PGR defende que o crime de injúria racial não se confunde com racismo e é prescritível

Na última quinta-feira (26/11), em sessão por videoconferência do Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se pela prescritibilidade dos crimes de injúria racial. 

Imprescritibilidade

A material entrou em discussão no julgamento do Habeas Corpus (HC) 154.248 contra decisão da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que indeferiu o pedido de extinção de punibilidade ao considerar o delito como imprescritível, assim como o crime de racismo. Entretanto, o julgamento foi suspenso após o voto do relator do caso, ministro Edson Fachin.

Em sustentação oral, Augusto Aras iniciou alertando que “o racismo existe, sim, no Brasil” e “negar o problema já constitui um problema”. Diante disso, advertiu que, por expressa determinação constitucional, “há de ser repudiado por todos e todas, inclusive, e sobretudo, pelo Ministério Público brasileiro”. 

Portanto, na avaliação do procurador-geral, posicionar-se franca e abertamente contra o racismo traduz um marco indispensável ao avanço do processo civilizatório.

Injúria racial x racismo

Na sequência, o PGR destacou as diferenças jurídicas entre os crimes de injúria racial e de racismo. De acordo com o PGR, injúria racial é figura típica que não se confunde com o delito de racismo expresso na Lei 7.716/1989. 

Nesse sentido, explicou, na injúria racial tem-se uma conduta associada ao uso de palavras depreciativas, com a intenção de ofender a honra da vítima. “É o que ocorre, por exemplo, quando torcedores degradam verbalmente jogadores de futebol ou quando, durante uma discussão no trânsito, motoristas proferem palavras ofensivas”, observou.

Por sua vez, no caso do crime de racismo, Aras apontou que se tem como regra a marca da segregação ou da tentativa de segregação. Como por exemplo, mencionou casos em que, em razão da cor, da origem ou da orientação sexual, a matrícula escolar de uma criança é recusada ou um cliente deixa de ser atendido em um restaurante.

Diferença legislativa

O PGR destacou que ambas as práticas são reprováveis e desumanas, entretanto observou que, juridicamente, a legislação tratou de diferenciá-las. 

Segundo o PGR, o constituinte fez a opção por estabelecer a imprescritibilidade para o crime de racismo, que tem bem jurídico tutelado diverso do crime de injúria. Ou seja, enquanto o racismo atenta contra a unidade social, buscando a segregação, a injúria racial atenta contra a honra do indivíduo.

Prazo para representação

Diante disso, Augusto Aras esclareceu que, pela lei, o crime de injúria racial depende de representação da vítima para a abertura de processo criminal. isto é, o Ministério Público (MP) não pode atuar por iniciativa própria. 

Por essa razão, a vítima precisa representar contra o autor, em um prazo de até seis meses. Dessa forma, pode ser contraditório tornar imprescritível um crime que tem um prazo para ser denunciado pela vítima.

Ordenamento jurídico

Portanto, de acordo com o PGR, a prescritibilidade penal não pode ser alterada por interpretação analógica nem extensiva, ainda que isso frustre as expectativas dos cidadãos. “Como sociedade, podemos não apreciar essa consequência legal. Como cidadãos, podemos até não concordar com esse desfecho. 

Contudo, o Estado Democrático de Direito exige a observância do ordenamento jurídico tal como posto na Constituição e nas leis penais”, afirmou. “A opção legítima dos representantes democraticamente eleitos quanto a quais condutas serão gravadas pela excepcionalíssima nota da imprescritibilidade, exceção ao princípio da segurança jurídica, alcança somente o crime de racismo.”

Caso concreto

No caso em discussão, Augusto Aras ressaltou que a resposta sobre a ocorrência ou não da prescrição está no Código Penal (CP). Assim, na avaliação do procurador-geral, na data da sentença de condenação, a ré tinha mais de 70 anos, o que leva à contagem pela metade do prazo de prescrição, de acordo com o artigo 115 do CP.

Desse modo, o PGR apontou que, conforme o disposto no Código Penal, a prescrição ocorre em 4 anos quando a pena máxima aplicada é igual a 1 ano ou, sendo superior, não suplanta 2 anos, como no caso em análise. “Portanto, a reprimenda imposta prescreveria em 4 anos, cuja metade, aplicável em razão da idade da ré, é 2 anos”, afirmou.

Prescrição da pretensão punitiva

Portanto, considerando que a publicação da sentença condenatória ocorreu em 2013, e que o acórdão do Tribunal de Justiça, que manteve a sentença, foi publicado em 1º de setembro de 2014, “há de se reconhecer que operou a prescrição da pretensão punitiva estatal, na forma dos artigos mencionados, combinado com o art. 117, inciso IV, do Código Penal”. 

Ao concluir, o PGR manifestou-se pela concessão da ordem de habeas corpus, “para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva no caso concreto, bem como para fixar a tese de que o delito de injúria racial, tipificado no art.140, § 3º, Código Penal, é submetido às regras de prescrição definidas na legislação infraconstitucional”.

Fonte: MPF

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