A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou o Enunciado 530 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) para decidir controvérsia de direito intertemporal relativo à norma processual aplicável à impugnação ao cumprimento de sentença, na circunstância em que o prazo para pagamento voluntário terminou na vigência do Código de Processo Civil de 1973.
A disposição do enunciado 530 é que, “após a entrada em vigor do CPC/2015, o juiz deve intimar o executado para apresentar impugnação ao cumprimento de sentença, em 15 dias, ainda que sem depósito, penhora ou caução, caso tenha transcorrido o prazo para cumprimento espontâneo da obrigação na vigência do CPC/1973 e não tenha àquele tempo garantido o juízo”.
Contagem do prazo
O ministro-relator do processo, Paulo de Tarso Sanseverino, esclareceu que o novo CPC, ao entrar em vigor, passou a prever que o prazo para impugnação ao cumprimento da obrigação imposta na sentença seria computado a partir do término do prazo para pagamento voluntário, independentemente de penhora, situação diferente da que ocorria no CPC/1973, o qual dispunha que tal prazo somente era contado a partir da intimação do auto de penhora e avaliação.
O ministro lembrou ainda, que o novo código passou a contar todos os prazos em dias úteis, e não mais em dias corridos, como no antigo CPC/1973.
Caso concreto
O colegiado examinou o caso que envolveu uma instituição bancária que, em 02/03/2016, foi intimada a pagar uma condenação judicial no prazo de 15 dias, nos termos do artigo 475-J do CPC/1973. O prazo, que começou a contar a partir de 03/03/2016, se encerrou em 17/03. No dia 18/03, entrou em vigor o novo código de processo civil. Contudo, na expectativa de que o prazo fosse computado a partir da penhora (como era a regra durante a vigência do CPC/1973), o banco não apresentou impugnação.
Passados alguns meses, a penhora ocorreu por meio do bloqueio de depósitos em conta-corrente, e, em 11/11/2016, a instituição bancária foi intimada apenas para impugnar a ordem de indisponibilidade, não ainda a penhora, posto que a intimação fez referência ao artigo 854, parágrafos 2º e 3º, do CPC/2015.
Já em 06/12/2016, a instituição financeira ofereceu impugnação ao cumprimento de sentença, julgada intempestiva pelo Tribunal de segunda instância, que considerou aplicável o novo código ao caso, sendo, desse modo, desnecessária a penhora para deflagração do prazo para impugnação, de maneira que o prazo já teria se esgotado muito tempo antes.
No STJ, o banco alegou a necessidade de uma intimação específica para a deflagração do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença.
Zona cinzenta
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, ao proferir seu voto, asseverou que o problema contido nos autos se situa numa “zona cinzenta de aplicação do direito intertemporal”, uma vez que a aplicação do CPC/2015 geraria retroatividade desse diploma normativo, ao passo que a aplicação do CPC/1973 causaria ultra-atividade do código revogado.
O magistrado evidenciou que essa zona cinzenta de direito intertemporal decorre do fato de haver conexão entre a intimação para pagamento voluntário e a posterior impugnação ao cumprimento de sentença, considerando que, tanto no antigo CPC como no atual, o decurso do prazo para pagamento voluntário é condição para a impugnação ao cumprimento de sentença, apesar do termo inicial do prazo ser diferente em cada código.
Enunciado
O ministro Sanseverino, mencionou passagem doutrinária e transcreveu o Enunciado 530 do FPPC, defendeu a compatibilização entre as regras da lei nova e as da lei antiga nas hipóteses de conexão entre atos processuais.
O ministro destacou que, ao apresentar o texto do Enunciado 530 do FPPC, “essa proposta, por um lado, elimina a possibilidade de aplicação retroativa do CPC/2015, na medida em que o prazo começa a ser contado de uma intimação a ser realizada na vigência do CPC/2015, não a partir do fim do prazo para pagamento voluntário, ocorrido na vigência do CPC/1973”.
O ministro evidenciou que a proposta elimina também a ultra-atividade indefinida do CPC/1973, caso se entendesse por aplicar o código revogado, e que a exigência de uma intimação “confere segurança jurídica às partes, evitando que seus interesses sejam prejudicados pelo simples fato de seu caso estar situado em uma zona cinzenta da aplicação do direito intertemporal”.
Dessa forma, a 3ª Turma, por unanimidade, seguiu o voto do relator para declarar a tempestividade da impugnação ao cumprimento de sentença oferecida na origem pelo banco.
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