Nesta quarta-feira (20) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) publicou que o percentual de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil no Brasil aumentou de 4,5% em 2019 para 4,9% em 2022.
Os resultados do levantamento sinalizam uma reversão da queda do trabalho infantil no país, que acontecia antes da pandemia da Covid-19. Embora em 2022 a pandemia já estivesse atenuada, tudo indica que ela pode ter aumentado a situação de vulnerabilidade de algumas famílias, e levado mais pessoas para o trabalho infantil.
O levantamento segue parâmetros da OIT (Organização Internacional do Trabalho) para definir o que é trabalho infantil, e aponta para o período final do mandato do ex-presidente da república Jair Bolsonaro, que afirmou que não apresentaria nenhum projeto para descriminalizar o trabalho infantil.
Ainda durante sua campanha eleitoral, o atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), se comprometeu fortemente a melhorar a vida das crianças e adolescentes de baixa renda em todo o país. E um dos instrumentos usados para combater o trabalho infantil é o Bolsa Família. Veja como o programa pode fazer a diferença na vida de crianças e adolescentes.
Trabalho infantil: o custo invisível das infâncias roubadas
O trabalho infantil tem consequências significativas, tanto para as crianças e adolescentes envolvidos, como para a sociedade como um todo. Aqui estão algumas das principais consequências:
Prejuízos à saúde:
- Exposição a ambientes perigosos pode resultar em lesões físicas;
- Longas jornadas de trabalho podem causar fadiga, estresse e problemas de saúde mental.
Comprometimento da educação:
- O trabalho frequentemente interfere no acesso à educação regular;
- Crianças que trabalham muitas vezes abandonam a escola precocemente, limitando suas oportunidades futuras.
Desenvolvimento pessoal prejudicado:
- Falta de tempo para brincar, socializar e se envolver em atividades educativas ou recreativas;
- Impacto negativo no desenvolvimento cognitivo e emocional.
Ciclo de pobreza e violência:
- A falta de acesso à educação e oportunidades pode perpetuar o ciclo de pobreza;
- Crianças envolvidas no trabalho muitas vezes enfrentam exploração, abuso e até tráfico humano.
Trabalho infantil: IBGE traz dados alarmantes
Em 2022, aponta o IBGE, o país tinha 756 mil crianças e adolescentes de 5 a 17 anos exercendo as piores formas de trabalho infantil. Tratam-se de atividades descritas na chamada Lista TIP (trabalho infantil perigoso) com maiores riscos de acidentes ou que são prejudiciais à saúde.
A Lista TIP apresenta 93 atividades no Brasil prejudiciais à saúde, à segurança e à moralidade das crianças e dos adolescentes.
Podemos citar como exemplos extraídos da lista:
- operação de tratores e máquinas agrícolas;
- processo produtivo de fumo, algodão e cana-de-açúcar;
- aplicação de agrotóxicos;
- atividades em minas de carvão;
- coleta de caranguejos em manguezais;
- atividades que exijam mergulho em rios, lagos e mar;
- extração de pedras e mineração;
- abates de animais em matadouros;
- fabricação de bebidas alcoólicas;
- construção civil;
- trabalho em borracharias e recapagens de pneus;
- trabalho doméstico infantil para terceiros;
- atividades em câmaras frigoríficas.
Conforme o IBGE, o rendimento médio mensal das crianças e dos adolescentes em trabalho infantil foi de R$ 716 em 2022.
Os dados do Instituto mostram que pretos ou pardos predominam no grupo. Em 2022, eles representavam 66,3% das crianças e adolescentes de 5 a 17 anos expostos a essa situação.
As estatísticas também indicam predomínio masculino no trabalho infantil. Em 2022, os meninos eram 65,1%, para 34,9% de meninas.
A lei regulamenta o trabalho de adolescentes
Pelos critérios da pesquisa citada no início do artigo, uma criança ou um adolescente de 5 a 17 anos está em trabalho infantil quando realiza uma atividade econômica ou de autoconsumo (consumo próprio) que é perigosa ou prejudicial para sua saúde e seu desenvolvimento mental, físico, social ou moral, interferindo na sua escolarização.
Porém, nem toda atividade laboral dos jovens é apontada como trabalho infantil. Conforme a legislação brasileira, o adolescente pode trabalhar, desde que respeitadas algumas prerrogativas.
Dos 14 aos 15 anos, há autorização na condição de aprendiz, que deve contribuir para a formação dos jovens. Dos 16 aos 17 anos, o trabalho é permitido com carteira assinada.
Em qualquer dos casos, é proibida qualquer forma de trabalho até os 13 anos, e submeter o jovem a jornadas noturnas, insalubres e perigosas.
Bolsa Família tem medida para prevenção do trabalho infantil
O Bolsa Família é um programa do governo brasileiro que tem como objetivo combater a pobreza e promover a inclusão social, oferecendo assistência financeira às famílias de baixa renda.
Neste ano, ele retorna com objetivos mais amplos: além de acabar com a fome, também integrar políticas públicas, facilitando o acesso das famílias a direitos básicos como saúde, educação, assistência social e moradia.
Para que façam parte da folha de pagamento, as famílias beneficiárias devem cumprir compromissos nas áreas de educação e saúde para reforçar o acesso aos direitos sociais básicos.
As condicionalidades são:
- Realização do acompanhamento pré-natal;
- Acompanhamento do calendário nacional de vacinação;
- Realização do acompanhamento do estado nutricional das crianças menores de sete anos;
- Para as crianças de quatro a cinco anos, frequência escolar mínima de 60%;
- Para crianças e adolescentes de seis a 18 anos incompletos que não tenham concluído a educação básica, frequência escolar mínima de 75%.
Ao condicionar a frequência escolar ao recebimento do Bolsa Família, o programa ajuda a combater o trabalho infantil, visto que pesquisas afirmam uma relação significativa entre o trabalho infantil e a evasão escolar, com consequências negativas para a educação e o desenvolvimento dessas crianças.
Os adicionais pagos no Bolsa Família que tem ligação direta com os menores são:
- Benefício de Primeira Infância, no valor de R$ 150,00 por cada criança de 0 a 6 anos de idade;
- Benefício Variável Familiar: pago às famílias que tenham em sua composição gestantes e/ou crianças, com idade entre sete e 12 anos incompletos e/ou adolescentes, com idade entre 12 e 18 anos incompletos; no valor de R$ 50 por pessoa que atenda estes critérios.
Trabalho infantil agora possui comissão nacional independente
Junto a isso, deverão ser tomadas medidas efetivas no combate à mão de obra infantil. Em 20 de abril deste ano, foi publicado o Decreto nº 11.496, que dispõe sobre a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil. Com o decreto, a comissão deixa de ser vinculada ao Conselho Nacional do Trabalho e passa a ser um colegiado próprio.
A mudança foi motivada pela necessidade permanente de diálogo social acerca do tema. A comissão tem o objetivo de elaborar, monitorar e avaliar a proposta de plano nacional para a prevenção e a erradicação do trabalho infantil e para proteção ao adolescente trabalhador.