A Justiça do Trabalho mineira reconheceu o vínculo de emprego entre um trabalhador contratado por meio de um intermediador de mão de obra, popularmente conhecido como “turmeiro” ou “gato”, e uma empresa agrícola que produz feijão em Buritizeiro, no Norte de Minas Gerais.
A decisão é dos julgadores da Décima Turma do TRT-MG, que, sem divergência, confirmaram a sentença proferida pelo juízo da Vara do Trabalho de Paracatu.
Prestação de serviços
Em 1º grau, a empresa admitiu a prestação de serviços do trabalhador por alguns dias, entre outubro e setembro de 2019.
Ao recorrer da decisão que reconheceu a relação de emprego, sustentou que não havia prova da prestação de serviços, incorrendo em contradição.
Segundo a empresa, os serviços de arrancar feijão da propriedade teriam sido contratados de terceira pessoa, ficando a cargo do contratado a responsabilidade por todas as obrigações relativas aos seus empregados.
Mas, ao examinar o recurso, o juiz convocado Márcio José Zebende, relator do processo, não acatou os argumentos e negou-lhe provimento, sendo seguido pelos demais membros do colegiado de segundo grau.
Para ele, ficou claro que a empresa se beneficiou da força de trabalho do autor, devendo o vínculo de emprego ser reconhecido com ela.
Testemunha relatou que o autor trabalhou na lavoura e que todos os nomes, datas de prestação de serviço e valores pagos aos trabalhadores que prestaram serviços na lavoura de feijão eram anotados em um caderno.
Alguns apontamentos de produção do autor, segundo ela, foram lançados em caderno com o seu apelido/alcunha.
Já os recibos de pagamento foram feitos no nome próprio autor.
O magistrado constatou que a defesa apresentou recibo de pagamento datado de 14/9/2019, devidamente assinado pelo reclamante.
Vínculo de emprego
De acordo com o relator, o “turmeiro” ou “gato”, que agencia o trabalho dos empregados rurais, como simples intermediário e mero preposto do proprietário rural, não pode assumir, até mesmo pela incapacidade econômica, os riscos do empreendimento.
Ele explicou que o artigo 3º da Lei 5.889/1973 considera empregador rural a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividade agroeconômica em caráter permanente ou temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregados.
Regra geral, em casos como o dos autos, a relação de emprego deve ser formada com o beneficiário dos serviços, o proprietário.
Diante do apurado, o julgador considerou correta a declaração do vínculo de emprego entre as partes, no período de 30/8/2019 a 14/9/2019, com o salário de R$ 1.650,00, confirmando a condenação ao pagamento de 1/12 de férias, FGTS do período e, ainda, multa prevista no artigo 479 da CLT.
Quanto ao desligamento, considerou a dispensa de forma imotivada, por falta de prova em sentido contrário nos autos.
Danos morais e submissão a condições análogas às de escravo
A empresa foi condenada, ainda, a pagar R$ 3 mil, a título de danos morais, ao trabalhador.
É que, segundo fundamentou o relator, a fiscalização realizada pela Superintendência Regional do Trabalho nas dependências da fazenda apurou diversas irregularidades, tais como ausência de registro dos trabalhadores, condições precárias dos alojamentos, falta de fornecimento de EPIs e ausência de fornecimento de água potável, local adequado para alimentação e banheiros nas frentes de trabalho.
Testemunha deixou evidente que não havia local adequado para os trabalhadores realizarem suas necessidades fisiológicas, tampouco local adequado para realizarem suas refeições. Inicialmente, não havia cama e colchões suficientes para todos os trabalhadores, sendo que alguns dormiam no chão em cobertas.
Após determinado tempo, a empresa levou algumas camas, mas não havia espaço físico no alojamento para a montagem delas.
A água consumida pelos trabalhadores era da represa, sem filtragem e tinha gosto de óleo diesel decorrente da bomba d’água.
Outrossim, a água era utilizada para produção de alimentos.
Conforme apontado, alguns trabalhadores passaram mal com a ingestão dessa água. Outra testemunha declarou que na frente de serviço não havia banheiro, refeitório ou local adequado para os trabalhadores realizarem suas refeições.
“Não há falar em prova cabal do dano moral, bastando que a vítima comprove em juízo o fato causador do dano moral, sendo que, no caso em exame, houve prova das péssimas condições de trabalho a que era submetido”, registrou o relator no voto, considerando razoável o valor da indenização fixada em primeiro grau, levando em conta a extensão do dano provocado e a duração do contrato, em conformidade com o artigo 223-G da CLT.
Processo: PJe: 0010032-02.2020.5.03.0084 (ROPS)
Fonte: TRT-3