A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão unânime, proferida na tarde desta terça-feira (13/10), decidiu que nos crime de estelionato, não é necessária a exigência da representação (autorização) da vítima para o cabimento de ação penal nos casos em que o Ministério Público já tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor do parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal (CP). A matéria foi analisada pela 1ª Turma do STF.
Representação da vítima
Para a instauração da ação penal pelo crime de estelionato, a nova regra introduzida pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), incluiu o requisito ao mudar a natureza da ação penal de pública incondicionada para pública condicionada à representação da vítima.
Desse modo, o promotor não pode mais denunciar o acusado do crime de estelionato se a vítima não se manifestar nesse sentido, salvo quando se tratar de crime contra a Administração Pública (direta ou indireta), criança ou adolescente, pessoa com deficiência mental, maior de 70 anos de idade ou incapaz, de acordo com a redação do parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal (CP).
Lesão a pessoas hipossuficientes
A decisão da 1ª Turma aconteceu no julgamento do Habeas Corpus (HC) 187341, impetrado em favor de Eric Fabiano Arlindo que, através de sua empresa, lesava pessoas hipossuficientes ao oferecer a renegociação de dívidas.
De acordo com os autos do processo, há registros de que o réu teria praticado o crime contra mais de 100 vítimas e, no caso em análise, induziu a erro duas pessoas, ao fazê-las acreditar que seriam ajuizadas ações visando à revisão contratual dos juros de contrato de financiamento de um veículo.
Condenação
Por essa razão, Arlindo foi condenado pela 6ª Câmara de Direito Criminal no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a um ano de reclusão, em regime aberto, além de 10 dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída pela prestação de serviços à comunidade.
No entanto, a defesa pleiteava a extinção da punibilidade com base no artigo 107, inciso V, do Código Penal, ou seja, pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada. Além disso, a defesa alegou a necessidade de aplicação da norma mais benéfica introduzida pelo Pacote Anticrime, que passou a exigir representação do ofendido como condição para a abertura da ação penal relativa ao crime de estelionato.
Todavia, no TJSP, a condenação foi mantida, e, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro-relator negou medida liminar. Contra essa decisão, os advogados recorreram ao STF por meio do HC analisado pela 1ª Turma.
Condição ao prosseguimento da ação penal
O ministro Alexandre de Moraes, relator do HC, em seu voto, orientou a decisão por unanimidade da Corte. O ministro-relator analisou que o tema é extremamente recente, sendo essencial o pronunciamento da Corte diante do novo tratamento dado a um antigo tipo penal.
Portanto, no entendimento do relator, a redação da nova legislação não prevê a manifestação da vítima como condição ao prosseguimento da ação penal quando o Ministério Público já tiver oferecido a denúncia, independentemente do momento da prática do delito.
Irretroatividade da lei
De acordo com o ministro-relator, a representação da vítima é obrigatória nos casos em que não tenha sido iniciada a ação penal, em razão da incidência do parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal.
Todavia, a nova regra não pode retroagir às hipóteses em que o Ministério Público tenha oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, isto porque, naquele momento, a norma processual em vigor definia a ação como pública incondicionada para o delito de estelionato.
Ato jurídico perfeito
Ao proferir o voto condutor, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que, como não há possibilidade de retratação da representação após o oferecimento da denúncia, conforme dispõe o artigo 25 do Código de Processo Penal (CPP), a hipótese em julgamento é de ato jurídico perfeito. Desse modo, a manifestação de interesse ou desinteresse da vítima sobre essa denúncia não repercute mais na continuidade da persecução penal.
Indeferimento do HC
Portanto, no caso em julgamento do HC, o ministro-relator verificou que não houve ilegalidade, constrangimento ilegal ou decisão absurda que justifique a concessão excepcional do habeas corpus.
No entendimento do relator a decisão questionada negou corretamente a necessidade de representação da vítima do estelionato, uma vez que a denúncia já havia sido oferecida antes da reforma legislativa que modificou a natureza da ação penal de incondicionada para pública condicionada.
Fonte: STF
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