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Contas em dólar serão tributadas? Confira o que se sabe até agora

Os investimentos no exterior estão prestes a sofrer uma nova tributação no Brasil. A Medida Provisória 1.171/23, incorporada à Medida Provisória do salário mínimo (1.172/23) e aprovada pela comissão mista do Congresso Nacional, traz algumas mudanças importantes. De acordo com advogados especializados, o novo texto está mais completo e deixa menos margem para brechas jurídicas.

Pontos cruciais da nova tributação

Os pontos cruciais da nova tributação permanecem os mesmos: a tabela unificada para todas as cobranças, a isenção de até R$ 6 mil anuais e a alíquota máxima de 22,5% a partir de R$ 50 mil anuais. Além disso, haverá a tributação das offshores anualmente, mesmo sem distribuição de lucros. No entanto, há alguns detalhes novos que os investidores que alocam dinheiro no exterior precisam conhecer.

Variação cambial e isenção de imposto

Uma das mudanças importantes diz respeito à cobrança sobre a variação cambial de moeda estrangeira. O novo ajuste determina que a variação cambial do dinheiro que fica parado em conta internacional e não possui rendimento está isenta de imposto. Isso beneficia as pessoas que abrem conta em dólar para acumular dinheiro e trocam real pela moeda americana ao longo do tempo. Mesmo que haja valorização do dólar em relação ao real, o montante não será passível de tributação.

“É um ajuste para evitar interpretações, pois essa cobrança não estava prevista anteriormente. Essas contas normalmente têm finalidade de viagens, mudança de país, estudo no exterior. Nada disso é alvo da atualização da tributação”, explica João Cláudio Gonçalves Leal, sócio coordenador tributário no SGMP Advogados.

É importante ressaltar que a isenção vale apenas para o lucro advindo da variação cambial, e não de rendimentos. Ou seja, se o valor for depositado em qualquer produto financeiro, passa a ser uma aplicação financeira e será taxado.

Tributação das offshores e mudanças no regime de caixa

A nova tributação das offshores será aplicada a um leque maior de entidades mantidas no exterior. A regra que muda a cobrança com base no regime de caixa (quando há distribuição de lucro ou dividendos) para regime de competência (cobrança periódica, independentemente da distribuição) também valerá para sociedades empresariais, fundos de investimentos e outras entidades baseadas em cotas.

“Essa equiparação de offshore com outras estruturas jurídicas é para estender a aplicação da nova tributação e afastar a possibilidade de fugir do tributo por meio de outros investimentos internacionais”, destaca Leal.

Segundo o advogado, a legislação tributária não permite o uso de analogias para a aplicação da lei. Se não está previsto com toda a descrição no texto da norma, não há enquadramento possível.

Além disso, o texto altera o patamar da renda ativa própria necessária para que as sociedades no exterior se enquadrem às novas regras. Se a renda própria for menor do que 60% da renda total, a sociedade se enquadra na nova regra. Anteriormente, o valor de corte era 80%.

Dedução de Impostos no Exterior e Acordos Internacionais

O texto também prevê a possibilidade de dedução de impostos pagos no exterior, desde que em países com os quais o Brasil tem acordos internacionais contra a bitributação ou de reciprocidade de tratamento.

“Este é um trecho que confirma a manutenção dos tratados internacionais. Em caso de paraísos fiscais, que têm tributo zero ou muito baixo, a diferença terá que ser paga no Brasil”, explica Eduardo Maciel, sócio da área Tributária do MFBD Advogados.

“É possível deduzir se já pagou algum valor, mas será necessário pagar a diferença se a alíquota for inferior à do Brasil. E a dedução não pode resultar em restituição de imposto.”

Regulamentação de Trusts

A regulamentação de trusts já havia avançado na definição dos participantes do acordo e da sua natureza para organização e sucessão patrimonial. Com os ajustes, foram acrescidos mais detalhes.

O texto especificou o trust “irrevogável” e prevê a transmissão de patrimônio pelo instituidor do acordo nesses casos, ou seja, quando o instituidor deixa de ser proprietário dos bens transferidos em favor da administração do trust (trustee).

Pela nova regra, a distribuição pelo trustee ao beneficiário terá a natureza jurídica de transmissão de patrimônio pelo instituidor para o beneficiário, seja por herança ou em doação, se ocorrida com o instituidor ainda em vida.

“Com essa previsão, abre-se espaço para uma leitura de doação e cobrança de imposto pelos estados, não mais pela União”, ressalta Leal. “Como deixa em aberto essa questão, não descarto a possibilidade de casos de judicialização. Ainda é necessário mais esclarecimentos.”

Tramitação e possibilidade de aprovação

Após a aprovação pela comissão mista, a MP 1.172/23 deve passar pela Câmara e pelo Senado até o dia 28 de agosto para, então, ser sancionada pelo presidente e se tornar lei.

Os advogados Maciel e Leal veem boas chances do texto ser aprovado, principalmente após ser incorporado pela medida provisória que trata da mudança do salário mínimo e do aumento da isenção de Imposto de Renda.

“Os temas da MP 1.172 são de interesse nacional e fizeram a MP 1.171 ganhar relevância para todos os envolvidos ao juntar os textos”, afirma Leal. “Não vejo chances do Congresso atrasar essa discussão e sofrer as críticas de não aprovar o novo salário mínimo.”

Em relação ao texto da tributação para o exterior em si, Maciel afirma que os ajustes trouxeram esclarecimentos importantes e, do ponto de vista de conformidade tributária, está mais fechado e “redondo” para ser aprovado.

“Foram mudanças razoáveis e oportunas”, diz Maciel. “É uma tributação que faz sentido neste momento em que se busca aumentar a arrecadação, porque faz isso sem onerar a cadeia de consumo.”

Para Leal, há poucas chances de alterações no que foi proposto até aqui. “A tributação no exterior não está entre os pontos mais polêmicos de mudanças no Imposto de Renda. Temos tópicos maiores como os dividendos e o JCP, por exemplo”, conclui.