. 12, III, da Lei 11.340/2006:
“Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: (…)
III – remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência.”
Outrossim, é sabido que o tratamento desigual atribuído às mulheres na seara trabalhista se dá pelos custos que a contratação gera para o empregador.
Estes relacionam-se com a maternidade e com o cuidado com os filhos.
Adicionalmente, pode o empregador ter que arcar com o ônus decorrente da violência doméstica e familiar sofrida pela empregada.
Assim, a preferência por empregados homens acaba sendo maior, contribuindo para que o desemprego afete mais o sexo feminino.
Se, por acaso, o empregador descumprir a ordem judicial da justiça comum, vindo a dispensar a trabalhadora devido ao seu afastamento, caberá ajuizamento de ação na justiça do trabalho.
Por fim, através da Reclamação Trabalhista ajuizada pela empregada, deverá ser requerida sua reintegração empregatícia.