De acordo com decisão proferida pela juíza Renata Bonfiglio, da 27ª Vara do Trabalho de São Paulo, nos autos do Processo 1000616-94.2020.5.02.0027, o rol de hipóteses que autoriza o saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é apenas exemplificativo, não taxativo.
No caso, a magistrada autorizou que, em razão da calamidade pública imposta pelo coronavírus, um homem retire valores depositados em sua conta vinculada.
Situação de Calamidade Pública
Inicialmente, a ação foi movida em face da Caixa Econômica Federal, gestora das contas de FGTS. O autor afirmou que poderia sacar os valores em razão da epidemia.
Em sua defesa, a Caixa sustentou que a classificação não se enquadra nas hipóteses de desastre natural previstas no artigo 20 da Lei 8.036/90.
No entanto, para a magistrada, o fato de a normativa não conter a palavra “epidemia” não faz com que a situação vivida no Brasil deixe de se equiparar a um desastre natural.
Com efeito, o argumento fundamenta-se no AResp 10.486 e o REsp 1.251.566, julgados pelo Superior Tribunal de Justiça.
Nas duas ocasiões a corte entendeu ser possível autorizar o saque do FGTS, mesmo em casos não expressamente previstos pelo artigo 20 da Lei 8.036/90.
Isso porque, para o STJ, não é possível exigir que o legislador preveja todas as situações fáticas geradoras de proteção ao trabalhador.
Neste sentido, ao fundamentar sua decisão, argumentou a juíza:
“Em que pese o Decreto 5.113/90, ao regulamentar o inciso XVI do artigo 20, trazer um rol de fenômenos da natureza considerados naturais, dentre as quais não se encontram as epidemias e/ou pandemias, fato é que o STJ já se manifestou em diversas oportunidades no sentido de que o rol seria exemplificativo. Assim, seguindo esse raciocínio, também não teria como se defender a taxatividade da lista de desastres naturais do artigo 2º do Decreto 5.113/90, uma vez que as hipóteses ali elencadas restringem-se a situações de enchentes, enxurradas e inundações, havendo uma série de desastres não abarcados pela norma, a exemplo de terremotos, secas, incêndios e as epidemias”.
Outrossim, a decisão afirma que embora não conste a palavra “pandemia” dentro das previsões que permitem o saque, a Lei 8.036/90 é clara ao considerar que a situação de calamidade possibilita a retirada.
Por fim, a magistrada rejeitou argumento da Caixa de que o saque deveria ser limitado a R$ 1.045, teto estabelecido pela Medida Provisória 946/20, uma vez que a MP teve sua vigência encerrada em 4 de agosto, por não ter sida convertida em lei dentro do prazo constitucional.
Desta forma, o autor foi autorizado a retirar R$ 6.222,00, tal como previsto na Lei 5.113/04, que regulamenta o artigo 20, inciso XVI, da Lei 8.036/90.