Manifesto critica adoção de ensino remoto sem discussão com comunidade acadêmica
Docentes receberam das universidades um convite para a apresentação de um curso on-line destinado à colocação em prática das aulas remotas
Professores de universidades públicas do Rio de Janeiro divulgaram um manifesto contra o ensino remoto, implementado sem discussão com a comunidade acadêmica. Na semana passada, os docentes receberam das universidades um convite para a apresentação de um curso on-line destinado à colocação em prática das aulas remotas. A apresentação, feita no formato de uma videoaula, foi oferecida pela Multirio (Empresa Municipal de Multimeios da Prefeitura do Rio). Porém, acabou sendo interpretada como um atropelo.
Apesar de o tema não ter sido colocado em pauta nas instâncias deliberativas das universidades, o convite trazia as logos das instituições que foram identificadas como parceiras do curso.
O manifesto é assinado por sessões sindicais do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) e as representações de docentes das universidades públicas UENF, UFF, Unirio, UERJ, além da Rede Faetec e Cefet. No texto, os professores apontam que as próprias instituições têm quadros qualificados para propor e construir soluções de educação nesse momento de crise sanitária.
A professora Marina Tedesco, presidente da Associação dos Docentes da UFF, destaca que a comunidade universitária tem discutido há muitos anos o risco de propostas de educação à distância e o tema, mesmo trazido agora pela pandemia, com a discussão do ensino remoto, não é novidade. Ela cobra responsabilidade neste momento.
“Sabemos que a pandemia exige soluções. Tudo isso tem que ser decidido com calma, com democracia, com tempo, baseado em estudos. Então, como é que instituições, onde as instâncias colegiadas não aprovaram ainda – se é que vão aprovar – o ensino remoto emergencial está assinando convocação para um curso que diz que o ensino remoto vai ser implementado? Isso tem que ser discutido nos conselhos universitários, nos conselhos de pesquisa e extensão e não informado para a comunidade acadêmica via carta”, opina.
No manifesto, os professores lembram que existe uma visão equivocada de que a universidade está parada durante a pandemia do novo coronavírus. O professor da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense, Frederico Irias, diretor da Associação dos Docentes da UERJ, reforça o papel das instituições inclusive para ajudar a sociedade a pensar no tema do acesso à educação.
“A universidade pública trabalha com o tripé ensino, pesquisa e extensão e o que parou no momento foi ensino. Então, queria realçar que a gente atua também com pesquisa e extensão e a gente está orientando, produzindo relatórios, estudando em casa, publicando artigos. A gente está numa fase ainda de realização de mapeamento e entendimento dos perfis das comunidades acadêmicas. Neste sentido, a gente precisa se debruçar mais sobre o estrago que vai ser a questão da exclusão digital para docentes e discentes. Que ninguém fique para trás nesse processo”, pondera.
As universidades públicas do estado, que aparecem como parceiras na divulgação da videoaula, foram procuradas pela reportagem para se posicionarem sobre a discussão em relação as aulas remotas e se houve algum tipo de parceira firmada com a Multirio. A maioria das instituições respondeu que o tema ainda está sendo debatido e só duas se posicionaram claramente sobre a existência da parceria com a empresa de comunicação para a formação dos docentes.
A Universidade Federal do Norte Fluminense (UENF) respondeu que todas as ações envolvendo atividades complementares estão sendo discutidas nos seus colegiados e que não firmou contrato com a Multirio. A Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) se manifestou no mesmo sentido, ressaltando que ainda está realizando discussões para a implantação do que chamou de Ensino Continuado Emergencial. A proposta final deve ser avaliada nos conselhos superiores na segunda quinzena de julho.
A Unirio respondeu que a universidade mantém três grupos de trabalho discutindo a continuidade das atividades acadêmicas e administrativas e que esses grupos têm até o dia 2 de julho para a elaboração de um plano de continuidade, que será submetido ao Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão. Já a UFF disse que desde o início da pandemia criou um Grupo de Trabalho para analisar a situação geral de emergência sanitária e estão sendo discutidos planos de contingência no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da universidade.
A UERJ reforçou que não haverá flexibilização da suspensão das atividades presenciais enquanto permanecer a necessidade de isolamento social e que está realizando um levantamento sobre as condições de acesso às tecnologias digitais de informação entre seus alunos. A UFRJ, a Rede Faetec e o Cefet não responderam até o fechamento desta reportagem.
A Empresa Multirio disse, por meio da assessoria de imprensa, que vem atuando em caráter de cooperação com instituições públicas de ensino superior a fim de colaborar com os professores no aprimoramento técnico para a preparação de aulas remotas. Segundo a Multirio, a adesão a esse aperfeiçoamento se dará de forma espontânea e o corpo docente das instituições está sendo ouvido quanto às suas propostas para o projeto. Fonte: Rádio Agência Nacional.