Afetados pelo enxugamento dos recursos da União para a área, os gastos públicos com educação vêm caindo nos últimos anos. De 2016 a 2018, o governo federal reduziu, em valores nominais, R$ 10,5 bilhões de seus dispêndios com o setor, segundo relatório do MEC (Ministério da Educação).
Ao atualizar o valor pela inflação do período, a redução é de R$ 18 bilhões. Apesar de ter a maior capacidade de arrecadação, a União sempre arcou com os menores montantes no financiamento, principalmente na educação básica.
A situação se intensificou nos últimos anos, marcados por crise política e econômica, e inspira maior preocupação diante dos efeitos da pandemia de coronavírus. A União respondia, em 2016, por 30,3% dos gastos totais com educação no país. Em 2018, o percentual foi reduzido a 28,1%.
Os dados são do relatório de monitoramento das metas do PNE (Plano Nacional de Educação), feito pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais). O instituto é ligado ao MEC.
Municípios e estados ficam com a fatura
Por outro lado, o peso tem ficado maior para os municípios. A participação das prefeituras era de 36,1% em 2016 e fechou 2018 em 40%. Os dados do relatório sobre gastos em educação vão até 2018, último ano do governo Michel Temer (MDB). Mas deficiências de execução orçamentária do MEC no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro indicam cenário similar.
Os gastos do governo federal em educação foram, em 2018, de R$ 103,6 bilhões. Esse cálculo inclui ações direcionadas ao setor privado (como o subsídio do Fies, o Financiamento Estudantil).
Em 2016, esse recurso somava R$ 114,2 bilhões, o equivalente a R$ 122,3 bilhões em valores atualizados pela inflação no período. Trata-se de uma queda de 15% ao levar em conta essa correção da inflação. Por outro lado, os gastos de estados e municípios, que têm as escolas da educação básica sob sua responsabilidade, ficaram em R$ 257 bilhões em 2018.
O montante era de de R$ 254,9 bilhões em 2016, que representam R$ 273 bilhões em valores atualizados no período. A variação corrigida no período indica uma queda de 5%
“A queda dos recursos da União é visível na educação básica e vem fazendo com que programas e ações importantes tenham redução, como, por exemplo, o que incentiva o avanço do número de alunos em tempo integral”, diz Luiz Miguel Garcia, presidente da Undime, órgão que agrega secretários municipais de Educação.
No ano passado, o Brasil registrou 14,9% dos alunos em tempo integral, praticamente o mesmo em 2018, de 14,4%. A meta é chegar a 25%. O relatório do governo mostra que, ao invés de avançar, o país retrocedeu na questão do financiamento.
Os gastos totais com educação representavam 5,6% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2016 e passaram a 5,4% em 2018. Esse percentual de 2018 equivale a R$ 368,8 bilhões.
O avanço do orçamento federal da área identificado até 2016 foi impactado pela alta de gastos com o Fies, que vem passando por esvaziamento desde aquele ano.
Ao levar em conta apenas os gastos em educação pública (sem o Fies), o percentual do PIB voltado à educação passou de 5,1% em 2016 para 5% em 2018. O PNE estipulou em 2014 que, para o país alcançar as metas (que vão da creche à pós-graduação), os investimentos em educação pública teriam de chegar a 10% do PIB até 2024. Uma meta parcial preconiza um percentual de 7% em 2019.
“Entendemos que seria importante elevar a destinação de recursos públicos para a educação, principalmente ao ensino básico. Entretanto, reconhecemos a situação fiscal desafiadora que o Brasil enfrenta nos últimos anos, o que dificulta tal ação”, disse o secretário-executivo do MEC, Antonio Vogel.
Ainda não há cálculos consolidados, comparáveis aos do relatório, sobre o investimento em educação em 2019. No mês passado, de acordo com levantamento feito pela Folha de S.Paulo, 60% dos gastos realizados pelo MEC até abril referem-se a compromissos assumidos em 2019 mas não executados naquele ano. O que significa que boa parte do dinheiro previsto não chegou de fato à ponta.
O MEC afirmou em nota que o contingenciamento, operado no ano passado, perdurou até 21 de novembro de 2019. “Apenas após essa data o orçamento pôde ser empenhado em sua totalidade”, diz o texto. Mas ações da pasta excluídas do contingenciamento também tiveram recursos represados, como o PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola).
Até 20 de dezembro de 2019, haviam sido empenhados 52% do orçamento do programa e pagos até aquele momento 49%. O MEC fechou 2019 com o empenho de praticamente todo orçamento, mas o executado chegou a somente 56,5%.
Daniel Cara, da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, diz que o orçamento da área ficou praticamente congelado desde os cortes impostos ainda em 2015, com Dilma Rousseff (PT), e “virou permanente” com Temer e a aprovação do teto de gastos -que limita o aumento das despesas à inflação.
“As políticas públicas são aquilo que os governos fazem ou optam por não fazer. Assim, não vejo o governo Bolsonaro interessado em reduzir os danos arrecadatórios da pandemia na educação. Pelo contrário, o péssimo desempenho na execução orçamentária de 2019 demonstra que reduzir as políticas educacionais é uma opção.”
Levantamento da execução orçamentária do MEC deste ano, realizado pela liderança do PSOL na Câmara, indica uma execução de 41% até 30 de junho. As despesas discricionárias (que excluem salários) sofrem restrição maior: o custeio está com 35% de execução e os investimentos, 10%.
A ampliação do papel da União na educação básica é central na discussão sobre renovação do Fundeb, em tramitação no Congresso. O principal mecanismo de financiamento da etapa vence neste ano, e a gestão Bolsonaro pouco se envolveu no tema.
O fundo reúne parcelas de impostos e recebe uma complementação da União para estados e respectivos municípios que não atingem o valor mínimo anual por aluno. O complemento federal atual é de 10% e o projeto na Câmara amplia para 20%.
Esse percentual deve ser alcançado de forma escalonada, chegando a 12,5% no primeiro ano de vigência, de acordo com versão mais recente. O plano é votar a emenda constitucional na Câmara ainda neste mês. “Nós temos problemas históricos na educação e agora estamos somando a isso os efeitos da pandemia”, disse o deputado Bacelar (Pode-BA), presidente da comissão que analisa o tema na Câmara.
Em nota, o MEC defendeu que participa das discussões sobre o fundo. Afirmou ainda que levanta informações e indicadores necessários à regulamentação do novo Fundeb, “a fim de viabilizar a operacionalização tempestiva do novo modelo de financiamento a partir do ano de 2021, caso a proposta seja efetivamente aprovada”. *Informações da Folha de S.Paulo.