Inicialmente, a teoria do adimplemento substancial do contrato é amplamente reconhecida pela doutrina.
Desse modo, abrange os casos impeditivos de resolução unilateral do contrato.
Ou seja, quando não se pode acabar com a relação contratual ainda que haja inexecução (parcial) do contrato por um dos contratantes.
Isto serve para trazer maior segurança jurídica às relações nos casos em que o contrato já foi cumprido quase em sua totalidade.
O que não quer dizer, claro, que legitimará que o devedor, na relação contratual, saia em vantagem. Há, por exemplo, contumaciedade no comportamento de inadimplência por parte do devedor? Há vontade por parte do devedor no descumprimento?
O que se busca, então, é a solução do problema através de vias menos gravosas.
Por isso mesmo, em casos de contrato de alienação fiduciária onde o devedor da obrigação de pagar as parcelas ajustadas encontra-se em débito perante o credor, este credor terá a possibilidade de se valer de outras vias jurídicas.
Por exemplo, poderá valer-se de ação de cobrança ou de execução.
Portanto, não necessitará se utilizar da busca e apreensão do veículo, que é o meio mais gravoso e que resulta na resolução do contrato pactuado.
Perceba que aqui não cabe a extinção da mora.
Mas,por ser ela insignificante frente a toda a obrigação já cumprida, sugere-se outros efeitos jurídicos, como falamos acima.
O nascimento da teoria aqui debatida se encontra no Direito Inglês (substancial performance).
Outrossim, tem emprego no Código Civil Italiano, no art. 1455 que, em tradução livre, nos diz que o contrato não pode ser resolvido se o inadimplemento de uma das partes é de pouca ou de escassa importância dado os interesses da outra parte.
Assim, é descrito no original:
“Art. 1455 Importanza dell’inadempimento
Il contratto non si può risolvere se l’inadempimento di una delle parti ha scarsa importanza, avuto riguardo all’interesse dell’altra (1522 e seguenti, 1564 e seguente, 1668, 1901). ”
Infelizmente, não há previsão expressa para o adimplemento substancial em nosso ordenamento jurídico.
Dessa forma, isto abre lacunas no Direito, para diversas inovações. E afasta, ainda, dezenas de teorias que buscam materializar, dentro de nossos princípios, a existência da teoria.
Além disso, tamanha é a discussão sobre o tema, que foi aprovado o Enunciado 361 da IV Jornada de Direito Civil:
Enunciado 361: Arts. 421, 422 e 475. O adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer preponderar a função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizando a aplicação do art. 475
O enunciado é claro e, portanto, fala por si só.
Embora não haja previsão na lei, o adimplemento substancial pátrio é baseado nos princípios basilares que devem reger toda relação jurídica, em observância, sobretudo, da função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva.
Contudo, a falta de clareza legislativa sobre o tema gera uma série de problemas.
O primeiro deles é a delimitação do que vem a ser o adimplemento substancial em uma relação jurídica.
No entanto, podemos utilizar dois parâmetros, como bem nos lembra Flávio Tartuce ao citar a doutrina italiana, que nos ajudam a descobrir quando o adimplemento é substancial ou não:
Há, ainda, outro problema que enfrentamos por conta da falta de previsão legal.
Trata-se da divergência jurisprudencial sobre o assunto. Isto porque, até então, a maioria dos julgados era favorável no sentido de considerar existente o adimplemento substancial.
E privilegiavam, assim, a manutenção do contrato face a uma maneira gravosa de interrupção contratual, como no já citado caso da busca e apreensão.
No entanto, recentemente o STJ mudou o entendimento. E abriu, dessa maneira, precedente para ressurgir a discussão sobre esse tema.
No entanto, a decisão não muda o fato de a teoria do adimplemento substancial ter total validade em nosso ordenamento jurídico, devendo ser utilizada no contexto contratual e merecendo total amparo jurisdicional, sobretudo por ser essencialmente parte dos princípios que regem os contratos.