Caixa é condenada a QUITAR financiamento de mutuária com o Alzheimer
Uma mutuária da CEF, incapacitada pela doença de Alzheimer, teve deferido o seu pedido de quitação de financiamento imobiliário e restituição de valores pagos
Em decisão, proferida na quinta-feira (14/05), o juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, da 2ª Vara Federal de Mogi das Cruzes (SP), condenou a Caixa a quitar os débitos de mutuária com Alzheimer.
Uma mutuária da CEF, incapacitada pela doença de Alzheimer, teve deferido o seu pedido de quitação de financiamento imobiliário e restituição de valores pagos após a constatação da incapacidade.
Da mutuária
A autora da ação alega que celebrou contrato de financiamento imobiliário com a CEF, com cláusula de seguro em caso de incapacidade, e que foi acometida pela doença que acabou por incapacitá-la.
Segundo a defesa da mutuária, não houve por parte da instituição o reconhecimento de seu direito previsto em contrato.
Em seu pedido, embasado através de laudo médico pericial, a autora solicitou ainda o ressarcimento por danos morais sofridos, o que foi negado na decisão.
Da Caixa
Por sua vez, a Caixa em sua contestação, arguiu a prescrição das parcelas e alegou ainda que a doença era pré-existente ao contrato, o que afastaria a cláusula contratual do seguro.
A instituição requereu a improcedência da ação e não se manifestou sobre o laudo pericial.
Do juiz
Em sua decisão, o juiz ressaltou que a controvérsia não reside propriamente no caráter de invalidez da autora e da previsão de seguro nesse caso.
Porém, reside sim no que constituiu o ponto central da defesa da CEF, ou seja, a alegação de doença pré-existente.
Controvérsia
“O ponto controvertido da lide é se a doença incapacitante da autora pode ser considerada pré-existente ao contrato e, em caso positivo, se isso exclui o pagamento do seguro.”
O magistrado salientou as informações do laudo da perícia a que foi submetida a autora, que considerou as características da doença, os prejuízos cognitivos instalados e a conclusão de que a mesma é totalmente incapaz para o trabalho.
Ainda mais, atesta que a enfermidade não é passível de cura; portanto a incapacidade é permanente e que, de acordo com o prontuário médico, se encontra nesse estado desde o ano de 2013.
Ao contrário da alegação da CEF, de que o contrato foi celebrado em 2015 (após a constatação da doença pré-existente), em verdade ele foi firmado em período anterior.
Litigância de má-fé x erro grosseiro
“Quero crer que tenha sido um mero erro de digitação ou de atenção e não uma tentativa de induzir o Juízo em erro, o que acarretaria a litigância de má-fé.
Portanto, dada a facilidade em se verificar o desacerto da argumentação da CEF, fico com a hipótese de erro, ainda que grosseiro.
Incorreto, portanto, o argumento da CEF de que não poderia ser pago o seguro por doença pré-existente, visto que esse foi celebrado entre as partes em 2005″, concluiu.
Da prescrição
Quanto à alegação de prescrição das parcelas, o juiz lembra que a autora está incapaz por uma doença que afeta a sua mente.
Portanto, sem capacidade de análise e interpretação, como identificado na perícia, verifica-se que a autora se enquadrava no antigo inciso III do art. 3º do Código Civil.
Ou seja, pessoas, por causa permanente ou transitória, incapazes de exprimir sua vontade.
Ocorre que o dispositivo em questão foi revogado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.
No entanto, Paulo Bueno ressalta que o intuito da Lei no 13.146/2015, que revogou o dispositivo, não era o de diminuir ou extinguir a proteção prevista no art. 198, inc. I, do Código Civil.
O novo estatuto nada dispôs sobre a prescrição em relação às pessoas com algum grau de deficiência.
O objetivo da Lei de impedir ou reduzir a estigmatização das pessoas com deficiência certamente não implica ignorar os problemas que essas pessoas enfrentam.”
Na opinião do juiz, “estando a autora acometida da doença de Alzheimer desde maio de 2013, é inviável considerá-la capaz de analisar o contrato celebrado com a CEF, de modo a pedir em seu favor a cobertura do seguro”.
“Assim, torna-se inviável reconhecer que houve o curso normal da prescrição.”
Bueno ressalta, ainda, que “considerar a pessoa com uma deficiência mental como a causada pela doença de Alzheimer, como plenamente capaz de perseguir em juízo os seus direitos, ofende a sua dignidade como pessoa humana e também a isonomia”.
“Não se pode interpretar que uma lei que veio impedir a exclusão social da pessoa deficiente tenha tido também a finalidade de prejudicá-la, suprimindo seus direitos.”
Decisão do juiz
Por fim, a decisão declarou a quitação do contrato entre as partes, haja vista a comprovação da invalidez permanente da autora em data posterior à assinatura do contrato.
Determinou, ainda, que a Caixa Econômica Federal restitua as parcelas pagas, a partir da constatação da invalidez permanente da autora, em maio de 2013.
Com a devida correção monetária e juros na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal.