Mulheres são as mais prejudicadas pela pandemia

A medida que a pandemia da Covid-19 avança, muitas empresas viram seu faturamento cair, ou tiveram que fechar as portas. Neste cenário, os negócios administrados por mulheres foram os mais prejudicados. Segundo um estudo do Sebrae, o primeiro trimestre do ano de 2020 teve 1 milhão e 300 mil negócios femininos à menos que no mesmo período em 2019.  Isso representou uma queda de 14% em relação a 2019 no segundo semestre.

Segundo dados disponibilizados pela Pesquisa Nacional por Domicílios (Pnad Contínua) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 8,5 milhões de mulheres deixaram a força de trabalho no terceiro trimestre de 2020.

O setor de serviços, grandemente afetado, tem a maior parte de sua força de trabalho composta por mulheres. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) , as demissões que ocorreram entre Março e Setembro de 2020, representam 65,6% de mulheres. Mesmo pesquisas mostrando que estudam mais que os homens, as mulheres são as primeiras dispensadas em um momento de crise, como a que ocorre atualmente.

Ao passo que o otimismo cresce junto com a perspectiva da vacinação, precisamos entender o que causou esse retrocesso em um campo tão importante de avanço feminino, que é o trabalho.

Por que as mulheres são as mais afetadas?

Marcos Bedê, analista de gestão estratégica do Sebrae, comentou: “A pandemia exige isolamento social, e a maior parte do cuidado com as crianças e idosos ficou a cargo das mulheres.”

A questão estrutural de que o trabalho doméstico fica com as mulheres já existia antes da pandemia, e agora se tornou muito mais evidente. Acumuladas de responsabilidades, as mulheres cuidam da casa e supervisionam o ensino remoto dos filhos. Algumas veem o marido perder o emprego, ou vivem com esse constante risco. Outras, que são mães-solo, precisam se reinventar e criar uma maneira de colocar comida na mesa de suas casas. Por pressão das classes apoiadoras, o Auxilio Emergencial no ano de 2020 passou de R$ 600,00 para R$ 1.200,00. Neste ano, o valor será de R$ 375,00.

Tudo isso cobra um preço na saúde dessas mulheres. Segundo uma pesquisa do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), feito com 3 mil voluntárias, entre elas, 40,5% apresentaram sintomas de depressão, 34,9%, de ansiedade e 37,3% de estresse.

Muitas trabalhadoras em regime CLT foram gravemente afetadas. Por serem a maioria em setores muito golpeados pela crise,  como o comércio, a hotelaria, a indústria e o serviço doméstico, muitas mulheres tiveram a perda de sua autonomia econômica. Um casal com filhos menores de 4 anos que frequenta escolinha em turno integral, na hora que precisa decidir quem vai ficar em casa cuidando deles, quase sempre optam pela mulher, por ter o salario menor e assim impactar menos na renda familiar.

Além disso, é constatado que as mulheres tem mais dificuldade para retornar ao mercado de trabalho do que os homes. O economista José Pio Martins, reitor da Universidade Positivo, observou: “As mulheres têm mais dificuldade de reorganizar o esquema doméstico para voltarem ao trabalho, sobretudo as que têm filhos e estão sem a opção de deixá-los na escola, ainda fechada”.

Ele relata também uma preocupação à longo prazo: “O problema torna-se especialmente importante ao se analisar a expectativa média de vida no Brasil que, pela última prévia IBGE com data-base de 2019, atingiu 76,6 anos, sendo 80,1 anos para as mulheres e 73,1 anos para os homens. Portanto, as mulheres vivem sete anos mais que os homens e elas serão maioria entre os idosos, logo, a segurança financeira na velhice se torna essencial.”

Empreender é a saída?

As mulheres atingidas financeiramente buscam meios de garantir o sustento e manter a sua produtividade. Essa busca pela sobrevivência fez aumentar o número de mulheres em trabalhos informais, precários e mal remunerados.

“Muitas mulheres foram dispensadas do trabalho, e, sem como manter o sustento da família, passaram a se virar na informalidade,” destaca Anatiana Alves, dirigente do Sindicato dos Bancários e Financiários de SP. Ela acrescenta: “Como saída para enfrentar essa situação, elas saem para vender doces, salgados, artesanato e se sujeitam a trabalhos precários, informais e sem nenhum direito para garantir o sustento da família. Situações como estas deixam claro que a luta das mulheres por igualdade na vida e no trabalho e por relações compartilhadas deve ser de toda a sociedade, e não só das mulheres.”

A romanização do empreendedorismo, disseminada na Internet por pessoas “bem sucedidas”, e geralmente vendendo um curso para ser tão bem sucedidas como elas, não é de ajuda em um momento como esse. Soluções milagrosas não existem, e em cada historia de sucesso é preciso analisar o contexto. Nem sempre empreender é a saída para todas as mulheres. “A questão é que existe uma diferença entre empreender para poder ter uma melhor atuação no mercado ou para se posicionar de uma forma diferente das grandes empresas e empreender porque os salários oferecidos não são o suficiente para pagar as contas, ou porque o mercado não está preparado para ter mães de crianças pequenas como funcionárias.”- destaca Mariana Klein, professora universitária e consultora de marketing digital.

Então, antes de mergulhar de cabeça em um negócio próprio, aprenda bastante sobre ele. O Sebrae (Serviço de Apoio as micro e Pequenas Empresas) é somente um dos muitos canais sérios de auxilio ao pequeno empreendedor, com muito material gratuito, online e de qualidade.

Comissão faz apelo à ONU

A CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe) é uma comissão regional da ONU (Organização das Nações Unidas) cujo objetivo é contribuir com o desenvolvimento econômico dos países da América Latina. Conforme noticiado pelo jornal El País, ela divulgou um relatório intitulado “A autonomia econômica das mulheres na recuperação sustentável e com igualdade.” Nele, a comissão pede que pede aos Governos que adotem políticas de recuperação econômica com perspectiva de gênero para reduzir a desigualdade e não deixar ninguém para trás.

A CEPAL propõe reativar setores gravemente afetados, como o comércio, o turismo e os serviços, por considerar que “além de redinamizar as economias eles têm um potente efeito na recuperação do emprego das mulheres”. Pede também investir em infraestruturas de cuidado para fomentar o crescimento econômico.

O relatório destaca outro ponto muito importante para a retomada feminina à economia: a reativação e ampliação de acesso às de escolas e creches. Afirma que a perda de autonomia econômica se soma uma sobrecarga de trabalho não remunerado, em especial o vinculado ao cuidado e apoio nas tarefas escolares dos filhos depois da suspensão das aulas presenciais.

O apelo principal da CEPAL é de que os cuidados não sejam vistos pelos Governos como um gasto social, e sim como um investimento para gerar emprego, e que também se leve em conta a necessidade de reverter as discriminações no mercado de trabalho.

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