Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) quis um ‘tratamento político genocida’ para a pandemia de Covid-19. “Custou 300 mil mortos”, disse o médico que serviu o governo federal de janeiro de 2019 a abril de 2020.
Durante a entrevista, Mandetta comentou com ironia o fato de Bolsonaro ter passado a usar máscara de proteção contra Covid-19 em eventos oficiais, postura que difere daquela adotada pelo presidente durante quase toda a pandemia.
“Pois é, custou 300 mil mortos. Ninguém acredita! Ele só está revendo a estratégia porque nem os robôs que eles têm lá têm coragem de defendê-lo. Tem robô se revoltando! Quando chegou nesse ponto, do robô dizer: ‘Olha, estou com vergonha de defender isso’, ele começou a rever sua posição. Mas temos um Congresso que é cúmplice, que ficou esse tempo todo assistindo e que tinha as ferramentas na mão. Temos uma Procuradoria-Geral da República que é cúmplice, que poderia ter freado e que ficou assistindo.”, afirmou Mandetta.
Aliados de Bolsonaro mudaram de postura sobre Covid-19
Segundo o médico e político do partido Democratas, a situação da Covid-19 chegou a um ponto tão crítico no Brasil que antigos aliados de Bolsonaro agora tentam se diferenciar do presidente para não serem responsabilizados pela má gestão da pandemia.
“Agora estão vendo que o cheiro do cadáver está contaminando todo o mundo. Esse Centrão olha e fala: ‘Não vou ficar com essa catinga’. Então, faz pressão e dá um recado: ‘Ou você muda…’.”, disse.
“Quem está do lado dele, agora, está dizendo: olha, não quero ficar nesse clube de insanos.”, completou o ex-ministro da Saúde do governo Bolsonaro.
Bolsonaro adotou ‘política genocida’
De acordo com Mandetta, o desgaste com o governo Bolsonaro começou quando presidente, em janeiro de 2020, disse ao então ministro que queria trocar quatro integrantes da equipe técnica montada por Mandetta.
Os nomes indicados por Bolsonaro não tinham experiência no SUS (Sistema Único de Saúde), eram todos do Rio de Janeiro e teriam sido indicados por Flávio Bolsonaro.
“Nunca fui ministro palaciano, de ficar em torno daquelas conspirações. Mas quando veio esse pedido… Ah, essa equipe é técnica, mas eu quero pôr outros técnicos… Assim, sem qualquer motivo? Na minha cabeça era muito claro. Se não fosse para fazer um trabalho técnico, não me prestava para aquilo. Não tinha nenhum mandato. Estava lá em nome de outra coisa.”
Com a chegada da pandemia de Covid-19, Bolsonaro quis fazer mais interferências no Ministério da Saúde, desagradando o então ministro.
“Aí queriam um tratamento político genocida, terrível. Naquele momento, olhei e pensei: não é possível, esse cara não está entendendo… Se na primeira agressão dele eu falasse: olha, estou indo embora, bota outro aí, não ia dormir em paz com minha consciência sabendo da gravidade do que vinha pela frente.”
Bolsonaro troca Mandetta durante pandemia
Ao perceber que Mandetta não adotaria as mudanças solicitadas, Bolsonaro teria dito “Vou te substituir!”, segundo o médico.
“Quando saí, tudo estava encaixado: os planos de contingência estaduais, municipais, o SUS íntegro. E ele fazendo as ‘loucuradas’ dele… Eles entraram lá, trocaram todo mundo, passaram aquela primeira onda fruto do trabalho que a gente tinha feito, acharam que era fácil, que aquilo caía do céu, e foram fazendo aquelas bobajadas todas de cloroquina, de ‘e daí?’, de coveiro, enfim, foram se divertindo, botaram um ministro militar [Eduardo Pazuello] que entrou e saiu e não sabe até hoje o que estava fazendo lá. Deu no que deu.”