Não são somente as comorbidades físicas que deixaram a população brasileira mais vulnerável durante a pandemia. Assim, os cidadãos que residem em municípios com maior número de comorbidades socioeconômicas, são mais suscetíveis aos impactos da pandemia. Nesse sentido, vê-se como tais comorbidades socioeconômicas fatores como baixo nível de saneamento básico, alta densidade de domicílios e desigualdade social.
É o que demostra um estudo da Escola Nacional de Administração (Enap). Desse modo, a pesquisa apresenta um mapeamento do comportamento e impactos causados pela pandemia em 5570 municípios do país.
Portanto, um dos principais fatos encontrados durante o estudo foi a demonstração de que municípios mais pobres, com uma menor quantidade de recursos, não necessariamente foram os mais atingidos pela pandemia. Contudo, as cidades com maiores indicadores de desigualdade social obtiveram um resultado diferente.
Pior cenários das cidades brasileiras
O pior cenário é visto em municípios que apresentam em média 27 mil habitantes. Isto é, característica presente em 459 cidades acompanhadas e que sofreram mais que a média com os efeitos da pandemia.
Entre estas cidades, então, estão os municípios de Chapadinha (MA), Nova Araçá (RS), Pimenteiras do Oeste (RO) e Vila Bela da Santíssima Trindade (MT). Como exemplo dos impactos, a taxa de óbito nestes municípios foi de 39,8, ou seja, mais que o dobro da média nacional.
Neste grupo de cidades, mais da metade dos domicílios possuem quartos que são divididos entre duas ou mais pessoas. Além disso, outra característica em comum é a questão da infraestrutura. Assim, mais de um terço da população destes municípios possuem abastecimento de água e tratamento de esgoto inadequado.
Ademais, o tamanho da população e à distância das capitais também foi outro fator observado que favoreceram o avanço do vírus nas localidades. Dessa maneira, cidades com maior número de habitantes e mais próximas de grandes centros urbanos apresentaram um maior índice em termos de óbitos e casos da doença.
Indo adiante, os melhores cenários normalmente se encontravam em cidades pequenas e distantes das capitais.
Como o estudo analisou as cidades?
Assim, o estudo dividiu os municípios em sete regiões e analisou sete indicadores socioeconômicos encontrados:
- Infraestrutura
- Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH – M)
- Auxílio Emergencial
- Densidade das casas
- Renda per capita
- Vulnerabilidade à pobreza
- Coeficiente de Gini, ou seja, que afere o grau de concentração de renda
Portanto, um fato que chamou a atenção dos pesquisadores é que de um total de 134 cidades brasileira, oito a cada dez pessoas possui renda familiar per capita inferior a R$ 255.
Porque o termo comorbidade social?
A pesquisa adotou o termo de comorbidade social, utilizando como uma referência a área da saúde. Assim, teve a intenção de demonstrar que a existência de múltiplos fatores desencadeam um processo duplo de vulnerabilização da população, instalando uma crise socioeconômica e territorial.
Dessa forma, bons exemplos são dos municípios do Rio de Janeiro e São Paulo, um dos mais populosos do país. O rendimento médio nestas regiões é o maior do Brasil, ou seja, cerca de R$ 1.504. Contudo, estes recursos não se distribuem de forma igualitária à população, o que torna o coeficiente de Gini presente nestas regiões o maior de todos.
Janaína Lopes Pereira Peres, uma das autoras do estudo, relata que a realização da pesquisa surgiu após a ideia do vírus ter se mostrado “democrático”. Isto é, o entendimento de que todos os cidadãos brasileiros seriam atingidos da mesma maneira. Logo, não demorou muito tempo para a pandemia demostrar que os impactos eram muito mais brandos em um certo grupo de pessoas.
De acordo com o coordenador-geral de pesquisa da Enap, Cláudio Shikida, os dados demostram uma realidade muito mais grave e complexa do que a visualizada. Consequentemente, isso faz com que a gestão pública tenha um desafio maior ao lidar com os impactos da pandemia.
Auditoria mostra Auxílio Emergencial como uma medida de sucesso
De acordo com os dados que o Senado Federal recebeu durante a CPI, o governo possui motivos suficientes para comemorar o sucesso do Auxílio Emergencial. Isto é, o programa que se destinou a ajudar cidadãos em situação de vulnerabilidade durante a pandemia de Covid-19.
Nesse sentido, durante o ano de 2020 foram mais de R$ 294 bilhões direcionados ao benefício. Assim, a quantia se encaminhou a cerca de 68,2 milhões de adultos com inscrição no CadÚnico do Governo Federal. Tais beneficiários são provedores de famílias que representam 118,7 milhões de brasileiros, ou seja, 55,8% da população do país.
Além disso, a agilidade da análise e da operação dos dados pela Dataprev em conjunto com a Caixa Econômica Federal, acabou surpreendendo os especialistas mais céticos. Para estes, esperava-se um caminhar mais lento dos processamentos, devido ao alto índice de burocracia característico destas instituições.
O combate às fraudes também foi um ponto positivo
Indo adiante, em 2020 foi possível identificar casos de fraudes no benefício. Dessa forma, durante o terceiro trimestre de 2020, encontraram-se cerca de R$ 40 bilhões em desvios e irregularidades. Em seguida, após o endurecimento da fiscalização, os valores caíram para R$ 10 bilhões, já em dezembro do mesmo ano. Portanto, para 2021 a Controladoria Geral da União e do Tribunal de Contas da União solicitou que ocorressem revisões frequentes dos requisitos.
Assim, o Ministério da Cidadania vem realizando, nos últimos seis meses, diversas auditorias. Então, isso levou à conclusão de que diversos critérios induziram a CGU e o TCU a possíveis erros durante a avaliação dos dados dos beneficiários.
Além disso, na última semana, o Ministério da Cidadania comunicou à CPI que vem investigando o andamento da gestão sobre a pandemia no Brasil. Desse modo, o órgão indica que, até o momento, não foram encontrados indícios de possíveis fraudes.
Contudo, o comunicado contava com informações sobre o pagamento indevido de R$ 249 milhões a cidadãos que não cumpriam todos critérios para a participação no programa. Este número representa cerca de 0,08% do valor total que o programa concedeu. Ademais, o órgão também comunicou que vem exigindo a devolução integral da quantia recebida de maneira irregular e que já houve a devolução de R$ 15 milhões aos cofres públicos.
Auxílio Emergencial é considerado um sucesso
O benefício foi considerado um sucesso pela base do governo em 2020. Por esse motivo, então, até hoje diversos congressistas não compreendem porque o presidente não deu continuidade ao pagamento do benefício no início de 2021. Isto é, quando retomou o benefício após forte pressão da população e do Congresso somente no mês de abril.
Atualmente, contudo, o presidente Jair Bolsonaro encara o programa como um trunfo que possui a capacidade de fortalecer sua popularidade nas próximas eleições de 2022.