O programa Desenrola Fies, lançado pelo governo federal com o objetivo de auxiliar estudantes a renegociarem suas dívidas de financiamento estudantil, gerou uma onda de insatisfação e preocupação recentemente.
Uma revisão inesperada dos contratos por parte da Caixa Econômica Federal, um dos bancos responsáveis pela gestão do programa, resultou em aumentos significativos nos valores devidos por alguns participantes, contrariando os descontos inicialmente acordados.
Inúmeros estudantes que aderiram ao Desenrola Fies relataram ter sido surpreendidos com boletos de cobrança muito superiores aos valores previamente negociados. Thais Otoni Silva, advogada que conseguiu um desconto de 92% em sua dívida original de R$ 83 mil, reduzindo-a para R$ 7,5 mil, é um desses casos.
Após pagar sete das 15 parcelas de R$ 500 mencionado, ela se deparou com um boleto de R$ 2 mil e um saldo devedor de R$ 17 mil, praticamente triplicando sua dívida renegociada.
“Eu deparei com um boleto de R$ 2 mil e meu saldo devedor em R$ 17 mil. Ou seja, praticamente triplicaram a minha dívida”, relata Thais, visivelmente preocupada com a possibilidade de perder o desconto obtido caso não consiga arcar com os novos valores.
De acordo com uma resolução de novembro de 2023, o Desenrola Fies oferece os maiores descontos, de 92% e 99%, para estudantes inscritos no Cadastro Único ou que receberam auxílio emergencial em 2021. Os demais participantes têm direito a um desconto menor, de 77% sobre o valor original da dívida, aplicável a dívidas não pagas há mais de 360 dias em 30 de junho.
A Caixa admitiu que, em casos específicos, foram apresentadas opções de desconto de 92% ou 99% para estudantes cujo direito real era de apenas 77%. Após procedimentos de verificação e compliance, cerca de 2% dos contratos elegíveis foram identificados como necessitando ajustes, o que resultou na readequação dos valores devidos aos limites normativamente aplicáveis.
Para muitos estudantes, a revisão dos contratos representou um duro golpe. Aline Caroline Martins Nunes, auxiliar administrativa, relatou que sua dívida com o Fies aumentou quatro vezes após o reajuste, dificultando significativamente a quitação do financiamento.
“Eu espero que a renegociação seja feita da maneira que era antes, e que a gente consiga quitar essa dívida igual nos foi proposto. Se o erro foi deles, então, eu acredito que é algo que eles devam solucionar e que nós não temos culpa disso”, afirmou Aline.
O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao Ministério da Educação (MEC), declarou estar apurando os fatos e abriu um processo administrativo contra a Caixa para confirmar as irregularidades relatadas.
Maria Fernanda Pires, advogada especialista em direito público, defende uma negociação individualizada como a solução mais justa para os devedores afetados. Segundo ela, “O mais correto era que a Caixa revisse esse procedimento e buscasse essas pessoas que, de fato, tiveram seus cálculos equivocadamente feitos pela Caixa para renegociá-los. A eles deveria ter sido dado a oportunidade de saber o que aconteceu e de negociar novas condições daqui para diante”.
Muitos estudantes expressaram preocupação com o impacto financeiro das novas condições impostas pela revisão dos contratos. Thais Otoni Silva, por exemplo, afirmou não ter condições de arcar com os novos valores, temendo perder o desconto obtido e ter de enfrentar novamente a dívida original.
“Não tenho. E aí meu medo é porque se eu não pagar, eu vou perder e vai voltar a dívida antiga”, disse Thais.
Alguns estudantes relataram ter recebido avisos sobre as mudanças nos contratos por meio de mensagens de texto e no aplicativo do Fies, informando que, caso não aceitassem as novas condições, receberiam de volta os valores já pagos e poderiam solicitar uma nova renegociação.
Diante da situação, especialistas e estudantes têm enfatizado a necessidade de maior transparência e diálogo por parte das autoridades responsáveis. Muitos questionam como as mudanças foram conduzidas e exigem clareza sobre os critérios utilizados nos cálculos revisados.
Além dos desafios financeiros, a revisão dos contratos do Desenrola Fies também tem impactado a saúde mental e emocional dos estudantes envolvidos. O sentimento de insegurança e a perspectiva de enfrentar dívidas maiores do que o inicialmente acordado têm causado angústia e estresse.
Enquanto o processo de apuração das irregularidades avança, estudantes e especialistas continuam pressionando por soluções justas e negociações individualizadas que levem em consideração a capacidade de pagamento de cada devedor. O objetivo é encontrar um equilíbrio entre a necessidade de quitação das dívidas e a viabilidade financeira dos estudantes.
Ademais, o caso do Desenrola Fies evidencia a importância de programas de renegociação de dívidas serem conduzidos com transparência, clareza e respeito aos acordos inicialmente estabelecidos. A revisão dos contratos gerou insegurança e preocupação entre os estudantes, muitos dos quais temem não conseguir arcar com os novos valores impostos.
É fundamental que as autoridades responsáveis atuem de forma justa e dialogada, buscando soluções individualizadas que permitam aos devedores quitarem suas obrigações sem comprometer excessivamente suas finanças pessoais e seu bem-estar.