Na última quarta-feira, 27 de outubro, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou o projeto de lei de número 300/2020. O autor da medida é o deputado estadual Arthur do Val (Partido Patriotas) e, de acordo com ele, trará benefícios para o setor econômico.
A proposta possui o objetivo de retirar a exclusividade da meia entrada de estudantes, idosos e outros grupos específicos. Desse modo, segundo o texto aprovado, todas as pessoas entre 0 e 99 anos teriam direito à meia entrada para estabelecimentos como o cinema e teatro, por exemplo.
Contudo, na prática, o projeto de lei acaba extinguindo a meia entrada. Isso acontece porque o público entre 0 e 99 anos é amplo o suficiente para ser considerado toda a população de São Paulo, com poucas exceções. Assim, se a meia entrada chegará a todas as pessoas, os estabelecimentos simplesmente irão dobrar o valor das entradas. Portanto, na realidade, nada irá mudar para o público geral e os grupos que tinham a meia entrada não mais terão.
O que defendem os parlamentares do estado?
De acordo com o deputado Arthur do Val, autor da proposta, esta se iniciou a partir de um pedido do setor artístico. Sobre o assunto, ele comenta que “Foi o setor de eventos que me pediu, inclusive, me fez cartas de apoio de que queria a aprovação desse PL porque, basicamente, quando você tem uma casa de show ou é produtor de eventos, você precisa ter previsibilidade de quanto vai arrecadar, e você só fica sabendo disso sabendo quanto pode cobrar de ingresso”.
Contudo, o deputado Carlos Giannazi (PSOL) entende que a aprovação do texto não deveria ter acontecido. Para ele, então, o projeto “é inconstitucional, bizarro e patético”.
Além disso, outros deputados do PT alegam que a proposta é contrária ao que estabelece o Estatuto do Idoso. Assim, levando em consideração que o Estatuto do Idoso é uma lei federal, ela deve prevalecer em relação a uma lei estadual.
Indo adiante, os deputados contrários à medida também indicam que esta somente teve a aprovação da Comissão de Constituição e Justiça em razão de acordos por votos favoráveis.
Presidente da Alesp é contra a medida
Ainda hoje, 28 de outubro, o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, Carlão Pignatari (PSDB), se manifestou sobre o projeto de lei. De acordo com ele, portanto, o governo de São Paulo não deve sancionar a medida.
Atualmente, o deputado atua como governador em exercício. Isto é, enquanto o governador João Dória (PSDB) e seu vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB) estão em viagem no exterior, o presidente da Alesp assume a gestão do estado temporariamente.
Dessa forma, Carlão Pignatari já declara que irá vetar a extensão da meia-entrada para idades entre 0 e 99 anos. Nesse sentido, ele explica que “foi um equívoco aprovar um projeto desse, porque existe uma lei federal que regulamenta, o estado não pode regulamentar esse tipo de benefício ou não. Então, eu vejo que foi um equívoco e eu tenho certeza que a procuradoria jurídica do Palácio vai determinar o veto desse projeto de lei”.
Além disso, ele continuou, afirmando: “Se mandar para mim, eu já faço o veto imediatamente, se for essa a determinação, mas eu creio que só chega semana que vem no Palácio”.
O que diz o projeto de lei?
A proposta possui poucas determinações, quais sejam:
- As pessoas com idade entre 0 e 99 anos terão o acesso ao pagamento de metade do preço do ingresso do público em geral, a salas de cinema, cineclubes, teatros, espetáculos musicais e circenses, eventos educativos, esportivos, de lazer e de entretenimento ou similares, promovidos por quaisquer entidades, públicas ou privadas, realizados em estabelecimentos públicos ou particulares.
- O benefício do projeto não se acumula com outros que garantam desconto ou gratuidade.
- Os estabelecimentos comerciais não poderão instituir cotas máximas de ingressos para meia-entrada, bem como vedar a concessão de meia-entrada para categorias específicas de ingressos.
- Os estabelecimentos poderão exigir, para aferição de idade, documento de identidade no momento da compra ou da entrada.
Dessa forma, todas as pessoas de São Paulo teriam acesso à meia-entrada.
Como a proposta é contrária ao Estatuto do Idoso?
Ao dar a meia-entrada para toda a população, os grupos específicos deixarão de contar com este auxílio do governo. Inclusive, é importante lembrar que existem pessoas que recebem esse desconto, exatamente pela categoria que se encontram. Isto é, no caso de estudantes, idosos, dentre outros, o objetivo é de garantir o acesso à cultura para aqueles que teriam mais dificuldade.
Desse modo, retirar esse direito é contraditório com diversas leis federais e até mesmo a própria Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, o Estatuto do Idoso determina, em seu artigo 23 que:
“A participação dos idosos em atividades culturais e de lazer será proporcionada mediante descontos de pelo menos 50% (cinquenta por cento) nos ingressos para eventos artísticos, culturais, esportivos e de lazer, bem como o acesso preferencial aos respectivos locais.”
Já a Constituição Federal estabelece em seu artigo sexto que:
“São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
De modo que o direito à meia-entrada se encaixa nas garantias sociais acima. Além disso, a Constituição também fala sobre assistência social no seu artigo 203, que indica que “A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social”.
Representante da UNE também se posiciona contra
Por fim, ainda, a presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Bruna Brelaz se manifestou sobre a proposta em entrevista para a UOL.
Na ocasião, portanto, a representante entende que a medida transformaria a meia-entrada em uma nova inteira e, consequentemente, a inteira seria o novo dobro. Ademais, Bruna Brelaz também ressalta que o projeto de lei é um grande retrocesso e inconstitucional. Isto é, já que a Constituição protege o direito à educação e à cultura.
Então, a presidente da UNE defende que os estudantes façam pressão para que o governo vete o texto.