Em uma decisão sem precedentes, o juiz do Trabalho Maurício Pereira Simões da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou a gigante de compartilhamento de corridas, Uber, a contratar todos os motoristas cadastrados na plataforma e a pagar uma multa de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos.
Esta decisão histórica atende a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), através da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região. A sentença tem validade em todo o território nacional.
A Uber, que atualmente tem entre 500 mil e 775 mil motoristas cadastrados, enfrenta agora a obrigatoriedade de formalizar contratos de trabalho com todos eles, uma mudança drástica em seu modelo de negócios.
Além da multa de R$ 1 bilhão, a Uber também está sujeita a uma multa diária de R$ 10 mil para cada motorista não registrado. O juiz Maurício Pereira Simões estabeleceu um prazo de seis meses, a partir do trânsito em julgado, para o cumprimento da decisão.
“Uma vez intimada, a empresa deverá listar todos os motoristas com cadastro ativo na plataforma. Em seguida, deverá comprovar a regularização dos contratos de trabalho de 1/6 deles a cada mês, até o término do prazo”, informa a sentença.
Os valores da multa por danos morais coletivos serão destinados ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) em 50%. A outra metade será dividida entre associações de motoristas de aplicativos que tenham registro em cartório e constituição social regular, em cotas iguais.
Ao ser procurada para comentar a decisão, a Uber informou que irá recorrer e que não adotará nenhuma das medidas elencadas na sentença até que todos os recursos cabíveis sejam esgotados.
A empresa alega que a decisão representa “um entendimento isolado e contrário à jurisprudência que vem sendo estabelecida pela segunda instância do próprio Tribunal Regional de São Paulo em julgamentos realizados desde 2017, além de outros Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho”.
A Uber argumenta que a sentença não considerou de forma adequada o “robusto conjunto de provas produzido no processo”. Além disso, a empresa critica o fato de a decisão ter se baseado, principalmente, em posições doutrinárias já superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A empresa destaca que o próprio magistrado reconhece na sentença a ausência de legislação no país que regulamente o novo modelo de trabalho intermediado por plataformas. A Uber acredita que essa lacuna legislativa deve ser preenchida por meio de discussões e propostas regulatórias, e não por decisões judiciais isoladas.
Especialistas em direito do trabalho apontam que, se mantida, a decisão pode ter sérias implicações para a Uber e para outros aplicativos de compartilhamento de corridas.
Ronan Leal Caldeira, responsável pela área trabalhista do GVM Advogados, argumenta que “se a sentença for mantida, não me surpreenderei se eles [Uber] fecharem as portas aqui no Brasil”.
Outro aspecto destacado é a limitação da liberdade de negociação entre as partes que a decisão impõe. Ana Carolina Machado Lima, sócia e coordenadora da área trabalhista do SGMP Advogados, ressalta que a decisão “impacta a liberdade de negociação entre as partes pois obriga o motorista a se submeter a uma relação de emprego que nem sempre é por ele desejada”.
A decisão é um marco no debate sobre a natureza da relação entre a Uber e seus motoristas. Enquanto aguardamos o desenrolar dos recursos, uma coisa é certa: este caso pode ter implicações significativas para a economia dos aplicativos no Brasil e além.
Seja qual for o resultado, é importante lembrar que os motoristas de aplicativos são uma parte essencial do ecossistema Uber e merecem ser tratados com dignidade, respeito e justiça.