O relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 572, ministro Edson Fachin, na sessão da última quarta-feira (10/06), votou pela legalidade e pela constitucionalidade da instauração do Inquérito (INQ) 4781, para investigar a existência de notícias fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e infrações que podem configurar calúnia, difamação e injúria e atingir a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal (STF), de seus membros e familiares.
De acordo com o ministro a instauração do inquérito se justifica em razão de atos de incitamento ao fechamento do STF, de ameaça de morte ou de prisão de seus membros e de apregoada desobediência a decisões judiciais.
O ministro ressaltou que, embora a Constituição Federal assegure a liberdade de expressão, não há direito que possa justificar o descumprimento de uma decisão judicial da última instância do Poder Judiciário. Para Fachin, são inadmissíveis, no Estado Democrático de Direito, a defesa da ditadura, do fechamento do Congresso Nacional ou do Supremo.
“Não há direito no abuso de direito”, afirmou. “O antídoto à intolerância é a legalidade democrática”. Fachin asseverou que o dissenso é inerente à democracia, mas considera intolerável o dissenso “que visa a impor com violência o consenso”.
Questionamento
A ação foi ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade contra a Portaria GP 69/2019 da Presidência do Tribunal, que determinou a abertura do procedimento investigativo. Segundo o partido, o documento não indicou ato que tenha sido praticado na sede ou nas dependências do STF, quem serão os investigados e se estão sujeitos à jurisdição do Tribunal.
O partido afirma que não compete ao Poder Judiciário, exceto em raras exceções, conduzir investigações criminais e aponta também a necessidade de representação do ofendido para a investigação dos crimes contra a honra e a falta de justa causa para a instauração de inquéritos por fatos indefinidos.
Regra excepcional
De acordo com o relator, o artigo 43 do Regimento Interno do STF, que autoriza ao presidente do Tribunal a instauração de inquérito, é uma regra excepcional que confere ao Judiciário a função atípica de investigação para preservar preceitos fundamentais, entre eles as suas prerrogativas institucionais, diante da omissão ou inércia dos órgãos de controle em exercer essa atribuição.
O ministro apontou que o inquérito é um procedimento administrativo para reunião de elementos de prova, inclusive para saber qual órgão do Ministério Público será competente para analisar as informações apuradas e verificar se os fatos são passíveis de oferecimento de denúncia e de instauração de ação penal.
Fachin evidenciou que não há irregularidade nas investigações, posto que o Ministério Público, titular da ação penal, está devidamente informado e acompanha os procedimentos. Salientou ainda que, nessa fase preliminar, ainda não é possível identificar todos os sujeitos ativos dos delitos ou o órgão ministerial competente. Contudo disse que, após a reunião dos elementos, preservado o acesso devido a todos os interessados, deverá ser encaminhada eventual notícia de crime ao órgão competente.
Parâmetros
O ministro Fachin ressaltou porém, ao julgar improcedente o pedido de nulidade dos atos praticados no inquérito, que considera necessário estabelecer parâmetros para que a investigação seja acompanhada pelo Ministério Público e para que seja observado o direito dos advogados de amplo acesso aos elementos de prova, conforme previsto na Súmula Vinculante 14 do STF.
Segundo o relator, o objeto do inquérito deve se limitar a manifestações que caracterizem risco efetivo à independência do Poder Judiciário e que, em razão de ameaça aos membros do STF e a seus familiares, atentem contra os Poderes instituídos, contra o Estado de Direito e contra a democracia.
De acordo com o relator, é necessário frisar a proteção da liberdade de expressão e de imprensa nos termos da Constituição, excluindo-se do escopo do inquérito matérias jornalísticas e postagens, compartilhamentos ou outras manifestações (inclusive pessoais) na internet, desde que não integrem esquemas de financiamento e divulgação em massa nas redes sociais.
Delimitação de balizas
O procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu a legalidade do inquérito, todavia pediu que o STF estabeleça as balizas necessárias para delimitar o objeto das investigações e o tempo de apuração. Aras também quer que as chamadas medidas invasivas sejam submetidas anteriormente ao Ministério Público.
O advogado-geral da União, José Levi Mello do Amaral Júnior, ao se pronunciar pela regularidade da portaria que instaurou o inquérito, disse que não é possível retirar do Supremo meios para investigar ameaças contra a instituição. Levi destacou ainda que a prerrogativa de oferecer eventual denúncia é do procurador-geral.
Terceiros interessados
O julgamento contou ainda com a manifestação de terceiros interessados (amici curiae) admitidos pelo relator. O representante da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Aristides Junqueira, considera que o inquérito foi instaurado de forma legal, porém argumenta que, a partir da vigência da Lei Anticrime (Lei 13.964/2019), em janeiro de 2020, é vedada a iniciativa do juiz na fase de investigação. Por este motivo, entende que o feito deve ser remetido ao Ministério Público.
Em nome do Colégio de Presidentes dos Institutos dos Advogados do Brasil, Felipe Martins Pinto se manifestou pela inconstitucionalidade da portaria, por considerar que não há justa causa para a instauração da investigação.
Pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Luiz Gustavo Pereira da Cunha também afirmou que o inquérito seria ilegal, pois o Regimento Interno do STF autoriza a instauração de investigação apenas sobre fatos ocorridos dentro de suas dependências.
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