O anteprojeto da reforma do Código Civil foi entregue no Senado recentemente, mais especificamente, no dia 17 de abril. Uma comissão de juristas foi responsável pela elaboração, que apresenta uma questão relevante sobre as sucessões: ao que parece, o (a) viúvo (a) deixará de ser herdeiro necessário.
A redação atual do art. 1.845 do Código Civil, de 2002, diz que herdeiro necessário é o descendente (filho e neto), o ascendente (pais e avós), bem como o cônjuge. É isso o que garante o direito a parte cabível da herança legítima, equivalente à metade de todos os bens da pessoa falecida. Mas, com o anteprojeto, tudo pode mudar.
Atualmente, o companheiro ou cônjuge é considerado como herdeiro mesmo que haja regime de separação estabelecido ainda em vida. Então, o viúvo só perderia o direito a receber a herança legítima caso fosse deserdado, bem como “eventualmente declarado indigno”.
Em certos regimes de bens, há direito do cônjuge à meação, correspondente à metade dos bens integrantes do patrimônio em comum que o casal adquiriu em vida. No entanto, a proposta enviada pela comissão não muda tal possibilidade.
O cônjuge, mesmo deixando de ser um herdeiro necessário, ainda permanecerá na ordem da sucessão hereditária que o art. 1.829 do Código Civil prevê. O cônjuge ou convivente é o terceiro na ordem, atrás dos descendentes e dos ascendentes.
Isso quer dizer que, caso não haja testamento, os bens se destinarão aos descendentes e aos ascendentes. Se não houver nenhum desses, é feita uma transmissão para o cônjuge. No entanto, o cônjuge pode ser excluído ainda da ordem de sucessão caso o testador queira, incluindo a previsão no testamento de não dispor do patrimônio.
O Supremo Tribunal Federal, em 2017, decidiu que cônjuges e pessoas em união estável têm direitos iguais de herança. Na época, a corte não esclareceu bem se união estável concedia a consideração como herdeiro necessário, gerando controvérsias.
Portanto, a comissão da revisão do Código Civil optou por excluir companheiros e cônjuges do art. 1.845. Essa proposta, então, serve como correção do erro apresentando em 2002 no Código Civil, que abre brechas para injustiças.
O anteprojeto, nesse sentido, é tido como algo positivo, pois traz a ampliação da autonomia de quem é dono dos bens para dispor a herança. Com a alteração, é possível pensar na dissociação patrimonial completa entre companheiros e cônjuges, em vida e no pós-morte.
Dessa forma, o testador organizará a herança como preferir, dentro do limite legítimo. Lembrando que, além das heranças legítimas, existem também as disponíveis, correspondente à outra parte do patrimônio. Portanto, o indivíduo pode dispor dela como bem entender.
Há quem defenda e há quem aponte os problemas que a regra proposta traz consigo. Por exemplo, existem entendimentos de que ela exclui alguns direitos que já haviam sido assegurados em 2002 pelo Código Civil.
Comumente, o patrimônio do casal é registrado em nome do homem. Com isso, considerando uma sociedade machista e conservadora, as mulheres poderiam ser prejudicadas de alguma forma.
Outro artigo do anteprojeto determina que o juiz terá condições de instituir usufruto de determinados bens a fim de garantir uma subsistência. Contudo, se houver insuficiência do patrimônio ou dos recursos.
Mas, o dispositivo aponta que isso não vale se o indivíduo tiver patrimônio ou renda suficiente para a manutenção da subsistência. Isso também não procede se for constituir outra entidade familiar. A condição causa estranheza e repúdio de algumas pessoas, pois é como se “obrigasse o celibato, devendo o viúvo se “manter fiel” a alguém que faleceu.
Há outra questão do anteprojeto que levanta dualidade de opiniões: é a exclusão de direito do cônjuge a um quarto da herança dos bens particulares. Ressaltando que bens particulares são os bens que a outra parte tinha antes de se casar ou de constituir união estável, além dos que são herança e doação.
O art. 1.832 do Código Civil atual garante aos cônjuges, a reserva de um quarto da herança. Mas, com a proposta, isso acabará de vez. A justificativa é de que a atual regra causa enriquecimento injustificado, já que o patrimônio foi adquirido sem a participação do outro.