O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a cláusula de plano de previdência privada complementar que estabelecer valor inferior do benefício inicial da complementação de aposentadoria para mulheres em razão de seu tempo de contribuição viola o princípio da isonomia.
O Plenário, na sessão virtual encerrada em 17/08, por maioria, negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 639138, com repercussão geral reconhecida (Tema 452).
Previdência complementar
A matéria chegou ao Supremo porque a Fundação dos Economiários Federais (Funcef) recorreu de decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS).
Assim, em ação ajuizada por uma funcionária da Caixa Econômica Federal (CEF), reconheceu afronta ao princípio da isonomia e invalidou cláusula contratual de previdência complementar. A cláusula determinava a aplicação de percentuais distintos para homens e mulheres no cálculo da aposentadoria privada.
Isonomia
Portanto, o Tribunal considerou: “os planos de previdência privada devem submeter-se às regras de ordem pública e que tanto homens quanto mulheres contribuem sobre bases salariais idênticas”. Por isso, é razoável que tenham expectativa de receberem proventos suplementares em igual medida.
Alegações da Funcef
Entretanto, a Funcef alegava que o associado do sexo masculino, ao contribuir durante 30 anos, tem direito à aposentadoria proporcional no patamar de 80%; enquanto, a associada do sexo feminino, com 25 anos de contribuição, tem direito a um patamar proporcional de 70%.
Distinção de requisitos
Ao proferir o voto condutor do julgamento, o ministro Edson Fachin observou inicialmente que: “há na Constituição Federal, a distinção de requisitos para aposentação de homens e mulheres, tanto no regime geral quanto no regime próprio dos servidores públicos”.
Nos dois casos, as mulheres são beneficiadas com requisitos menos gravosos de idade e de tempo de contribuição. Segundo o ministro, buscam minorar os impactos enfrentados por elas em razão da desigualdade de gênero na vida em sociedade e no mercado de trabalho.
Igualdade material
Entre os fatores que contribuem para este tratamento desigual, Fachin citou: “a remuneração inferior ao trabalho das mulheres e a falta de reconhecimento das tarefas de cuidado, geralmente desempenhadas por elas”.
De acordo com o ministro, as regras distintas têm o propósito de proclamar igualdade material, não se limitando à igualdade meramente formal.
Dessa forma, a isonomia formal, assegurada pelo artigo 5º, inciso I, da Constituição, exige tratamento equitativo entre homens e mulheres. Contudo, não impede a criação de regras mais benéficas às mulheres, diante da necessidade de medidas de incentivo e compensação não aplicáveis ao gênero masculino.
Esfera privada
O ministro observou ainda que o respeito à igualdade não é obrigação que se aplica somente à esfera pública. No caso dos autos, a controvérsia se refere ao regime privado de previdência complementar, regulado pelo artigo 202 da Constituição.
Para Edson Fachin, a relação da Funcef com seus segurados deve se submeter à eficácia dos direitos fundamentais, especificamente o da igualdade de gênero. “A segurada mulher deve ter assegurado seu direito de receber complementação de aposentadoria sempre no mesmo patamar do segurado homem; sendo irrelevante que contribua por tempo menor”, concluiu.
Ficaram vencidos os ministros Gilmar Mendes (relator) e Marco Aurélio, que davam provimento ao recurso por entender que a adoção de percentuais distintos no cálculo de aposentadoria de homens e mulheres em razão do tempo de contribuição não representa inobservância ao princípio da igualdade.
Tese
A tese de repercussão geral fixada no julgamento foi a seguinte:
“É inconstitucional, por violação ao princípio da isonomia (art. 5º, I, da Constituição da República), cláusula de contrato de previdência complementar que, ao prever regras distintas entre homens e mulheres para cálculo e concessão de complementação de aposentadoria, estabelece valor inferior do benefício para as mulheres, tendo em conta o seu menor tempo de contribuição”.
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