A proposta de Reforma Administrativa do governo de Jair Bolsonaro foi encaminhada ao Congresso Nacional na última quinta-feira (03/09) e apresenta mudanças significativas nas regras voltadas para os futuros servidores que ingressarem no setor público após a promulgação do texto. Segundo o Poder Executivo, essa é a primeira fase de um processo que contará também com a apresentação de projetos de leis relacionados à consolidação de cargos, novas diretrizes de carreira e questões remuneratórias.
Fim do Regime Jurídico Único
Com a justificativa de crise fiscal e busca por maior eficiência, a Proposta de Emenda à Constituição 32/20 prevê o fim do Regime Jurídico Único e a criação de cinco novos tipos de vínculos, sendo que, fora as carreiras que são consideradas típicas de Estado, todas as outras perderão o direito à estabilidade. A proposta em si ainda não determina quais serão as carreiras que continuarão estáveis, uma lei complementar futura irá definir isso, mas já se discute que cargos de suporte de atividades-fim e os relacionados com as áreas de saúde e educação podem perder esse direito ao migrarem para a contratação por tempo indeterminado ou determinado.
Problema Graves no Funcionalismo Público
Apesar da argumentação em defesa do fim da estabilidade partir de uma suposta busca por melhores resultados, essa mudança pode acarretar problemas graves no funcionalismo público. A estabilidade, mais que um direito dos servidores, é também um meio de garantir que os serviços públicos continuem funcionando com qualidade mesmo com a troca de governantes e que eles sejam prestados visando o seguimento da lei e do direito, mesmo se os chefes diretos e indiretos queiram diferente. Ainda que o governo destaque no texto da proposta de emenda que as pessoas não poderão ser desligadas por motivos político-partidários ou arbitrários, na prática o fim da estabilidade por si só abrirá brechas para perseguições nesses vieses, colocando em risco não só a prestação legal e eficiente do serviço público, como também o pluralismo político e todos valores democráticos relacionados. Pode-se dizer até que o fim da estabilidade pode trazer ao funcionalismo público uma regressão ao patrimonialismo, já que os vínculos mais frágeis entre servidores e Estado favorecem o aparelhamento das instituições conforme os interesses dos governantes.
Como fica a Estabilidade?
A Reforma também prevê mudanças para a aquisição da estabilidade. Em alternativa ao estágio probatório, ela defende um período de experiência obrigatório que será uma etapa do próprio concurso público e um dos novos vínculos possíveis com a Administração. Somente os melhores avaliados serão investidos no cargo no fim desse prazo. Se houver a predominância da subjetividade nesse processo, a precariedade desse vínculo pode facilitar perseguições e incentivar comportamentos “pessoalistas”. Fora que a regra, como foi escrita, pode não ser muito prática, já que afetará a interpretação da validade do concurso público.
Reforma com Indefinição
Além disso, vale lembrar que segundo a PEC, o funcionário público por tempo indeterminado poderá ser desligado a partir de hipóteses previstas em lei futura ainda não apresentada. Hipóteses, no caso, além das já conhecidas na Constituição hoje.
Concursos serão cada vez mais desinteressantes?
Fora isso, destaca-se que a atratividade dos cargos públicos é relacionada ao instituto da estabilidade. Destruí-lo ou mesmo relativizá-lo pode fazer com que possíveis bons servidores deixem de buscar carreiras na administração pública. Se o objetivo é melhorar a prestação de serviços públicos é importante manter as carreiras interessantes para atrair os melhores profissionais. Reconhecer isso não significa ir contra um dos pontos altos da proposta, que é o corte de certos benefícios totalmente deslocados da realidade, como a possibilidade de aposentadoria compulsória como punição e outros que já foram até extirpados da esfera federal. O fim desses benefícios distorcidos junto com a criação de planos de carreira mais motivadores, que teoricamente vão surgir nas outras fases da reforma, pode realmente ocasionar melhores resultados fiscais e mais qualidade no serviço prestado.
Alguns Pontos Positivos…
Outro tópico que pode ser positivo é a previsão de um processo de seleção simplificada para cargos de liderança e assessoramento, o que transformaria os cargos comissionados, tornando-os parte de um processo mais objetivo, logo possivelmente mais eficiente e de acordo com o interesse público.
Reforma precisa ser mais debatida
A Reforma Administrativa apresenta riscos para quem deseja se tornar um concursado e para os demais cidadãos que querem ver um Estado eficiente, impessoal e correto, mas está longe de ser definitiva. A apresentação do Projeto de Emenda à Constituição é o início de um processo que pode ser bem longo e repleto de modificações de texto e por isso a participação da sociedade civil nesse debate é essencial, assim como a cobrança para que os pontos negativos aqui apontados não avancem.
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