Crise energética no Brasil se aproxima

O medo de apagões e racionamentos retorna

“O brasileiro não tem um dia só de paz!” Esta frase, que se popularizou nas redes sociais, geralmente acompanhada de alguma notícia ruim, traduz muito bem o que todos devem ter sentido ao ser anunciado que o Brasil está vivendo a pior crise energética dos últimos 91 anos.

Quem declarou isso foi o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, pedindo à população que faça uso racional de recursos como água e energia, pois os reservatórios do sudeste estão com 30,2% da sua capacidade. A ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), órgão responsável pela coordenação e operação do sistema elétrico brasileiro, alertou que em novembro devem chegar a 10,3% da capacidade.

Na análise da ONS, o déficit de chuvas acumulado nos últimos dez anos em algumas bacias alcança um valor maior do que o total de chuva que ocorre em média durante um ano. Por causa disso, explicou a entidade, as vazões afluentes às usinas estão abaixo da média histórica nos últimos anos.

Sendo a energia essencial para a manutenção de nossas casas, hospitais e industrias, o que podemos esperar para os próximos meses?

Governo aprova Medida Provisória

Em maio, o Sistema Nacional de Meteorologia (SNM) emitiu o primeiro alerta de emergência hídrica para a região hidrográfica da Bacia do Paraná. Ela que responde por mais de 50% da capacidade de armazenamento de água para geração hidrelétrica no SIN e abrange os estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná, conforme relatado à Agência Epbr.

Nesta segunda (28), foi aprovada a medida provisória MP 1055, criando um comitê interministerial com mais poder de ações emergenciais. Os congressistas receberam esta medida apelidada de MP do Racionamento, mas foi retirado do texto dela o trecho que previa a possibilidade de racionalização compulsória (obrigatória) de energia.

Visto que o consumo de energia tende a aumentar no fim do ano, a preocupação é tentar minimizar os impactos nas contas de geradores e consumidores de energia e evitar o agravamento da situação.

Soluções à médio e longo prazo

Para o engenheiro José Carlos Braga, que já integrou a equipe de técnicos do Ministério da Integração Nacional, faltam linhões e licenças ambientais para acelerar novos projetos de energias renováveis. Ele fala ao Diário do Nordeste:

“Uma premissa básica aproximada de demanda energética versus crescimento do PIB é a razão 2/1 (a cada 1% de crescimento do PIB, a demanda energética cresceria, teoricamente, 2% em relação à energia nominal instalada em operação).(…) Precisamos de Planejamento Estratégico Imediato para a implantação de Grandes Volumes de Geração de Energia Verde em Âmbito Nacional a médio e longo prazos.”

Crise energética no ano 2000

No início dos anos 2000, o país sofreu com apagões e acabou sendo criado um programa de racionamento obrigatório.

Na época, o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) criou um grupo ministerial para monitorar a crise de energia que gerou apagões no país. Chefiado pelo então ministro da Casa Civil, Pedro Parente, o comitê ficou conhecido como ‘ministério do apagão’.

Ao relembrar a crise de 2001, o ex-ministro disse para o site Uol que além da autonomia, o diálogo aberto com a sociedade e a transparência sobre o tema foi um dos pontos cruciais para que a população aderisse ao racionamento voluntário de energia em 2001, e evitasse cortes compulsórios.

O racionamento foi adotado entre 1º de julho de 2001 e 19 de fevereiro de 2002, durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique. O racionamento estabelecia uma redução obrigatória de 20% no consumo de energia elétrica, sob ameaça de multa e corte no fornecimento.

Retorno do racionamento?

O governo tem negado enfaticamente a possibilidade de um racionamento. O Ministério de Minas e Energia (MME) descartou, nesta segunda (21), a possibilidade de “quaisquer medidas objetivando o racionamento de energia elétrica”, como resposta à crise energética.

O governo também tem descartado a possibilidade de apagões, isto é, de falhas imprevistas no sistema.

“Todo o trabalho tem sido realizado de forma transparente, sinérgica e tempestiva, buscando o uso racional dos recursos hídricos e da energia elétrica, permitindo que o país passe por esta conjuntura crítica com serenidade e sem alarmismos”, diz o MME.

Segundo o diretor-geral do ONS, Luiz Carlos Ciocchi, em audiência pública na Câmara dos Deputados em 20 de junho, se as ações não surtirem o efeito esperado, o nível dos reservatórios pode cair para 7,5%. Caso isso acontecer, o sistema de geração de energia entraria em colapso e falhas de fornecimento podem acontecer.

O que é racionalização da energia elétrica?

É quando o governo cria incentivos para o consumidor, por conta própria, economizar energia. O ex-diretor da Aneel Edvaldo Santana cita como exemplo a distribuição de geladeiras mais eficientes a famílias de baixa renda, feita por algumas distribuidoras de energia nos anos 2000.

O aumento na tarifa também, é uma medida de racionalização, embora polêmica.

Aumento na conta de luz

A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) se reúne nesta terça-feira (29) para definir o reajuste das bandeiras, estudando um aumento de até 60% na bandeira vermelha das contas de luz, que seria uma forma de desestimular o consumo de energia elétrica via preço.

Com isso, a cobrança adicional passaria dos atuais R$ 6,24 a cada 100 kWh (quilowatts-hora) consumidos, para cerca de R$ 10, resultando num aumento de até 20% no preço final das contas de luz.

Com a medida, a agência reguladora busca forçar os brasileiros a reduzirem o consumo de energia elétrica. O novo valor entraria em vigor a partir de julho. Isso acontece no mesmo momento em que o país acumula alta de 87% no preço do óleo de soja, 52% no arroz, 38% nas carnes, 31% no feijão preto, 10% no leite e 24% no gás de botijão, sempre em 12 meses acumulados até maio, conforme o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Fábio Romão, especialista em inflação da LCA Consultores, falou para a BBC que isso representa uma “política regressiva”, pesando mais no bolso dos pobres. A população de maior renda tem mais margem para ajustar seu consumo, por fazer uso de itens eletroeletrônicos e eletrodomésticos não essenciais, cujo uso pode ser reduzido.

Os mais pobres, por sua vez, já consomem uma quantidade muito menor de energia e terão mais dificuldade para economizar luz e fugir do reajuste.

Romão calcula que a alta de preços das contas de luz deve ter um impacto de 0,23 ponto percentual sobre o IPCA deste ano, supondo que esta bandeira vermelha se mantenha até dezembro.

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