Despesa Pessoal vs LFR (Lei de Responsabilidade Fiscal)

Atualmente, verifica-se que os governos em sérias dificuldades com os limites da despesa laboral, seja porque esta cresce de forma autônoma ante os adicionais incorporados, de quando em quando, à remuneração do funcionalismo, ou porque a base de cálculo – a receita corrente líquida (RCL) – ainda não se recuperou da queda havida na economia dos últimos anos.

Em outras palavras e mesmo que os dirigentes não tenham concedido um único centavo de majoração salarial, ainda assim verifica-se elevação da despesa de pessoal.

Disso faz prova o Portal da Transparência do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), a revelar que muitas prefeituras paulistas já superaram o limite máximo para o gasto em questão (54% da RCL), sendo que várias outras administrações municipais ultrapassaram o chamado limite prudencial (51,30% da RCL).[1]

Segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), os Poderes têm dois quadrimestres para reconduzir a despesa de pessoal a seus limites.

No presente artigo, discorreremos acerca do cálculo das Administrações que, de forma equivocada, têm apropriado gastos que se poderiam abater do limite em foco, além de incorporar pagamentos indenizatórios, não remuneratórios, o que contraria o art. 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Não bastasse isso, o § 1º daquela norma mostra-se inaplicável; eis aqui os tais contratos de terceirização da mão de obra que substituem servidores. De mais a mais, descabe reduzir a base de cálculo (RCL), dela afastando os ganhos financeiros do regime próprio de previdência (RPPS).

É o que a seguir veremos.

A inaplicabilidade do art. 18, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal

Relativamente à mão-de-obra terceirizada, tem-se o que diz a Lei de Responsabilidade Fiscal:

Art. 18 – (….)

1o – Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como “Outras Despesas de Pessoal”.

Inicialmente, verifica-se que tal dispositivo não foi proposto pelo autor intelectual do projeto original, o Ministério do Planejamento, mas, sim, por emenda parlamentar antes da segunda votação na Câmara Federal.

Em suma, na qualidade de maior interessado na austeridade fiscal, o Governo Central não idealizou tal novidade.

Decerto, trata-se de norma de duvidosa constitucionalidade, posto que os limites da despesa de pessoal só alcançam servidores ativos e inativos e, não, os terceirizados.

É o que se vê no artigo 169 da Constituição:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

Mão de obra Terceirizada

Além disso, a Administração só pode admitir pessoal por concurso, para cargo de livre provimento (em comissão) ou de forma temporária (art. 37, IX, da CF).

Então, a contratação direta de mão-de-obra também não encontra amparo constitucional.

Nesse passo, quando quer mão-de-obra terceirizada, o Poder Público precisa repassar, ao particular, um determinado serviço, não podendo contratar, direta ou indiretamente, a mão-de-obra a que se refere o art. 18, § 1º, da LRF.

De fato, o Poder Público a Administração não pode se valer de empresas para contratar trabalhadores.

É o que determina o Tribunal Superior do Trabalho na Súmula 331 acerca dos “contratos de terceirização de mão-de-obra”.

Todavia, sob a ótica do órgão que padroniza a classificação da despesa pública no Brasil (STN), os contratos de terceirização de mão-de-obra relacionam-se a terceirizados empregados em atividades-fim ou em funções abrangidas pelo Plano de Cargos e Salários da entidade pública.

Eficácia da LFR vs Direito Financeiro

Então, o art. 18, § 1º, da LRF, parece não ter eficácia em nosso direito financeiro, nisso considerando que:

  • Na Administração Pública, os limites da despesa laboral alcançam os servidores ativos e inativos e, não, os terceirizados (art. 169, da Constituição);
  • A Administração só pode admitir pessoal, mediante concurso público, contratação de comissionados ou por forma temporária e, não, contratando diretamente terceirizados.
  • O Tribunal Superior do Trabalho (TST), mediante a Súmula 331, proíbe que o Poder Público contrate trabalhadores mediante empresa interposta, donde se conclui que, para contar com pessoas desvinculadas do quadro funcional, deve a Administração repassar, no todo ou em parte, determinados serviços ao particular e, não, contratar mão-de-obra.
  • Ao atualizar, em 2013, a Portaria Interministerial 163, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) retirou o item 34 (Outras Despesas de Pessoal decorrentes de contratos de terceirização) do universo do gasto laboral, inserindo-o no grupo Outras Despesas Correntes.
  • A Administração Pública não tem qualquer controle sobre os trabalhadores das empresas prestadoras de serviço; no caso de ajustes e reduções, não há como determinar que as empresas promovam cortes na folha salarial.

Com efeito, no tocante às subvenções sociais, auxílios e contribuições, a Lei 4.320, de 1964 (art. 16), estabelece, de forma clara, que, no interesse público, a Administração pode suplementar recursos privados como forma de melhor atender os serviços públicos.

Então, o intuito, o foco, o objetivo é a melhor consecução de um serviço público.

Não bastasse isso e sob o ponto de vista orçamentário, as rubricas Subvenções Sociais, Contribuições, Serviços de Terceiros (pessoa jurídica), todas elas compõem o grupo Outras Despesas Correntes (código 3.3.00.00.00) e, não, o grupo Pessoal e Encargos Sociais (código 3.1.00.00.00).

 

Decisões administrativas sobre demandas anteriores ao cálculo da despesa laboral.

A Lei de Responsabilidade Fiscal manda excluir os gastos trabalhistas gerados por decisão judicial, desde que o fato gerador anteceda os doze meses de apuração.

Então, inevitável a seguinte indagação: por simetria, seriam também retiradas despesas ensejadas por determinações administrativas, não judiciais?

A propósito, na fórmula que afere a despesa com pessoal, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) exclui todos os gastos da competência de exercícios anteriores.

Em assim sendo e desde que precedentes aos doze meses de apuração da despesa com pessoal, todas as decisões trabalhistas, judiciais ou administrativas, serão abatidas do cômputo em questão.

Repasses atuariais ao regime próprio de previdência social (RPPS)

No cômputo de pessoal, a Lei de Responsabilidade Fiscal exclui as contribuições dos segurados, a compensação financeira junto ao INSS.

Bem assim as demais receitas do sistema local de previdência, nesta incluídas o específico superávit financeiro (art. 19, § 1º, VI, “c”).

Sob tal prisma, também são abatidas as contribuições patronais àquele sistema, conquanto antes integram a despesa bruta de pessoal, possuindo tais encargos, claro, a natureza de receitas vinculadas ao sistema previdenciário.

Então, na despesa de pessoal, só entra, de fato, o gasto descoberto da inatividade, aquele não financiado pelas receitas atreladas ao sistema próprio.

No entanto, o RPPS apresenta outro tipo de déficit, o atuarial, a demonstrar que, ao longo de 35 anos, tal sistema abrirá falência, caso não se aumente as alíquotas de contribuição ou haja repasses suplementares.

Portanto, isto permite evidenciar a vinculação para a qual foram instituídos e devem permanecer devidamente aplicados em conformidade com as normas vigentes, no mínimo, por 5 (cinco) anos.

É isso o que determina a Secretaria do Tesouro Nacional, na 6ª. Edição do Manual de Demonstrativos Fiscais.

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