Multiparentalidade: Criança terá registro de pais biológico e socioafetivo
Em decisão que concedeu parcial procedência de Ação de Reconhecimento de Paternidade para inclusão de nome de pai biológico, o Juiz Fernando Vieira dos Santos concedeu o reconhecimento do genitor no documento civil de registros, sem contudo, excluir a paternidade do pai registral que já possuía vínculo afetivo.
Também determinou a inclusão do nome do pai biológico e também dos avós paternos.
De acordo com o entendimento do magistrado:
“A solução, portanto, com a devida licença aos entendimentos em contrário, é aquela que percebe, identifica, valoriza e atribui significado a todos os sentimentos envolvidos. E isso significa multiparentalidade. E, aqui, não estamos falando simplesmente de genética. Estamos falando, notadamente, de afeto, que é o que deveria marcar, de fato, as relações familiares”.
Entenda o Caso
O processo tramita em segredo de justiça na Comarca de São Valentim.
No caso, o autor ingressou na justiça objetivando o reconhecimento da paternidade da criança, com correção de seu registro de nascimento, para dele constar o seu nome como pai, com consequente anulação do registro anterior.
Conta que, por um período de 10 meses, manteve envolvimento amoroso com a mãe da criança.
Alegou que, quando soube da gravidez, ela já estava em uma união estável com outro homem e que este optou por registrar a criança, logo após o seu nascimento.
Já a mãe relatou que teve um relacionamento passageiro com o autor da ação durante uma breve separação de seu companheiro, e que acabou engravidando.
Contudo, após descobrir que estava grávida, comunicou ao ex-namorado, que logo levantou dúvidas quanto à paternidade.
Somado a tudo isso, a mulher também destacou que o companheiro, pai socioafetivo, além do registro, exerceu papel de pai com dedicação desde o nascimento do bebê.
Conta que, após alguns meses, o seu ex a procurou, pedindo o exame de DNA, que atestou a paternidade biológica.
Laços Afetivos
Enfatizou os laços afetivos existentes entre a filha e o pai socioafetivo, os quais não podem ser apagados o que impossibilitaria a sua exclusão do registro civil da menina.
A criança recebeu avaliação psicológica para averiguação de possíveis consequências psicológicas decorrentes de eventual exclusão da paternidade socioafetiva.
O Ministério Público opinou, por sua vez, pela rejeição da tese de multiparentalidade e pela procedência do pedido, para o fim de incluir o autor como pai no registro de nascimento da criança, com posterior retirada do nome do pai socioafetivo.
Sentença
Em seu entendimento o magistrado frisou que é notória a paternidade biológica do autor, comprovada pelo exame de DNA.
Assim acolheu, em parte, a ação, destacando que a multiparentalidade é tema de recente estudo para o direito de família e, como decorrência necessária, a paternidade socioafetiva.
Realizou uma breve análise sobre a noção da entidade familiar e suas modificações ao longo dos anos.
Observou que a conduta da mãe da criança, que efetuou exame de DNA extrajudicialmente requerido pelo autor, permitindo a proximidade dele, resultou no estabelecimento de laços também afetivos com a filha.
Tanto – e principalmente – com o pai registral, com quem elas já estavam estabelecidas, quanto, também, com o pai biológico.
Destacou, baseado no laudo psicológico, o forte laço afetivo da criança com o pai registral, com ênfase maior na sua representatividade.
Multiparentalidade
Ainda, ressaltou a prova oral colhida indicando a existência concomitante, das figuras do pai biológico e do pai socioafetivo, a autorizar o reconhecimento da multiparentalidade.
Diante dos fatos apresentados, o Juiz concluiu:
“Ambas as famílias, biológica e socioafetiva, nutrem, de modo e intensidade muito semelhantes, senão idênticos, laços de afeto, amor e cuidado pela infante. Não há solução, diante do quadro verificado, que possa resultar na exclusão de uma das figuras representativas de pai para a infante em detrimento da outra. Não há critério, seja de justiça, seja de direito, que permita concluir pela prevalência pura e simples da paternidade biológica sobre a socioafetiva. Muito antes ao contrário: aqui, se algum dos liames houvesse de prevalecer, haveria de ser a socioafetividade, que, como no laudo, se mostra a mais significativa vinculação paterna estabelecida pela infante.”