Alcoolismo no trabalho: como lidar?
Esta doenca causa prejuízos graves em todas as esferas da vida
Alcoolismo é o hábito de consumir bebidas de teor alcoólico com frequência, sem que o indivíduo consiga dominar o impulso do consumo. A doença é considerada crônica quando há alta tolerância à bebida, isto é, o dependente precisa de doses muito elevadas para saciar o grau alcoólico.
O Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais indica o uso do álcool e outros distúrbios induzidos pela substância como transtornos psíquicos de ordem mental. Na década de 60, o conceito de doença do alcoolismo foi incorporado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) à Classificação Internacional das Doenças (CID-8).
Há uma série de consequências negativas no organismo causadas pelo abuso do álcool, como transtornos psicóticos, de humor e delírios, além de demência, disfunções comportamentais e comprometimento da memória.
A doença, a dependendo do estágio em que se encontra, pode envolver áreas trabalhistas e previdenciários específicas. Veja a seguir alguns pontos fundamentais para entender o assunto.
Fases do alcoolismo
A dependência química afeta a vida do alcoólatra em todos os aspectos, e isso causa graves reflexos socioeconômicos.
Segundo o médico Dráuzio Varella, há três fases para a manifestação da dependência alcoólica:
- Adaptação: encontra-se satisfação pessoal a partir do álcool (maior sociabilidade, menor inibição, alívio de ansiedade, euforia, etc.);
- Tolerância: o sistema nervoso central precisa de quantidades cada vez maiores para reproduzir os níveis de satisfação pessoal da fase de adaptação;
- Síndrome da Abstinência: efeitos físicos ocorrem com a interrupção da bebida, como tremores, delírios e várias complicações de saúde.
O que o álcool causa no trabalhador
Segundo a Cisa (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), mesmo em pequenas quantidades, o álcool pode causar prejuízos à performance, qualidade e segurança no trabalho, pois é uma substância depressora do Sistema Nervoso Central. Os principais efeitos a curto prazo envolvem:
- Prejuízo do julgamento e da crítica;
- Prejuízo da percepção, memória e compreensão;
- Diminuição da resposta sensitiva e retardo da resposta reativa;
- Diminuição da acuidade visual e visão periférica;
- Falta de coordenação sensitivo-motora, prejuízo do equilíbrio;
- Sonolência.
Efeitos trabalhistas do alcoolismo crônico
Segundo o artigo 482 da CLT, o empregador pode demitir seu funcionário com justa causa (sem direito à indenização), em casos de “embriaguez habitual ou em serviço”.
Porém, juridicamente e para fins trabalhistas, o alcoolismo crônico não deve ser confundido com a embriaguez habitual ou em serviço. A embriaguez ocasional acontece em episódios esporádicos, e estão associados a insubordinação intencional. Já o alcoolismo em fase avançado deve ser encarado como um estado crônico compulsivo.
De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), o alcoolismo é doença catalogada com CID específico, por isso, o alcoólatra deve ser tratado durante a vigência do contrato de trabalho, e não punido pela rescisão do contrato.
Não significa que o funcionário não possa ser demitido. No caso julgado, em questão, o Tribunal não encontrou base para dispensa por justa causa. Caso a vontade do empregador seja pela demissão, ele deverá cumprir com todos os trâmites da rescisão sem justa causa, como regido pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).
Segundo o mentor de pequenas empresas Marcus Marques, a atitude correta a ser tomada pelo empregador é encaminhar o funcionário ao INSS, para que entre de licença e possa se tratar da dependência. Então, o órgão irá verificar o caso e, se constatar que se trata de um quadro irreversível, procederá com os trâmites para a aposentadoria. A demissão por justa causa apenas é permitida nos casos em que o trabalhador volta a ter comportamentos inadequados na empresa mesmo após ter passado pelo tratamento.
Benefício BPC (Benefício de Prestação Continuada) para alcoólatras
Se o alcoólatra não contribui para o INSS, ele pode se beneficiar com o BPC/LOAS para deficientes? A resposta é sim, pois o álcool pode induzir a vários transtornos mentais como a psicose, alucinações e delírios, com comprometimento cognitivo-perceptivo em longo prazo.
O BPC é um auxílio financeiro assistencialista previsto na lei orgânica de assistência social, que assegura um salário mínimo para pessoas com deficiência, que não consigam prover o próprio sustento.
Para tanto, é indispensável:
- Avaliação pericial para se constatar a deficiência;
- Comprovação de que a renda individual do núcleo familiar seja menor do que ¼ do salário mínimo;
- Se cadastrar no programa Cadúnico, no CRAS do município em que reside.
Se o alcoólatra não consegue cumprir os requisitos, fique atento: a partir de Janeiro de 2022, o Governo Federal vai implantar mudanças nos requisitos para o BPC, visando alcançar mais cidadãos vulneráveis.
Aposentadoria por invalidez do portador de alcoolismo
Se o alcoólatra for um segurado inscrito no INSS, e tiver suas relações de trabalho gravemente comprometidas em decorrência da doença, poderá ser aposentado por invalidez, ou aposentadoria por incapacidade permanente. Os fatores determinantes para este beneficio são:
- Duração prolongada da doença com prejuízo total e permanente da competência para o trabalho, constatada por pericia medica e laudos;
- Cumprimento do prazo mínimo de carência de 12 meses;
- Ter qualidade de segurado, sendo do regime CLT ou através de contribuição como autônomo ao INSS.
Como requerer a aposentadoria por invalidez no INSS?
Os benefícios por incapacidade do INSS, como a aposentadoria por incapacidade ou o auxílio-doença demandam perícia médica obrigatória.
A aposentadoria pode ser solicitada através do portal Meu INSS ou o aplicativo do mesmo. Também pode ser solicitado pelo telefone 135. Pelo aplicativo, é só seguir os seguintes passos:
- Entre no aplicativo MEU INSS com seu CPF;
- Clique em “agendar perícia”;
- Você verá alternativas para remarcar perícia ou solicitar perícia de prorrogação (para quem já está em gozo de auxílio-doença);
- Escolha “perícia inicial” se deseja aposentar-se por incapacidade;
- Dê seguimento aos campos de informação solicitados;
- Compareça na data agendada para a perícia, junto de toda a documentação de atestados médicos, laudos, diagnósticos e exames, além de documentação pessoal completa (RG, CPF, CLT, guias de pagamento GPS, etc.).
Parece simples, mas em alguns casos, o caminho até a aposentadoria por incapacidade permanente pode ser longo, caso o INSS indefira o pedido e não acatar os recursos administrativos.
Neste caso, talvez seja melhor entrar com recurso judicial, aonde o juiz analisará a perícia e as circunstâncias pessoais do segurado.