A inadimplência nas operações de microcrédito chegou a um número recorde em maio deste ano, atingindo uma taxa de 21,27% do total de valores concedidos. Além disso, este número é cerca de quatro meses maior do que a média da série histórica do Banco Central, que teve início em 2011.
O microcrédito é uma categoria destinada a trabalhadores informais, MEIs e outro tipos de microempreendedores, os quais possuem dificuldades de acesso ao crédito. Nesse sentido, a Caixa Econômica Federal lançou um programa de microcrédito com condições muito flexíveis. Esse lançamento ocorreu pouco antes das eleições do ano passado.
Com isso, a partir de setembro de 2022 a inadimplência no microcrédito começou a subir muito. Na ocasião, a taxa foi de 3,95% nos últimos 12 meses anteriores para 9,5%. Em seguida, a inadimplência continuou a subir, chegando na casa dos 20% este ano.
A linha de crédito da Caixa em questão foi lançada em março de 2022, e se chama Simplificação do Microcrédito Digital para Empreendedores (SIM Digital). Sendo assim, o SIM Digital concedeu empréstimos para pessoas negativadas, que possuíam dívidas de até R$ 3 mil.
Apenas um mês após o lançamento do programa, cerca de 83% das pessoas que contrataram este microcrédito tinham CPF negativado. Atualmente, a Caixa informa que somente neste programa a inadimplência chega a mais de 80%.
A gestão atual da Caixa critica as condições oferecidas pelo SIM Digital, que acabaram gerando grande inadimplência. No entanto, o ex-presidente do banco estatal, Pedro Guimarães, nega que esta linha de microcrédito tenha relação com o período eleitoral.
Segundo o executivo, o lançamento do programa apenas ocorreu após a criação de um fundo garantidor destinado às instituições financeiras, aprovado pelo Congresso Nacional. Por outro lado, a assessoria do ex-presidente Jair Bolsonaro não se pronunciou sobre o assunto.
Antes do serviço de microcrédito SIM Digital, a Caixa Econômica Federal a linha Crédito Caixa Tem. Esta linha de crédito foi criada em 2021, e era custeada com os próprios recursos do banco. Além disso, este programa fazia empréstimos apenas para pessoas com o nome limpo, oferecendo até R$ 1 mil com juros de 3,99% ao mês.
No entanto, com o SIM Digital, o microcrédito passou a operar com juros abaixo de 2%, emprestando até R$ 1 mil para pessoas físicas e R$ 3 mil para pessoas jurídicas. Este programa, inclusive, não obriga que os contratantes possuam o nome limpo. O SIM Digital ainda está disponível para a contratação, no entanto, as condições não são mais tão flexíveis como em 2022.
Segundo Lauro Gonzalez, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da Fundação Getulio Vargas (FGV): “Faz todo sentido dizer que essa expansão da carteira, possivelmente, ou claramente, visando objetivos eleitorais, pode ter colaborado para o aumento da inadimplência”.
O aumento da inadimplência nas operações de microcrédito também pode ser explicado pelo aumento de profissionais em situação de vulnerabilidade. Isso porque essas pessoas recorrem ao empreendedorismo por necessidade. “A narrativa leva a crer que o microempreendedor tem uma capacidade de empresariar. Mas é uma narrativa, porque ele não tem os instrumentos, não têm as condições para se colocar como um empresário”, afirma Renê Birochi, professor de administração da UFSC.