Juiz rejeita possibilidade de proferir norma geral vinculando todas as empresas representadas por sindicato

“Este Juízo monocrático entende não ter competência para apreciar a paralisação de atividade econômica, nem mesmo fixar norma geral e abstrata a todo o setor patronal, através do ente sindical, competência reservada à Seção de Dissídios Coletivos, através de instrução perante a 1ª Vice-Presidência deste Tribunal”.

Assim registrou o juiz Glauco Rodrigues Becho, titular da 47ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, ao examinar ação civil coletiva em que o Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações do Estado de Minas Gerais – SINTTEL-MG pedia para que as empresas representadas pelo Sindicato das Empresas de Asseio Conservação do Estado de Minas Gerais – SEAC/MG fossem condenadas a cumprir diversas obrigações em razão da pandemia do Covid-19, com o objetivo de conter e prevenir a disseminação viral, conforme Lei 13.979/20 e recomendações das autoridades de saúde.

O juiz apontou exemplos de casos em trâmite perante a Seção de Dissídios Coletivos para reforçar seus fundamentos.

Ação civil coletiva

Na ação, o sindicato profissional pedia providências para reduzir jornada de trabalho e quantidade de trabalhadores, sem prejuízo da remuneração, afastar trabalhadores do grupo de risco, observar distanciamento, fornecer e fiscalizar a utilização de equipamentos de proteção, oferecer orientações sobre formas corretas de higienização, bem como manter ambiente de trabalho arejado e limpo.

No entanto, o magistrado não deferiu qualquer pretensão, extinguindo o processo em parte, quanto a alguns pedidos, sem resolução de mérito e julgando improcedentes os demais.

Ele entendeu que não poderia proferir uma decisão tão ampla e genérica e deixou claro seu posicionamento pela incompetência do juízo monocrático, por considerar evidente a natureza de dissídio coletivo jurídico da ação proposta.

Nesse sentido, inclusive, decidiu anteriormente.

Todavia, a decisão não prevaleceu em segundo grau, que considerou se tratar de ação civil coletiva, diante da opção do sindicato-autor, determinando o prosseguimento do feito.

Em consequência, o processo retornou à 47ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, para que o magistrado apreciasse novamente os pedidos e proferisse nova decisão.

Tutela de urgência

Em novo exame após o retorno do processo à vara de origem, o juiz negou a tutela de urgência, por ilegitimidade passiva coletiva do sindicato-réu para responder por obrigações de fazer e de não fazer das empregadoras, bem como a impossibilidade de efetividade.

Segundo expôs, eventual condenação do sindicato representante da categoria econômica não implicaria responsabilização (efeitos da coisa julgada nas ações coletivas) das empresas – sequer indicadas na inicial.

Conforme ponderou o julgador, a tutela pretendida se dirigiu a empresas que não fazem parte da demanda, além de empregadoras não terem sido incluídas no polo passivo, não se submetendo, portanto, ao contraditório e à ampla defesa, sequer se vinculando a eventual coisa julgada (artigo 506 do CPC).

No mesmo sentido da sua decisão anterior, registrou não haver como proferir decisão uniforme, capaz de abarcar toda a diversidade da categoria patronal, bem como sujeitas a regras diversas emanadas do Poder Executivo Federal, Estadual e Municipal, em competência concorrente, conforme entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal, em julgamento na ADI 6341.

Em reforço à tese, avaliou o magistrado que decisão ampla do Poder Judiciário, sem sequer conhecer a efetiva realidade, poderia ser prejudicial às próprias providências já adotadas pelas empregadoras e pelos outros Poderes.

Para ilustrar, apontou que o Executivo Municipal de Belo Horizonte publicou o Decreto 17.313/2020, com determinações expressas ao setor de teleatendimento, a depender do porte e tipo de prestação de serviços.

Na visão do julgador, acolher a pretensão de urgência autoral à revelia dos empregadores legitimados poderia gerar a fixação de determinações menos específicas e efetivas que as fixadas pelo Poder Executivo, criando-se insegurança jurídica no âmbito da jurisdição, no que tange aos empregados vinculados a empresas da categoria representada pelo sindicato-réu.

Ilegitimidade passiva

Ainda na linha já mencionada na primeira decisão, registrou competir ao sindicato-autor ou aos demais legitimados, caso alguma empregadora não esteja cumprindo as determinações do Executivo Municipal, Estadual ou Federal, bem como as recomendações do MPT e da própria OMS, demandá-las em juízo, inclusive em substituição ativa à coletividade que esteja efetivamente afetada.

Considerou, portanto, que o sindicato-réu não é parte capaz de cumprir as obrigações de fazer e de não fazer de forma ampla e abstrata.

O juiz declarou a ilegitimidade passiva em relação a parte dos pedidos formulados na petição inicial, extinguindo o processo sem resolução de mérito no tocante, na forma do artigo 485, VI, do CPC.

Glauco Becho alertou que decisão ampla e genérica poderia inviabilizar, por exemplo, a prestação de serviços de atendimento por empregados de empresa paraestatal (MGS citada na inicial), em setores como Polícia Militar (setor Olho Vivo), Polícia Civil, Secretaria de Saúde, Fhemig, sem ao menos ser possível conhecer a realidade, já que a empresa não faz parte da demanda.

Ele frisou ter plena consciência da gravidade da situação, da calamidade pública que assola o país, especialmente as partes hipossuficientes.

Mas, a seu ver, a fatídica situação não autoriza o excesso de poder, nem mesmo a prolação de decisão genérica e inespecífica, fixando obrigações a terceiros desconhecidos, sem qualquer prova de conduta ou omissão ilícitas.

“O regramento do poder competente e todas as suas delimitações, como se infere do Decreto 17.313/2020, por exemplo, assim como a amplitude das opções concedidas pelas Medidas Provisórias 927 e 936 (já submetidas ao crivo do Supremo Tribunal Federal), inviabilizam e tornariam ineficaz qualquer decisão jurisdicional condenatória genérica eventualmente proferida por este juízo”, acrescentou.

Assim, tornou definitiva a decisão denegatória provisória, para julgar improcedentes os demais pedidos formulados na inicial.

Para evitar discussão ou insegurança jurídica, registrou que a decisão não tem caráter impeditivo frente às determinações do Poder Executivo, que devem ser rigorosamente cumpridas.

Segundo observou, a Justiça do Trabalho não tem competência para restringir ou tornar sem efeito atos legislativos proferidos pelos outros Poderes, em matéria sanitária e administrativa.

O sindicato-autor recorreu da decisão, mas, logo em seguida, desistiu do recurso.

A sentença transitou em julgado, sem quaisquer obrigações pendentes, e o processo foi arquivado definitivamente.

Fonte: TRT-3

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