Não é mistério pra ninguém que, nas campanhas eleitorais, surgem muitas vagas de trabalho como cabo eleitoral.
Eles são contratados para distribuição de adesivos, instalação de faixas, entrega de panfletos, ou seja, realização de propaganda política.
Essa pessoa age como um intermediário entre o candidato e a população. Ele atua divulgando as ideias do político ao maior número possível de pessoas. O objetivo é aumentar os votos para algum candidato ou partido.
Muitos veem nesse trabalho temporário uma boa maneira de complementar seus ganhos. Mas, sabendo que existe um limite de renda para a concessão de programas sociais, será que o cabo eleitoral corre o risco de ter seu Auxilio Brasil cortado?
Beneficiários do Auxilio Brasil podem atuar como cabos eleitorais?
Há uma recente discussão acerca da questão que envolve a contratação de quem recebe o Auxílio Brasil para trabalhar em campanhas eleitorais.
Alguns chegam a afirmar que beneficiários do Auxílio Brasil, ou até de outros programas, como o Bolsa Família, não poderiam ser contratados para trabalhar nas campanhas eleitorais de 2022.
Segundo dados do Ministério da Cidadania, até maio de 2022 mais de 86 milhões de famílias estavam cadastradas no Cadúnico. Este cadastro é a porta e entrada para que o cidadão tenha direito a benefícios, como:
- Programa Auxílio Brasil (substituto do Bolsa Família),
- Tarifa Social de Energia Elétrica,
- Programa Minha Casa Minha Vida,
- Auxílio Gás, i
- Isenção de taxa em concursos públicos, entre outros.
Só o programa Auxílio Brasil conta com 20 milhões de beneficiários.
Mas afinal, existe uma proibição legal para que estes beneficiários não trabalhem durante as eleições, em prol de algum partido ou candidato?
Trabalhar em eleições como cabo eleitoral: o que determina a lei?
De início, saiba que não há nenhuma proibição legal que impeça beneficiários de programas sociais de serem cabos eleitorais.
Porém, em tese, eles poderiam perder o direito a receber benefícios, caso sejam contratados para prestar estes serviços.
Isso porque, conforme esta Instrução Normativa, a pessoa física que for “contratada por partido político ou por candidato a cargo eletivo para, mediante remuneração, prestar serviços em campanha eleitoral, deve contribuir à Previdência Social obrigatoriamente na qualidade de contribuinte individual.”
Por causa desta contribuição obrigatória, o governo poderia, em tese, encerrar o benefício, identificando a renda familiar per capta superior ao permitido para a concessão do benefício, segundo a Lei 14.284/2021.
Cintia Rolim, Jurista Especializada em Direito, entende que visto que o Auxilio Brasil visa socorrer de forma urgente as famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza, esse assunto deve ser cuidadosamente analisado.
“Não há justificativa para qualquer entendimento de vedação ou de interrupção do recebimento de benefício, (…). O Auxílio Brasil expressamente prevê, entre outras metas, o incentivo ao esforço individual, promoção da cidadania, superação das vulnerabilidades sociais, promover oportunidades de capacitação e de empregabilidade dos beneficiários, de forma a proporcionar autonomia e independência”, explica Cintia, em artigo publicado no site Jus.com.
Outro fato que merece atenção é o curto período de tempo da campanha eleitoral. “Alguns dias de campanha, um mês ou 45 dias, não alteram a realidade dessas famílias, mas pode reforçar o orçamento e até mesmo facilitar a antecipação da saída da situação de vulnerabilidade”, complementa a jurista.
Cabo eleitoral gera vínculo empregatício?
O advogado e professor André Doester esclarece em post do seu Instagram: “A despeito de ser um trabalho que muito se aproxima dos requisitos dos arts. 2º e 3º da CLT, segundo a Lei 9.504/97 (art. 100), a contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido contratante”.
Em complemento à isso, a alínea “f” no art. 7º da CLT (inserido pela lei 13.877/2019), prevê que não se aplicam as regras da CLT: “…às atividades de direção e assessoramento nos órgãos, institutos e fundações dos partidos, assim definidas em normas internas de organização partidária”.
Deste modo, o entendimento dominante é de que não há vínculo de emprego nestes casos.
Como deve ser feita a contratação de cabos eleitorais?
A contratação de cabos eleitorais não pode ser feita de qualquer maneira. Existem regras específicas para a contratação desses trabalhadores.
A Justiça Eleitoral determina a quantidade máxima de pessoas permitida para contratação de cabos eleitorais por cargo. O número varia de município para município, sendo que ultrapassar este limite pode caracterizar abuso de poder econômico.
“É uma questão de transparência. A sociedade têm ferramentas importantes de fiscalização, para realmente acompanhar a campanha dos candidatos, para escolher o seu representante e denunciar situações suspeitas. Todo candidato precisa prestar contas de sua campanha, isso é fundamental para garantir condições mínimas de igualdade durante o pleito”, destacou o coordenador de Controle Interno e Auditoria do TRE-MT, Daniel Taurines ao site oficial.
Quanto deve ganhar um cabo eleitoral?
O coordenador Daniel, citado no paragrafo anterior, explica que não existe um valor mínimo ou máximo para se remunerar estas pessoas, os cabos eleitorais. “Estas pessoas são aqueles que entregam santinhos, carregam bandeiras, fazem a logística dos comícios, pedem voto, e de alguma forma, se comprometem com os candidatos. Então é importante que a Justiça Eleitoral coloque um limite nesse quantitativo de pessoas”.
Para quem for trabalhar como cabo eleitoral, é importante saber que todo o pagamento deve ser feito de forma oficial. “Muita atenção ao pagamento por fora, ao valor ‘extra’ pago pelo candidato. Isso é caixa 2, é crime, e pode resultar em problemas muito sérios para o candidato e também para quem recebe este recurso”, acrescenta o coordenador.
Faz diferença ser contratado como cabo eleitoral por um candidato ou por um partido?
Para o cabo eleitoral, não faz diferença alguma. Para quem contrata, sim.
Se for o candidato quem contrata, ele está desobrigado de reter a contribuição previdenciária e o imposto de renda. Visto que não é considerado pessoa jurídica, não precisará fazer a retenção por responsabilidade.
Por outro lado, se for o partido político que contrata, ele está obrigado a reter a contribuição previdenciária e o imposto de renda.
Mesmo que o contratado seja considerado um contribuinte individual, como já foi citado, o partido continua na obrigação de ser o responsável tributário.
Para fins de imposto de renda, e por conta de não ser vínculo de emprego, o trabalhador da campanha eleitoral é considerado trabalhador não assalariado nos termos do artigo 38 do Decreto nº 9.580/2018.