A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou o acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT). Assim, considerou que as alterações legislativas sobre o direito de retenção só entraram em vigor com a Lei 11.382/2006. Portanto, admitiu a oposição de embargos à execução em processo de reintegração de posse iniciado em 2003.
O entendimento do Colegiado considerou que, o artigo 744 do Código de Processo Civil de 1973 previa, em sua versão original, a possibilidade da apresentação de embargos de retenção por benfeitorias na fase de execução da sentença judicial.
Entretanto, com a reforma implementada pela Lei 10.444/2002 essa hipótese foi suprimida. Portanto, manteve-se o direito aos embargos de retenção apenas nas execuções de títulos extrajudiciais para entrega de coisa certa.
Dessa forma, após o início da vigência da lei de 2002, cabe ao possuidor de boa-fé, pleitear a retenção de benfeitorias na própria contestação. Sob pena de preclusão do exercício de seu direito. Assim, nos casos em que for demandado em ação para entrega de coisa, bem como a saída do imóvel por perda de posse.
Contudo, a perda do momento processual para alegar o direito à retenção não impede que o interessado, posteriormente, proponha ação ordinária de indenização pelo valor das benfeitorias realizadas.
Na ação de reintegração de posse que deu origem ao recurso, os autores pretendiam anular um negócio imobiliário. De acordo com os autos do processo, um dos réus vendeu aos demais uma área rural que possuía em condomínio com os autores. Entretanto, sem ter havido a anuência destes, valendo-se de assinaturas falsificadas.
Nesse sentido a ação reintegratória foi julgada procedente. Todavia, na fase de cumprimento de sentença, iniciada em 2016, dois dos réus opuseram embargos à execução cumulada com pedido de retenção por benfeitorias.
Contudo, o juiz rejeitou a alegação de impossibilidade jurídica do pedido. A decisão do juízo de primeira instância foi mantida pelo TJ-MT. Para o tribunal, como a ação original de reintegração de posse foi proposta antes da entrada em vigor da Lei 11.382/2006, as sucessivas modificações legislativas que culminaram com a supressão dos embargos de retenção do sistema processual brasileiro não poderiam ser aplicadas ao caso dos autos.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, esclareceu que o direito de retenção pode ser invocado pela defesa nas ações que visam a entrega de coisa. Assim, objetivando a paralisação da eficácia da pretensão do autor, adiando a devolução do bem para o momento do ressarcimento das despesas com as benfeitorias.
De acordo com a ministra, durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973, houve discussões sobre o momento adequado para o exercício do direito de retenção. Porquanto, se seria na contestação, sob pena de preclusão, ou se seria por meio de embargos à execução.
Entretanto, segundo a relatora, desde a reforma introduzida pela Lei 10.444/2002 no CPC/1973, não são mais cabíveis embargos de retenção por benfeitorias em execuções de títulos judiciais, independentemente da natureza da ação.
“Pela reforma da Lei 10.444/2002, foi dada nova redação ao artigo 744 do CPC/1973, que passou a prever a possibilidade de oposição de embargos de retenção por benfeitorias apenas nas execuções de títulos extrajudiciais para entrega de coisa certa, de que tratava o artigo 621 daquele códex”, afirmou a ministra.
Ainda de acordo com Nancy Andrighi, a Lei 10.444/2002 acrescentou ao CPC/1973 o artigo 461-A, que criou procedimento simplificado de obrigação de entrega de coisa reconhecida em decisão judicial, dispensando-se processo autônomo de execução.
Nesse regime, observou a relatora, as funções jurisdicionais cognitiva e executória foram aglutinadas em apenas uma relação processual. Portanto, não era mais concebível a possibilidade de oposição de embargos de retenção por benfeitorias, e a arguição deveria se dar na contestação.
“Assim, viabilizou-se que o direito de retenção fosse declarado na sentença, de modo a condicionar a expedição do mandado restituitório à indenização pelas benfeitorias”, explicou.
Posteriormente, declarou a ministra, a Lei 11.382/2006 revogou o artigo 744 do CPC/1973 e estabeleceu o direito à retenção por benfeitorias. Entretanto, como matéria passível de alegação somente em embargos à execução de título extrajudicial, que não têm paralelo com a impugnação do cumprimento de sentença.
Segundo Nancy Andrighi, essa orientação está mantida no CPC/2015, reforçando a distinção entre cumprimento de sentença e execução de título extrajudicial. Assim, estabelece expressamente que, na ação composta de duas fases (conhecimento e execução), o direito de retenção deve ser levantado na contestação (parágrafo 2º do artigo 538) e solucionado na sentença.
Ela destacou que a fixação da contestação como momento preclusivo para o exercício do direito de retenção remonta à reforma operada pela Lei 10.444/2002, cuja vigência é anterior à propositura da ação, em 2003 e não pela Lei 11.382/2006, como entendeu o TJ-MT.
“Logo, mesmo sob o enfoque dado no acórdão recorrido, os embargos de retenção por benfeitorias se mostram incabíveis na espécie. Isto porque, lei processual vigente na data da contestação já havia excluído essa hipótese. Consequentemente, impôs a concentração de todo o debate acerca do direito de retenção e o seu acertamento na fase cognitiva da ação”, ressaltou a ministra.
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