Há divergência entre o permissivo constitucional da garantia ao livre exercício da profissão e a legislação federal que proíbe o exercício da profissão em condições insalubres após a aposentadoria pela modalidade especial.
Inicialmente, ressalta-se que a aposentadoria especial sempre foi um benefício previdenciário que suscitou grandes dúvidas acerca de seus requisitos e consequências.
Com o advento da Emenda Constitucional n 103, de 12 de novembro de 2019 (Reforma da Previdência), as dúvidas sobre este benefício aumentaram.
Dentre as dúvidas suscitadas, há quem alegue inconstitucionalidade no que tange à fixação da idade mínima, sem nenhum critério de análise ao ambiente laborado, que pode levar o cidadão à incapacidade, e até mesmo ao óbito.
Todavia, analisaremos relevante questão que não foi solucionada pela Reforma e continua sendo alvo de confusão, por parte do empregador, empregado, INSS e tribunais.
Trata-se do caso em que o segurado continue trabalhando em condições insalubres mesmo após ter se aposentado pela modalidade especial.
Com efeito, a Lei Previdenciária Federal (Lei 8213/91) dispõe que o recebimento da aposentadoria especial permite continuar trabalhando apenas se houver cancelamento do benefício.
Vale dizer, uma vez concedida a aposentadoria, o empregado imediatamente deve se afastar do seu labor.
No entanto, o ponto controvertido consiste no artigo 5º, XIII, da Constituição Federal, que trata do livre exercício profissional:
“É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
Em contrapartida, não há na Constituição Federal qualquer proibição ou menção expressa ao trabalho no caso do labor em condições especiais posteriormente à aposentadoria.
No entanto, conforme esclarecido no artigo que tratou especificamente da aposentadoria especial, o principal argumento utilizado quando da concessão da aposentadoria especial é “a preservação da saúde do trabalhador”.
Vale dizer, o benefício previdenciário é pago justamente para que o aposentado não possua mais contato com os agentes nocivos à saúde.
Isto porque o fato de ter mantido a atividade nociva em seu labor foi o fato gerador da aposentadoria especial.
Portanto, continuar neste meio insalubre seria como invalidar o propósito da aposentadoria especial.
Trata-se, pois, de um assunto polêmico sobre o qual os tribunais muitas vezes discordam.
Isto porque o INSS não tem o condão de obrigar o cidadão a parar de trabalhar em sua profissão, principalmente pelo fato de que este labor não gerará custos à Autarquia.
Em contrapartida, a Constituição Federal e está no topo da “hierarquia das leis” sendo esse um princípio básico do Direito Constitucional conhecido por todos.
Destarte, as leis que vem abaixo dela devem estar de acordo com seus ditames sob pena de serem consideradas inconstitucionais.
Na situação ora discutida, vigorando a Lei, ou o artigo de lei em desacordo com a Constituição, esta afastará a aplicação da lei de grau inferior.
Em outras palavras, de acordo com os ditames constitucionais, os profissionais poderão continuar exercendo a profissão insalubre sem precisar abrir mão de sua aposentadoria especial.
Decerto, esse não é o posicionamento do INSS.
Com efeito, para o INSS, estando aposentado aos 25, 20, ou 15 anos pela modadlidade especial especial de aposentadoria, o indivíduo deve automaticamente se desligar do seu emprego, sob pena de suspensão da aposentadoria.
O STF, todavia, sempre defenderá o texto da Constituição Federal como superior.
Neste sentido, já existem julgados favoráveis ao empregado que quer continuar trabalhando em condições insalubres após a aposentadoria especial.
No entanto, insta salientar que se trata de assunto de repercussão geral e, desde 2014, não há um posicionamento pacificado por parte do STF.
Neste ínterim, os tribunais, como o TRF 4ª Região, consideram que os trabalhadores podem continuar suas atividades posteriormente à aposentadoria especial.
Outrossim, a Corte Especial do supracitado Tribunal, em julgamento realizado em 24/05/2012, afirmou a inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei 8.213/91.
Este parágrafo faz referência ao cancelamento da aposentadoria especial caso o segurado retorne ao trabalho.
Diante da polêmica instaurada, o recomendado aos trabalhadores aposentados pela modalidade especial que desejam continuar trabalhando é buscar auxílio de um advogado previdenciário.
Neste caso, o advogado analisará a possibilidade de entrar com ação judicial e pleitear o direito ao “livre exercício da profissão”, pautado na documentação apresentada.