O Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá se tribunal de segunda instância pode determinar novo júri, caso a absolvição do réu tenha ocorrido em suposta contrariedade à prova dos autos.
A matéria é objeto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.225.185, que, por unanimidade, teve repercussão geral reconhecida em sessão virtual (Tema 1.087).
O júri, mesmo reconhecendo a materialidade e a autoria do delito, absolveu um homem do crime de tentativa de homicídio.
A decisão do conselho de sentença se deu pelo fato de que a vítima teria sido responsável pelo homicídio de seu enteado.
O recurso de apelação interposto pelo Ministério Público estadual (MP-MG) foi negado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Segundo o TJ-MG, em razão do princípio da soberania do júri popular, a cassação da decisão só é possível quando houver erro escandaloso e total discrepância.
De acordo com o tribunal estadual, a possibilidade de absolvição, em quesito genérico, por motivos como clemência, piedade ou compaixão, é admitida pelo sistema de íntima convicção, adotado nos julgamentos feitos pelo Júri Popular.
No recurso ao STF, o MP-MG sustenta que a absolvição por clemência não é permitida no ordenamento jurídico e que ela significa a autorização para o restabelecimento da vingança e da justiça com as próprias mãos.
Em sua manifestação no Plenário Virtual, o ministro Gilmar Mendes, relator do recurso, observou que a questão a ser respondida é se o júri, soberano em suas decisões, nos termos determinados pela Constituição Federal, pode absolver o réu ao responder positivamente ao quesito genérico sem necessidade de apresentar motivação, o que autorizaria a absolvição até por clemência e, assim, contrária à prova dos autos.
Ele lembrou que a reforma do Código de Processo Penal (CPP), ocorrida em 2008 (Lei 11.689/2008), alterou de modo substancial o procedimento do Júri brasileiro, ao introduzir uma importante modificação nos quesitos apresentados aos jurados.
Os jurados passaram, inicialmente, a ser questionados sobre a materialidade (se o fato ocorreu ou não) e sobre a autoria ou a participação do réu.
Caso mais de três jurados respondam afirmativamente a essas questões, o Júri deve responder ao chamado “quesito genérico”, ou seja, se absolve ou não o acusado.
Ao reconhecer a repercussão geral da questão constitucional, o relator destacou que o conflito não se limita a interesses jurídicos das partes recorrentes, pois o tema é reiteradamente abordado em recursos extraordinários e em habeas corpus, o que torna pertinente assentar uma tese para pacificação.
Segundo o ministro, há relevância política e social, pois estão em discussão também temas de política criminal e segurança pública, amplamente valorados pela sociedade em geral.
O ministro destacou que a questão ser analisada não demanda reexame de fatos e provas, o que é vedado em recurso extraordinário pela Súmula 279 do STF.
“Discute-se exclusivamente se a soberania dos veredictos é violada ao se modificar uma absolvição assentada em resposta ao quesito genérico obrigatório”, assinalou.
“Vê-se, assim, que o pronunciamento do STF é relevante para balizar demandas futuras”.