Campos Neto fala sobre ‘ruído’ entre Governo Federal e Banco Central
A relação entre o governo Lula e o Banco Central não é positiva desde o início do mandato do presidente.
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou na segunda-feira (22) que o “ruído” entre o Governo Federal e o BC não é positivo para o país. De acordo com ele, essa situação acaba afetando a previsão da inflação no país.
“O ruído entre o governo e o Banco Central gerou uma incerteza em relação a capacidade do Banco Central de atingir os objetivos”, disse. O presidente do BC destacou que as divergências entre o governo e a autarquia ajudam a manter as expectativas para a inflação em alta.
Campos Neto fez a declaração durante uma palestra promovida pelo jornal Folha de S. Paulo. No evento, ele ressaltou que o mercado financeiro continua inseguro em relação à possibilidade de alteração da meta de inflação para 2023.
“O componente da incerteza da meta é predominante, a gente precisa ver como isso vai se desenvolver. Mas eu acho que a gente tem elementos para começar a ver essa expectativa de inflação caindo“, disse o presidente do BC.
Em resumo, as divergências entre o Governo Federal e o Banco Central estão bem intensas desde o início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Aliás, a situação ficou ainda mais difícil com as recentes decisões do BC, de manter a taxa de juros no maior patamar em seis anos e meio.
Governo Lula x Banco Central
Nos últimos meses, as críticas do presidente Lula à taxa de juros no Brasil preocuparam o mercado, que temia a perda da autonomia do BC. Contudo, o próprio governo disse que a autonomia da entidade não corria perigo.
“Estamos construindo essa relação. Todos que estão aqui estão correndo pelo mesmo objetivo, somos dois braços do mesmo organismo e temos que trabalhar pelo mesmo objetivo“, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na última sexta-feira (19).
Embora o ministro venha tentando amenizar a situação, suas declarações seguem o posicionamento do presidente Lula. Haddad afirmou que a economia brasileira só poderá ter um crescimento fortalecido se houver redução dos juros no país. Inclusive, ele afirmou que o país precisa crescer mais que a média mundial.
A redução dos juros é um tema constante das críticas do presidente Lula. No início deste mês, o líder do Executivo fez questão de afirmar que o BC possui autonomia, mas não é intocável.
Além disso, Lula também afirmou, à época, que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, “não tem compromisso com o Brasil“. Segundo ele, Campos Neto tem compromisso com “aqueles que gostam de taxa de juros alta“.
Meta da inflação para 2023
Na segunda-feira (22), o presidente do BC também afirmou que o aumento da meta de inflação não seria benéfica para o país, pois “não geraria flexibilidade [para a política fiscal do governo]“.
A saber, o presidente Lula já fez críticas sobre a meta definida para 2023, ressaltando que a taxa pressiona o BC a manter os juros elevados para cumprir a meta.
A propósito, o Conselho Monetário Nacional (CMN) é o responsável pela projeção de uma meta central para a inflação do país todos os anos. Cabe ao Banco Central agir para cumprir a meta definida, uma vez que a inflação controlada traz diversos benefícios para o país, como:
- Maior tranquilidade para investir no Brasil;
- Mais previsibilidade econômica, permitindo um planejamento das indústrias;
- Redução da concentração de renda;
- Maiores chances para o país ter um crescimento econômico sustentável.
Para 2023, o CMN definiu uma meta central de 3,25% para a inflação no país, podendo variar entre 1,75% e 4,75%. Isso acontece porque a entidade também define um intervalo de 1,5 ponto percentual (p.p.) para a taxa inflacionária, para cima e para baixo.
Neste sentido, caso a inflação deste ano tenha uma variação dentro desse intervalo, entre 1,75% e 4,75%, ela terá sido formalmente cumprida, mesmo que seja diferente à meta central de 3,25%.
Cabe salientar que o Conselho Monetário Nacional é composto por:
- Presidente do Banco Central;
- Ministro da Fazenda;
- Ministro do Planejamento e Orçamento.
Estimativas para a inflação no Brasil em 2023
Segundo o relatório Focus, que traz estimativas de analistas de mais de 100 instituições financeiras sobre indicadores econômicos do país, a inflação no Brasil deverá ficar em 5,80% em 2023.
Caso esse dado se confirme, a inflação irá estourar a meta pelo terceiro ano consecutivo, ou seja, os preços de produtos e serviços vão subir mais que o esperado mais uma vez.
Por um lado, o governo federal acredita que a redução dos juros ajudará o Brasil a crescer mais fortemente. Por outro lado, o Banco Central vem mantendo a taxa em 13,75% ao ano, desde agosto de 2022, pois segue atento à inflação e a uma eventual aceleração da taxa.
Diante desse cenário, Campos Neto defendeu a “harmonia” entre a política monetária e a política fiscal do Brasil. Aliás, ele explicou que as ações do BC e do Governo Federal possuem diferenças significativas.
“É importante separar o ciclo político do ciclo econômico. A gente precisa ter harmonia entre o fiscal e o monetário, mas nem sempre eles têm o mesmo ciclo. Intertemporalmente, os ciclos são diferentes. O tempo de efeito é diferente“, disse Campos Neto.