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Prescrição: processo suspenso limita-se à pena máxima prevista para o crime

De acordo com o ministro-relator Edson Fachin, o texto constitucional, como regra geral, não assegurou ao Estado o direito de punir um indivíduo ou de executar a pena eternamente

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão unânime, decidiu que, nos casos de inatividade processual decorrente de citação por edital, é constitucional limitar a suspensão do prazo prescricional ao tempo de prescrição da pena máxima prevista para o crime. 

A decisão foi proferida no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 600851, com repercussão geral (Tema 438), na sessão virtual finalizada em 04/12. 

Citação sem resposta

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) havia interposto recurso contra decisão do Tribunal de Justiça local (TJDFT) que manteve o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva do Estado em um processo suspenso porque a ré não havia respondido ao edital de citação. No STF o recurso também foi negado.

De acordo com a sentença, diante da ausência de prazo para a suspensão da prescrição, nos termos do artigo 366 do Código de Processo Penal (CPP), deve ser observada a pena máxima em abstrato prevista para a infração, conforme a regra de prescrição estabelecida no artigo 109 do Código Penal (CP), “sob pena de tornar o delito imprescritível”. 

No RE, o MPDFT sustentava que a Constituição Federal não proíbe a suspensão da prescrição por prazo indeterminado nos casos em que o réu não responde a edital de citação.

Prescrição como regra geral

O ministro Edson Fachin, relator do recurso, em seu voto, observou que a regra geral da Constituição Federal é a prescritibilidade das pretensões trazidas a juízo, principalmente no campo penal, em razão do caráter restritivo às liberdades individuais. 

Nesse sentido, o ministro destacou que as exceções, no âmbito criminal, estão expressamente listadas na Constituição: os crimes de racismo e as ações de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. 

“A própria lógica da prescrição é que as pretensões sejam exercidas em prazo previamente delimitado no tempo, e, caso essa limitação não exista, o que se tem, ao fim, é a imprescritibilidade”, declarou.

Garantias constitucionais

Segundo o ministro, se a regra do artigo 366 do CPP for interpretada de forma a admitir a imprescritibilidade, haveria violação às garantias individuais da duração razoável do processo e da celeridade processual (artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição), uma vez que o constituinte não assegurou ao Estado o direito de punir um indivíduo ou de executar a pena eternamente. 

“Nesse contexto, entendo que não se pode admitir um sistema de persecução penal que autorize o julgamento de um delito 30, 40, 50, 100 depois do crime, sem que haja estabilidade do direito”, afirmou. “A liberdade individual não pode ficar sujeita a um prazo indefinido, situação que nada distingue, em essência, da imprescritibilidade”.

Proporcionalidade

Por essas razões, o ministro Edson Fachin concluiu ser constitucional a limitação da suspensão do prazo de prescrição segundo a pena máxima em abstrato do delito em julgamento, em consonância com as balizas do artigo 109 do Código Penal. 

Na avaliação do ministro, essa limitação é condizente com o princípio da proporcionalidade e com a noção de individualização da pena. O relator destacou que esse entendimento, expresso em 2009 na súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), vem sendo aplicado em diversos tribunais, “sem grandes questionamentos”.

Suspensão do processo

Além disso, o ministro Fachin rejeitou o argumento da impossibilidade de o prazo de prescrição continuar a correr enquanto o Estado estiver impossibilitado de agir em razão da suspensão do processo. 

Nesse sentido, o ministro observou que o CPP tem mecanismos que permitem a atuação do Estado-acusação mesmo nessa circunstância, não havendo impedimento, por exemplo, à colheita cautelar de provas consideradas urgentes. 

Outros meios

Do mesmo modo, o Estado não está impedido de promover diligências para tentar localizar o endereço do processado, por meio de consultas ao SPC, Serasa, cartórios extrajudiciais e Tribunais Eleitorais, entre outros meios. 

“Contudo, se o Estado nada faz ou o faz de forma ineficaz e não exitosa, está caracterizado o desinteresse, explícito ou implícito, pela persecução penal, o que faz surgir a razão para prescrição, ainda que o processo permaneça suspenso”, concluiu.

Portanto, o ministro entende que o artigo 366 do CPP, na parte em que prevê a paralisação do processo sem prazo determinado, é compatível com a Constituição Federal, “segundo a qual ninguém pode ser privado da liberdade sem o devido processo legal, assegurados o contraditório e à ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes”. 

Ademais, o ministro lembrou que o próprio CPP (artigo 363, parágrafo 4º) prevê expressamente que somente com o comparecimento do acusado citado por edital o processo prosseguirá em seus devidos termos, dentre eles, a apresentação de resposta à acusação.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: 

“Em caso de inatividade processual decorrente de citação por edital, ressalvados os crimes previstos na Constituição Federal como imprescritíveis, é constitucional limitar o período de suspensão do prazo prescricional ao tempo de prescrição da pena máxima em abstrato cominada ao crime, a despeito de o processo permanecer suspenso”.

Fonte: STF

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