No cenário econômico brasileiro, a procura por empréstimos tem apresentado uma diminuição significativa nos últimos meses. Dados do Indicador de Demanda dos Consumidores por Crédito, da Serasa Experian, revelam que houve uma queda de 2,4% em julho, em comparação com junho. Além disso, em relação a julho do ano anterior, a retração foi de 10,9%. Essa tendência negativa tem se mantido ao longo de 14 meses consecutivos, desde junho de 2022.
Análise dos Dados
Durante o ano de 2023, a redução na procura por crédito foi de 12,3%. Já no acumulado dos últimos 12 meses, a queda foi ainda maior, chegando a 14%. A Serasa Experian obtém esses números por meio de um acompanhamento mensal das consultas para concessão de crédito relacionadas ao Cadastro de Pessoas Físicas (CPFs) presentes em seu banco de dados. Nenhuma Unidade Federativa (UF) apresentou crescimento na busca por crédito por parte dos consumidores.
De acordo com o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi, essa retração é reflexo da política de juros vigente no país. Os consumidores têm se mostrado relutantes em buscar crédito, principalmente devido às altas taxas de juros, o que torna o momento desfavorável para esse tipo de transação financeira.
No início de agosto, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reduziu a taxa básica de juros da economia (Selic) para 13,25% ao ano, o que representa o primeiro corte em três anos. A Selic exerce influência direta no comportamento das taxas de juros cobradas nos empréstimos oferecidos às pessoas físicas.
Impactos da Selic Alta
Segundo comunicados do Banco Central, a manutenção da taxa Selic em patamares elevados tem como objetivo controlar a inflação. No entanto, um efeito adverso dessa política é que a Selic alta também é recessiva, ou seja, dificulta o acesso ao crédito, o consumo e os investimentos.
O professor de economia Ruy Santacruz, da Universidade Federal Fluminense (UFF), destaca que, além do reflexo das altas taxas de juros, os dados da Serasa Experian também evidenciam um efeito estatístico decorrente da alta demanda por crédito nos últimos anos.
“A retenção da demanda por crédito ocorre devido à procura muito elevada durante a pandemia e logo após a pandemia também. Portanto, na realidade, a demanda por crédito não está baixa nos dias atuais, ela está até razoavelmente alta. A queda ocorre porque está dentro de um patamar ainda mais elevado”, pondera o professor.
A Importância do Crédito na Economia
Apesar das preocupações em relação ao endividamento e ao risco de inadimplência, a tomada de crédito é uma ferramenta essencial para o bom funcionamento da economia, gerando crescimento, emprego e renda. O professor da UFF ressalta que, sem crédito, não há consumo por parte das famílias.
“Para que o PIB cresça, para que o emprego cresça, é necessário que as famílias consumam mais, gastem mais”, explica Santacruz. Essa premissa também se aplica às empresas, responsáveis por grande parte dos investimentos no país, além dos governos. Portanto, pode-se afirmar que o crédito é o termômetro da economia.
O Orçamento Familiar e a Queda na Inadimplência
Santacruz acredita que parte da queda na demanda por crédito se deve também à inadimplência, que apresentou um recuo recente, mas que ainda se mantém em patamar elevado. Segundo o professor da UFF, as pessoas estão aguardando um ajuste em suas finanças pessoais, quitando parte de suas dívidas. Quando a inadimplência diminuir ainda mais, é provável que ocorra uma estabilização na busca por crédito.
Luiz Rabi, da Serasa Experian, afirma que o aumento na demanda por crédito ocorrerá com um reordenamento do orçamento familiar. Medidas importantes para que o indicador volte a registrar números positivos são a renegociação de dívidas e a redução de gastos, visando à reorganização financeira dos consumidores.
De acordo com o levantamento da Serasa Experian, a redução na procura por financiamentos no acumulado dos últimos 12 meses foi maior entre pessoas com renda de até R$ 1 mil, com queda de 15%. Já as pessoas com renda superior a R$ 10 mil apresentaram uma retração de 11,5%.
Queda no Endividamento e o Programa Desenrola Brasil
Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o nível de endividamento das famílias brasileiras apresentou uma queda pela primeira vez em sete meses, chegando a 78,1% das famílias em julho. Esse é o menor índice desde janeiro (78%). Um dos fatores que contribuíram para essa diminuição, segundo a CNC, foi o programa Desenrola Brasil, criado pelo governo federal para estimular a renegociação de dívidas e a regularização do cadastro restritivo de crédito dos consumidores.
O mais recente balanço sobre o Desenrola Brasil, divulgado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), aponta que cerca de R$ 9,5 bilhões em dívidas foram negociados em um mês. Esse dado refere-se ao período de 17 de julho a 18 de agosto.
Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, considera que a procura por crédito não está diretamente associada ao programa Desenrola Brasil. Para ele, outras variáveis econômicas também influenciam o interesse dos consumidores por empréstimos, como a taxa de juros, a confiança do consumidor e o nível de emprego.
Reordenamento do Orçamento Familiar
A procura por empréstimos no Brasil tem registrado uma queda significativa nos últimos meses, reflexo das altas taxas de juros e de outros fatores econômicos. No entanto, o crédito desempenha um papel fundamental para o crescimento econômico, gerando emprego, renda e impulsionando o consumo. A renegociação de dívidas e o reordenamento do orçamento familiar são medidas importantes para que a demanda por crédito volte a apresentar números positivos. Além disso, programas como o Desenrola Brasil têm contribuído para a redução do endividamento e a regularização do cadastro restritivo de crédito dos consumidores brasileiros.