Com 20 anos de sala de aula, a professora Rita Marta Silva, de 46 anos, acredita que livros são capazes de transformar o mundo. Mais do que ensinar, ela quer criar leitores. Desde o início da quarentena, em março, os alunos dela, que estão no 5º ano, leram 20 livros em Franca (SP).
Com 10 anos de idade, os leitores mirins estão muito à frente do restante da população, tendo em vista que os brasileiros leem cerca de dois livros por ano, de acordo com a pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”, do Instituto Pró-Livro.
“Eles perceberam que todos os momentos e cantinhos são de leitura, não só na escola. Eles pegavam um texto com muita dificuldade para compreender e, quando a literatura entrou no cotidiano, passaram a ter uma interpretação de texto invejável para crianças”, diz a professora.
‘Pé de livros’
Para incentivar os alunos, antes da quarentena, Rita pendurava livros em uma árvore do pátio da escola estadual Adalgisa de São José Gualtiéri e, às terças-feiras, transformava a sala de aula em um clube de leitura, com as portas abertas para a família das crianças participarem dos debates.
O projeto, batizado de “Pé de livros entre amigos”, ganhou destaque entre quatro mil iniciativas e deu à professora o prêmio mais importante da educação básica brasileira, o “Educador Nota 10”. Agora, Rita, que também ensina pedagogia na Faculdade Anhanguera, disputa o título de “Educador do Ano”.
“A gente discutia trechos da obra, características dos personagens, perfis dos autores e quem não tinha lido se interessava. Depois do encontro, eu colocava os livros à disposição e eles corriam para abraçar os que queriam ler, porque a discussão tinha sido muito boa”, relembra.
Um dos mais engajados do projeto, o estudante Leonardo Garcia, de 11 anos, não lia nada antes de conhecer a professora Rita. Com o “pé de livros”, no entanto, Léo viu a paixão pela leitura brotar e virar rotina, tanto dentro quanto fora da escola.
“Eu não gostava de ler. Não conseguia ter interesse. A professora Rita conseguiu fazer eu ter um amor muito grande pela leitura. Uma das melhores coisas para mim é ler e escrever”, diz.
Os encontros continuam durante a quarentena, mas pela internet. Sem sair de casa, os estudantes conheceram a Espanha de “Dom Quixote”, a Itália de “Romeu e Julieta”, a França de “A Catedral de Notre-Dame”, e pretendem continuar com as viagens e os debates literários.
“Eles perceberam que a leitura é a chave que abre todas as portas. Ler vai muito além dos resumos produzidos e das fichas técnicas. Ler é interagir”, afirma a professora.
Da sala de aula adiante
Além de participar dos debates, os alunos da professora Rita quiseram ir além. Durante o recreio, eles passaram a compartilhar indicações literárias com amigos de outras séries e ler em voz alta para os colegas mais novos, que ainda não haviam sido alfabetizados.
“No recreio, as crianças brincam, correm, têm outro tipo de interesse. Com um megafone, a gente ia anunciando e convidando para eles virem conhecer os livros e, para nossa surpresa, a gente olhava e estava todo mundo em rodas lendo os livros”, relembra Rita.
Quando o projeto já havia se espalhado entre a escola toda, os alunos quiseram compartilhar o amor pela leitura de lado de fora dos portões. Com ajuda da professora e de familiares, eles organizaram “pedágios literários” para distribuir livros doados em semáforos das ruas de Franca.
“Meus alunos se apoderaram do conhecimento e transcenderam a sala de aula. Eles sentiram que podem transformar a vida deles e a do outro”, diz a professora, com orgulho. Fonte: G1