A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) acolheu pedido do Ministério Público Federal (MPF) e reconheceu a invalidade, caducidade e nulidade da concessão do serviço de radiodifusão outorgado à Abril Radiodifusão S/A, em decorrência da transferência ilegal do serviço público à Spring Televisão S/A. O negócio foi realizado, em dezembro de 2014, sem a participação da União.
Danos morais coletivos
Diante disso, o órgão colegiado condenou as empresas e a União, por omissão, ao pagamento de danos morais coletivos em 10% do valor da transmissão, que foi realizada por R$ 290 milhões. Dessa forma, a União deverá licitar novamente o serviço por intermédio do Ministério das Comunicações.
Concessão
Na decisão da Turma, o desembargador federal Marcelo Saraiva, que redigiu o voto revisor, esclareceu que a concessão consiste na “transferência pela qual a Administração delega a outrem a execução de um serviço público, para que o faça em seu nome, por sua conta e risco”.
Dessa forma, o Poder Público transfere ao particular apenas a execução dos serviços, continuando a ser seu titular, devendo a concessão ser realizada sempre por meio de licitação.
Além disso, o magistrado destacou que os particulares não podem comercializar sua posição de delegatários e que a transferência direta de autorização de concessão de radiodifusão é possível conforme a lei, porém exige, para a validade do ato, a prévia anuência do órgão competente do Poder Executivo.
Ausência de anuência prévia
De acordo com as informações do processo, a concessão à Abril Radiodifusão foi outorgada em 1985 e renovada em 2002 pelo prazo de quinze anos. No período concessivo, entre outras programações, a empresa transmitiu a MTV Brasil, que encerrou suas transmissões em 31 de setembro de 2013; entretanto, no dia seguinte, a Spring já passou a veicular sua programação.
Nesse sentido, o relator do voto revisor ressaltou: “A efetiva transferência do serviço foi realizada sem a anuência prévia do Ministério das Comunicações, sendo, inclusive, anterior às autorizações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, que ocorreram em 20/01/2014”.
Além disso, de acordo com o magistrado, o Decreto Presidencial concedendo a transmissão foi publicado em 16 de outubro de 2016, sendo “inadmissível” que a Spring passasse a veicular sua programação em 01 de outubro de 2013.
Nulidade do negócio jurídico
Na avaliação do desembargador, ao encerrar as atividades da MTV, a Abril deveria ter solicitado a encerramento de sua autorização, entretanto, providenciou, “ao arrepio da legislação”, a alienação à Spring, que passou imediatamente a utilizar o espectro de radiofrequência para transmissão de programação.
Do mesmo modo, o desembargador destacou que caberia ao Poder Concedente decretar a caducidade da concessão e, consequentemente, a extinção do contrato, por ato unilateral, por descumprimento de obrigações contratuais pelo concessionário. Todavia, a União se omitiu, e, em 2016, publicou decreto transferindo a concessão.
Vício de finalidade
“E não é demasiado falar na existência de vício em relação à finalidade, consistente no fato de que o Decreto Presidencial prestou-se, na verdade, a chancelar negócio jurídico reconhecidamente nulo, no interesse exclusivo das partes envolvidas no negócio, desprotegendo o interesse público de que o serviço concedido fosse executado conforme os preceitos legais que regem o contrato de concessão, configurando-se, dessa forma, vício insanável, segundo o artigo 2°, parágrafo único, alínea e da Lei nº 4.717/65, igualmente a ensejar a nulidade do Decreto”, afirmou.
Enriquecimento Ilícito
Diante disso, o desembargador federal Marcelo Saraiva concluiu que a operação levou ao enriquecimento ilícito, correspondente à renda de R$ 290 milhões recebida pela Abril, bem como ao dano moral coletivo pela comercialização privada de outorga de radiodifusão e da sua indevida convalidação pela União.
Por essa razão, a 4ª Turma, por maioria de votos, acolheu o pedido de declaração judicial da invalidação, caducidade e nulidade da concessão do serviço de radiodifusão outorgado à Abril, assim como ao pagamento de indenização por danos morais coletivos correspondente a 10% do valor do negócio, rateados entre as rés. A destinação do valor deve ser revertido ao fundo de recomposição dos interesses supra-individuais lesados, conforme previsão do artigo 13, da Lei nº 7.347/85”.
Além disso, o órgão colegiado declarou a obrigação da União de licitar novamente o serviço de concessão.
(Apelação Cível nº 0026301-70.2015.4.03.6100)
Fonte: TRF-3
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