O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, defende que: crianças e adolescentes têm direito à vacinação, mesmo contra as convicções pessoais filosóficas, religiosas, morais ou existenciais dos pais ou responsáveis.
Essa foi a recomendação do parecer encaminhado ao Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário com Agravo 1.267.879/SP.
De acordo com o PGR, a Constituição determina, em seu artigo 227, o princípio da proteção integral à infância e adolescência como dever da família, da sociedade e do Estado. Ao mesmo tempo, a vacinação é uma questão de saúde coletiva. Esses dois princípios devem prevalecer sobre o direito à liberdade de convicção em relação às crianças e adolescentes.
A origem do caso, teve início com a Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público de São Paulo (MP/SP), obrigando os pais a encaminharem filho menor de idade à Secretaria Municipal de Saúde para receber as vacinas disponíveis para sua faixa etária.
Na primeira instância, a Justiça Federal decidiu em favor dos pais que se negavam vacinar a criança em razão de “escolha ideológica”. Contudo, a sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), sob o entendimento de que a não vacinação configura ato ilícito, por ofensa a normas específicas de tutela individual da saúde da criança e da saúde pública.
Diante disso, os pais recorreram ao Supremo, que reconheceu a matéria com tema de repercussão geral.
No parecer encaminhado ao STF, o procurador-geral mencionou que a Constituição (no artigo 227, caput) determina o princípio da absoluta prioridade para a criança e para o adolescente, garantindo sua proteção integral. Do mesmo modo, a mesma determinação encontra-se no art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Nesse sentido, o PGR, Augusto Aras, declarou: “Constitui obrigação do Estado, da família e da sociedade implementar vários direitos fundamentais e indisponíveis para a tutela da criança e do adolescente, tais como o direito à vida e à saúde”.
Além disso, o PGR afirmou que a garantia a cuidados e assistência especiais está prevista em convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Convenção sobre os Direitos da Criança, entre outras.
O PGR destacou que a imunização vai além da proteção individual, ao impedir a propagação de doenças contagiosas entre a população. “Vacinar uma criança objetiva não apenas proteção individual, mas a de todos os demais cidadãos. Diversas doenças foram extintas graças ao advento da vacina, e compreender sua importância faz parte do senso de responsabilidade social”, declarou Augusto Aras.
Portanto, segundo Aras, trata-se de uma questão de saúde pública, “direito de todos e obrigação do Estado que reduz o risco de doenças e outros agravos e aumenta a expectativa de vida dos seres humanos”.
Da mesma forma, o PGR mencionou o Decreto 78.231/1976, que dispõe sobre o Programa Nacional de Imunizações, instituiu a obrigação dos pais, responsáveis ou cuidadores em vacinar crianças e adolescentes sobre os quais tenham a guarda ou são responsáveis. Assim, a dispensa pode ocorrer apenas com a apresentação de atestado médico que contraindique a aplicação da vacina.
Todavia, o descumprimento dessa obrigação pode ensejar infrações administrativas, cíveis e até mesmo criminais.
De acordo com o artigo 249 do ECA, a negativa injustificada à vacinação de criança é infração administrativa passível de multa. Se for um caso doloso, pode resultar inclusive na suspensão do poder familiar. Assim, quem deixa de vacinar crianças e adolescentes pode responder também pelo crime previsto no artigo 248 do Código Penal (CP).
Na avaliação do PGR, o direito constitucional à liberdade de convicção (seja religiosa, filosófica, existencial ou moral do indivíduo) não pode prevalecer sobre o direito de proteção integral da criança e do adolescente e de preservação da saúde coletiva, já que eles possuem natureza indisponível e dizem respeito à ordem pública.
“Ante a proteção integral da criança e do adolescente e a absoluta prioridade de seus direitos garantidos pela família, pela sociedade e pelo Estado, inexiste margem decisória de conveniência ou oportunidade dos pais, responsáveis ou cuidadores para o cumprimento da obrigação de garantir que sejam vacinados”, afirmou Aras. No entendimento do PGR, o STF deve fixar a tese de repercussão no sentido de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde, e o dever do Estado de garantir a saúde coletiva.
Fonte: MPF
Veja mais informações e notícias sobre o mundo jurídico AQUI