A dipirona é um medicamento amplamente utilizado no Brasil para aliviar febre e dor. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mais de 215 milhões de doses deste medicamento foram comercializadas no país apenas em 2022. No entanto, em outros países, como os Estados Unidos e uma parcela da União Europeia, a dipirona está proibida há décadas devido a uma controvérsia em torno de um possível efeito colateral grave: a agranulocitose. Neste artigo, exploraremos a evidência científica por trás dessa alegação, o mecanismo de ação da dipirona, sua proibição em alguns países e sua eficácia e modos de uso.
A dipirona, também conhecida pelo nome comercial Novalgina, foi criada em 1920 pela farmacêutica alemã Hoechst AG. Desde então, o medicamento se tornou amplamente disponível nas drogarias brasileiras. Além da Novalgina, outros remédios populares que contêm dipirona são o Dorflex e a Neosaldina. Todos eles estão disponíveis nas farmácias sem a necessidade de receita médica. No entanto, é importante sempre conversar com o farmacêutico para entender se a dipirona é a melhor opção para o seu caso específico.
Apesar dos 100 anos de história, o mecanismo de ação da dipirona ainda está cercado de mistérios. A principal suspeita é que a dipirona atue contra uma molécula inflamatória conhecida como COX. A hipótese é que ela iniba a COX, aliviando a inflamação responsável pela febre e pela dor.
A dipirona estava amplamente disponível em boa parte do mundo até meados dos anos 1960 e 1970. No entanto, surgiram os primeiros estudos que levantaram o alerta sobre o risco de agranulocitose, uma alteração sanguínea grave marcada pela queda na quantidade de alguns tipos de células de defesa. Um trabalho publicado em 1964 calculou que essa alteração sanguínea ocorria em um indivíduo para cada 127 que consumiam a aminopirina, uma substância com estrutura semelhante à da dipirona.
Com base nessa semelhança química, os autores desse estudo não fizeram distinção entre as duas moléculas e assumiram que os resultados obtidos para a aminopirina também seriam aplicáveis à dipirona. Essa evidência e outras levaram a Food and Drug Administration (FDA), a agência regulatória dos Estados Unidos, a decidir que a dipirona deveria ser retirada do mercado americano em 1977. Logo em seguida, outros países, como Austrália, Japão, Reino Unido e partes da União Europeia, seguiram a mesma resolução.
Curiosamente, a proibição da dipirona ocorreu nos países que mais conduzem pesquisas sobre eficácia e segurança de medicamentos. Essa proibição diminuiu o interesse em realizar testes e investigações sobre a dipirona, o que fez com que o medicamento se tornasse praticamente desconhecido nesses lugares desde então.
Um estudo de grande escala conhecido como Latin Study foi realizado na América Latina com o objetivo de avaliar a segurança da dipirona. Entre janeiro de 2002 e dezembro de 2005, cientistas do Brasil, Argentina e México analisaram dados de 548 milhões de pessoas. Nesse universo, foram identificados 52 casos de agranulocitose, o que representa uma taxa de 0,38 caso por milhão de habitantes/ano.
O estudo também revelou que esses episódios de agranulocitose são relativamente mais comuns em mulheres, crianças e idosos. Além disso, em 2001, a Anvisa realizou o “Painel Internacional de Avaliação de Segurança da Dipirona”, que contou com a participação de especialistas brasileiros e estrangeiros. O painel concluiu que a eficácia da dipirona como analgésico e antitérmico é inquestionável, e os riscos atribuídos ao seu uso são baixos e similares, ou até menores, do que os de outros analgésicos disponíveis no mercado.
Desde a realização desse painel, há 22 anos, não foram identificados novos riscos ou emitidos novos alertas de segurança relacionados à dipirona, de acordo com a Anvisa. Portanto, não há discussões sobre uma eventual proibição da venda da dipirona no Brasil.
Além das questões relacionadas à segurança, a dipirona foi objeto de diversos estudos que testaram sua eficácia. Embora haja menos estudos sobre a dipirona em comparação com outras drogas, devido à sua proibição em alguns países, as evidências disponíveis são um pouco mais conclusivas.
De acordo com o Instituto Cochrane, uma única dose de dipirona é capaz de aliviar a dor moderada ou severa após cirurgias em 7 a cada 10 pacientes. Esse número é superior ao observado com placebo, que resultou em melhoras nos sintomas para 3 em cada 10 indivíduos. A dipirona também se mostrou eficaz no tratamento da dor de cólicas renais e na dor no geral.
No entanto, assim como ocorre com qualquer medicamento, é importante ler atentamente as informações disponibilizadas pelo fabricante, respeitar o limite de consumo diário e conhecer os possíveis efeitos colaterais. A dipirona não é indicada para crianças com menos de 3 meses de idade ou com menos de 5 quilos. O uso do medicamento também deve ser mais cuidadoso em pacientes com problemas nos rins ou no fígado. É fundamental seguir as instruções presentes nos rótulos dos medicamentos e evitar a automedicação excessiva.
Em resumo, a dipirona é um medicamento amplamente utilizado no Brasil para aliviar febre e dor. Embora tenha sido proibida em alguns países devido à possibilidade de agranulocitose, estudos realizados na América Latina e a avaliação de especialistas indicam que a dipirona é segura e eficaz quando utilizada de acordo com as indicações médicas. No entanto, é sempre importante buscar orientação profissional e seguir as instruções de uso para garantir um tratamento seguro e adequado.