Anteriormente, o CPC de 1973 previa, dentre as “medidas cautelares nominadas”, a chamada “produção antecipada de provas” (arts. 846 a 851).
Com efeito, o procedimento era destinado exclusivamente a colher interrogatório da parte, oitiva de testemunhas ou perícia, para que fosse utilizado em processo ulterior. Apenas na sequência a prova seria efetivamente valorada pelo juiz.
Além disso, havia outros meios para obtenção prévia da prova sem demonstração de urgência, a exemplo da medida cautelar exibição de documentos e o instituto da justificação.
Por sua vez, a promulgação do CPC de 2015 transformou de forma profunda a produção antecipada de provas.
Dentre as alterações mais relevantes, merece destaque a possibilidade de produção antecipada independentemente de demonstração de urgência por risco de perda da prova.
Dessa forma, o CPC de 2015 passou a permitir que as partes venham a juízo exclusivamente para colher prova com o objetivo de se inteirarem das vicissitudes do litígio.
Isto pode se dar para “viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito” (art. 381, II, do Novo CPC) ou mesmo para permitir que, com o “prévio conhecimento dos fatos” se possa “justificar ou evitar o ajuizamento de ação” (art. 381, III, do Novo CPC).
No presente artigo, discorreremos sobre as principais alterações decorrentes do Novo CPC no tocante à produção antecipada de provas.
Destinatário da Prova
No CPC de 1973, reconhecia-se que o destinatário da prova seria fundamentalmente o juiz.
Destarte, a ele cometeria reconstruir os fatos controvertidos em torno dos quais eclodiu litígio, para solucioná-lo por meio de uma decisão imperativa.
Atualmente, reconhece-se que as partes também são destinatárias da prova na medida em que, ao proporcionar às partes mais amplas possibilidades de colher provas antecipadamente, podem-se desestimular demandas temerárias.
Por conseguinte, propiciar condições de uma decisão melhor informada para a autocomposição, em sintonia com a diretriz emergente do art. 3º, § 2º, do Novo CPC.
No entanto, essa alteração trouxe consequências. Primeiramente, uma vez permitida a produção antecipada de provas independentemente da urgência, não fazia mais sentido que o procedimento viesse tratado no contexto da tutela cautelar.
Portanto, o CPC de 2015, portanto, aloca-o na parte geral das normas sobre provas.
Além disso, a segunda consequência está na ampliação dos meios de prova passíveis de colheita antecipada.
Com efeito, o art. 382, §3º, prevê que as partes podem pedir a produção de “qualquer prova”, não se limitando mais à prova oral e à pericial.
Por sua vez, a terceira consequência decorre da segunda, já que trata da absorção, pela produção antecipada de provas, da exibição de documentos e justificação.
Finalmente, a previsão de que é possível às partes pedir a produção antecipada de “qualquer prova” (art. 382, §3º, do Novo CPC), naturalmente, abrange a prova documental.
No entanto, continua contemplada pelo texto legal a possibilidade de pedir produção antecipada de prova, nos seguintes termos:
“art. 381, §5ºJustificar a existência de algum fato ou relação jurídica para simples documento e sem caráter contencioso”
Definição do Objeto da Prova Produzida Antecipadamente
Inicialmente, quando a prova é produzida na fase instrutória do processo de conhecimento, seu objeto é definido pela decisão de saneamento e organização, de acordo com o art. 357, II, do Novo CPC.
Dessa forma, essa decisão delimita inferir quais alegações são relevantes e pertinentes.
Além disso, permite inferir, dentro delas, quais foram impugnadas de forma especificada pelo adversário (art. 341 do Novo CPC) e, portanto, se tornaram controvertidas.
Portanto, somente serão objeto de prova os fatos relevantes, pertinentes e controvertidos.
Por sua vez, dentre eles, somente serão objeto de prova pericial aqueles cuja reconstrução exige conhecimentos científicos específicos, dos quais não dispõe o magistrado.
Além disso, na produção antecipada da prova, a definição do objeto da prova não se submete a essa forma de construção.
Todavia, ainda assim, realizar-se-á o cotejo das narrativas fáticas apresentadas pelos sujeitos parciais.
Caráter Contencioso da Produção Antecipada de Provas
A produção antecipada de prova, salvo na hipótese do art. 381, §5º, do Novo CPC, tem nítido caráter contencioso.
Nesse sentido, a petição inicial deve mencionar “com precisão os fatos sobre os quais a prova há de recair” (art. 382, caput).
Destarte, ao fazê-lo, formula proposições em torno da versão fática que o requerente considera correta e que pretende que reste, ao final, comprovada.
Afinal, o procedimento se inicia depois que o conflito já eclodiu, e o requerente pretende colher a prova para decidir se promove composição amigável com o outro sujeito se ajuíza ação ou se desiste de fazê-lo.
Vale dizer, embora o objeto desse específico processo seja exclusivamente o pedido de produção antecipada da prova, a situação litigiosa de direito material deve ser narrada pelo requerente.
Com efeito, a partir daí que poderão ser verificados alguns aspectos relevantes, tais como a própria pertinência da produção antecipada da prova e os sujeitos que podem ou devem participar dessa produção.
Produção de Prova no Mesmo Procedimento
Por sua vez, o requerido pode, de acordo com o art. 382, §3º:
“requerer a produção de qualquer prova no mesmo procedimento, desde que relacionada ao mesmo fato”.
Todavia, não se pode interpretar o termo “fato” de maneira restritiva.
Em contrapartida, se inviabilizaria completamente o contraditório do sujeito contra o qual se pediu a produção antecipada.
Portanto, deve-se entender “fato” como “mesmo episódio da vida em torno do qual houve litígio” ou as questões que gravitam em torno da “mesma relação jurídica”.
Com efeito, essa interpretação é alinhada àquela que se fazia acerca do art. 278, §1º, do CPC de 197, atinente ao procedimento sumário e que não mais subsiste no CPC de 2015.
Além disso, e ainda se faz quanto ao art. 31 da Lei 9.099/95, relativos ao chamado “pedido contraposto”.
Vale dizer, trata-se de meio simplificado de reconvenção por meio do qual o réu, na própria contestação, formular pedido em seu favor, desde que fundado nos “mesmos fatos” que constituem objeto da controvérsia.
Restrição dos Poderes do Juiz ao Indeferir Provas em Produção Antecipada
Precipuamente, contraditório efetivo e defesa ampla compreendem o poder conferido à parte de se valer de todos os meios possíveis e adequados à reconstrução dos fatos.
Assim, o fundamento do direito à prova se encontra no art. 5º, LIV, da Constituição da República.
Destarte, o pedido de produção de provas somente pode ser indeferido, à luz do art. 370, parágrafo único, quando “inúteis ou protelatórias”.
Inicialmente, para que a prova se revele inútil, incumbe ao magistrado demonstrar a impossibilidade de, até mesmo em tese e independentemente do seu resultado, interferir na reconstrução dos fatos controvertidos.
Em outras palavras, a diligência é inútil quando, se fosse produzida, nada adiantaria a quem a requereu.
Por sua vez, para que a prova se considere protelatória, é necessário que se perceba de forma objetiva que a intenção da parte que a requereu é procrastinar o desfecho da controvérsia.
Assim, para avaliar o intuito protelatório, é necessário que estejam presentes elementos concretos, em especial a prática de atos temerários e desprovidos de substância.
Por fim, em se tratando produção antecipada de provas, os poderes do juiz em indeferi-las apresentam-se ainda mais reduzidos, por duas razões fundamentais.